Blog - IberCultura Viva
IberCultura Viva lança seus três editais de 2016
O programa IberCultura Viva abre nesta segunda-feira (19/09) as inscrições para três editais voltados a experiências culturais de base comunitária: um para apoio a redes, outro para a seleção de textos a serem publicados em um livro, e um concurso de videominuto chamado “Mulheres: Culturas e Comunidades”. Serão distribuídos US$ 100 mil para o Edital de Apoio a Redes e US$ 5 mil para o concurso de vídeos. O edital de artigos não terá prêmios em dinheiro.
As inscrições estarão abertas até 1º de dezembro. Para obter mais informações e baixar regulamentos e formulários:
Edital para a seleção de textos sobre políticas culturais de base comunitária
Edital de apoio a redes de cultura de base comunitária
Concurso de videominuto “Mulheres: culturas e comunidades”
IberCultura Viva concederá 104 bolsas para o Curso de Políticas Culturais de Base Comunitária 2025
Nesta sexta-feira, 20 de dezembro, foi aberto o prazo de inscrição do Edital de Bolsas para o Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária 2025, que será ministrado no campus virtual da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (FLACSO-Argentina). Serão distribuídas 104 bolsas para pessoas dos 13 países membros do IberCultura Viva (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Espanha, México, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai).
As pessoas interessadas em concorrer a uma bolsa deste curso, que se realizará entre abril e dezembro de 2025, podem se inscrever até 15 de fevereiro de 2025 no Mapa IberCultura Viva. Esta plataforma livre, gratuita e colaborativa de mapeamento, por meio da qual o programa tem lançado seus editais desde agosto de 2018, ganhou nova versão, com outro design e diferentes funcionalidades. Esta é a primeira chamada pública que se apresenta no novo Mapa IberCultura Viva. Quem já tinha registro de agente (individual ou coletivo) na versão anterior pode seguir acessando com os mesmos dados, atualizando a informação que lhe pareça necessária.
Este será o oitavo ano desta proposta acadêmica que foi construída em conjunto por IberCultura Viva e a Área de Comunicação e Cultura da FLACSO Argentina, com o objetivo de fortalecer a formação e pesquisa das políticas culturais de base comunitária e o conceito de “cultura viva” como política pública.
Desde o lançamento, em 2018, IberCultura Viva já concedeu 722 bolsas para este curso. Desse total, 605 pessoas – funcionárias de organismos públicos ou membros de organizações culturais comunitárias – foram selecionadas nos editais realizados para as turmas de 2018 a 2024. Para a edição de 2024, foram distribuídas 104 bolsas para pessoas de 13 países. Estes números se mantêm para a edição de 2025.
Nas sete turmas que se formaram neste período, as vagas foram divididas equitativamente entre os países integrantes do Conselho Intergovernamental IberCultura Viva. As pessoas que receberam estas bolsas foram aquelas que obtiveram as mais altas pontuações entre as candidatas de cada país membro, conforme os critérios estabelecidos no regulamento. Além disso, entre 2018 e 2024 foram concedidas 115 bolsas extras com os recursos de formação que alguns países escolheram utilizar para este fim, principalmente o Brasil e o Chile, que preferiram oferecer mais bolsas para pessoas candidatas de seus países, em vez de apoiar outros processos de formação próprios para organizações comunitárias.
Nesta edição de 2025, a exemplo dos anos anteriores, as pessoas interessadas em se candidatar a uma das 104 bolsas devem trabalhar em órgãos públicos de cultura, dedicar-se à gestão cultural ou integrar uma organização cultural de base comunitária ou algum povo originário em um dos 13 países participantes deste edital. Estão previstas oito bolsas por país.
Experiência na incidência, elaboração e execução de políticas culturais públicas e/ou em gestão cultural comunitária estão entre os critérios que serão levados em conta na seleção das pessoas candidatas. Também será valorizada a formação certificada em gestão cultural e em disciplinas afins, como artes, ciências sociais, humanas e económicas, assim como a condição de mestre ou mestra (sabedor ou sabedora), alguém com liderança histórica no território e na comunidade em termos de saberes ancestrais e das artes. Pelo menos 50% das pessoas selecionadas devem ser mulheres.
Para alguns países há requisitos específicos. As pessoas candidatas pelo Equador, por exemplo, deverão apresentar o comprovante de inscrição ao Registro Único de Artistas e Gestores Culturais (RUAC). No caso do México, é necessário apresentar o comprovante de inscrição ao Registro Nacional de Espaços, Práticas e Agentes Culturais (TELAR); e para a República Dominicana, o comprovante de inscrição ao Registro Nacional de Beneficiários (RENABE) da Direção Geral de Mecenato. No caso do Chile, se a pessoa não for funcionária pública (municipal ou federal), ela deve anexar o certificado de inscrição ao Registro Nacional de Pontos de Cultura Comunitária.
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Proposta acadêmica
Coordenada por Belén Igarzábal e Franco Rizzi, a proposta acadêmica busca a diversidade de miradas, com a participação de professores de vários países ibero-americanos. Os conteúdos estão distribuídos em seis módulos e 26 aulas, em suporte escrito e audiovisual assincrônico, nas quais são trabalhadas noções sobre processos culturais contemporâneos, propondo um marco teórico amplo sobre as teorias da cultura e dos debates atuais em torno delas.
Também são abordadas noções de políticas culturais com ênfase nas questões de direito, cidadania e comunidade e debatidas as teorias existentes a respeito das políticas culturais de base comunitária, novas formas de produção cultural e o uso de tecnologias a serviço da criação de redes. Além disso, o curso oferece ferramentas de gestão, planejamento, monitoramento e avaliação de políticas públicas culturais específicas para territórios e comunidades.
As aulas são publicadas uma vez por semana – com uma semana de recesso no final de cada módulo – e abre-se um fórum para cada aula publicada, gerando um espaço de debate e intercâmbio de ideias e experiências em torno dos temas tratados. Também se realizam encontros sincrônicos virtuais com professores/as convidados e com as tutoras do curso.
Para cumprir com os objetivos do curso, deve-se realizar um trabalho parcial escrito sobre os três primeiros módulos e um trabalho final integrador, que consiste em desenhar e planejar um projeto cultural comunitário ou uma política cultural pública de base comunitária. Os trabalhos podem ser entregues em espanhol ou português. As aulas são ministradas em espanhol, exceto as que estão a cargo de professores brasileiros, que são dadas em português e têm tradução para o espanhol.
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Um balanço dos sete anos
Um relatório/balanço desta pós-graduação, que é considerada um dos grandes acertos do programa IberCultura Viva em seus 10 anos de existência, foi elaborado este semestre pela equipe da Área de Comunicação e Cultura da FLACSO-Argentina, com o propósito de fazer uma retrospectiva das sete turmas e conhecer o impacto que o programa teve nas pessoas bolsistas e em seu vínculo com o desenvolvimento de políticas culturais de base comunitária.
Para este balanço, foram sistematizadas informações das pessoas bolsistas, compilados os relatórios apresentados ano a ano, e realizadas pesquisas específicas sobre sobre suas experiências e aprendizagens em primeira pessoa. Este balanço oferece uma perspectiva dos logros alcançados, as lições aprendidas e os desafios na consolidação e construção de políticas culturais de base comunitária na Ibero-América. A publicação se encontra aqui: https://cutt.ly/teBNn97n
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Confira o regulamento do edital: https://cutt.ly/heNvoKEt
Inscrições: https://mapa.iberculturaviva.org/oportunidade/539/#info
Consultas: programa@iberculturaviva.org
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Saiba mais sobre o curso:
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(*Atenção: para concorrer a uma das vagas, é necessário se inscrever através da plataforma Mapa IberCultura Viva. As pessoas que não forem selecionadas no edital e/ou aquelas que não são provenientes dos países integrantes do programa IberCultura Viva podem se inscrever pagando a matrícula do curso diretamente a FLACSO Argentina.)
Uma linha do tempo para IberCultura Viva: 10 anos de trabalho conjunto, cooperativo e solidário
Em 18, dez 2024 | Em Conselho Intergovernamental, Destaque, Notícias, Seminários | Por IberCultura
(Fotos: LR Fernandes)
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[SEMINÁRIO | TABELA 1]
Para comemorar seus 10 anos de existência, o programa IberCultura Viva vem utilizando uma analogia indígena: a da flecha que quanto mais a puxamos para trás, mais a projetamos para frente. Assim, o ato de resgatar a história tecida com a Cultura Viva tem sido pensado como algo que inevitavelmente nos leva a pensar no futuro. E daí surge a pergunta: que mundo queremos alcançar?
“Um mundo mais justo, solidário, cooperativo, no qual todos nós que aqui participamos temos que continuar gerando e redobrando esforços neste contexto tão complexo de polarização e discurso de ódio, que a cultura viva comunitária ajuda a combater”, respondeu Diego Benhabib, consultor de redes e formação da IberCultura Viva, ao apresentar uma linha do tempo do programa na primeira mesa do seminário comemorativo dos 10 anos que se realizou em Brasília, na manhã de 28 de novembro.
Esta linha do tempo, pensada para esses momentos de celebração e reflexão sobre o futuro, foi trabalhada com base em algumas referências contextuais importantes e nas atividades promovidas pelo programa. A compilação serviu para mostrar os resultados desta primeira década em uma publicação que foi montada como uma das ações comemorativas desenvolvidas este ano, junto com a edição de um vídeo, a reformulação do site www.iberculturaviva.org e a plataforma Mapa IberCultura Viva.
Embora o lançamento do programa tenha ocorrido em abril de 2014, no âmbito do VI Congresso Ibero-Americano de Cultura, em San José (Costa Rica), o livro “IberCultura Viva 10 Anos: Tecendo memórias, celebrando a diversidade, ampliando redes e construindo o futuro” começa em 2004, com o lançamento do programa Cultura Viva no Brasil. Daí surge uma agenda contextual, com eventos anteriores que serviram de base para a criação deste programa de cooperação.
Além de algumas declarações importantes, como a Convenção da UNESCO sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (2005) e a Carta Cultural Ibero-Americana (2006), a linha reúne encontros e congressos relevantes ligados à área, reuniões de Pontos de Cultura e Congressos de Cultura Comunitária Viva; políticas e legislações nacionais e locais, e algumas referências do programa, como os anos de adesão dos países, as reuniões do Conselho Intergovernamental, os planos estratégicos, as convocatórias, os concursos e as publicações lançadas.
“O espírito do IberCultura Viva tem a ver com essa articulação com a sociedade civil, essa ideia de gerar áreas de participação social, construir redes, e a ação intersetorial, de governos locais, movimentos sociais, um diálogo para melhorar a política e gerar linhas de ações vinculadas às necessidades próprias das organizações”, comentou Benhabib, que também incluiu na lista instâncias como a Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais e o Grupo de Trabalho de Sistematização, criados respectivamente em 2019 e 2021.
Este primeiro painel, denominado “Resultados e desafios do Programa IberCultura Viva”, foi dividido em três partes. A primeira foi dedicada à linha do tempo da cultura comunitária na região ibero-americana, e a segunda buscou traçar um panorama da cultura viva comunitária, com a participação de representantes dos países membros que viajaram a Brasília para a 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental, realizada nos dois dias anteriores. A terceira e última parte desta mesa de abertura (“Resultados e desafios para +10 anos”) foi liderada pela anfitriã Márcia Rollemberg, secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura e presidenta do Conselho Intergovernamental.
Flor Minici, secretária técnica do IberCultura Viva e mediadora desta mesa de seminário, destacou que quando falamos de resultados e desafios, falamos da dimensão do planejamento, mas também da dimensão participativa. “E como os resultados e as perspetivas dos desafios colocam diante de nós um debate que tem a ver com a governança, com as formas como as instituições articulam as relações muito particulares que na cultura viva existem entre as organizações, entre o Movimento de Cultura Viva Comunitária e também as políticas públicas”, afirmou.
Segundo ela, essa governança, pela qual o IberCultura Viva tenta transitar como uma governança democrática, é o que permite que novas agendas sejam debatidas hoje, “justamente porque há uma escuta e um trabalho permanente em relação à captação, ao processamento e à elaboração de agendas futuras, agendas estratégicas que partem do que está acontecendo no movimento, nas organizações, e também nas profundas transformações que estão passando a organização geral do nosso modo de vida e os modos de produção que habitamos.”
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A seguir, apresentamos as intervenções das e dos representantes dos países membros nesta primeira mesa do seminário, seguindo a ordem de participação.
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EL SALVADOR
Seguindo a linha do tempo apresentada por Benhabib, o salvadorenho Walter Romero iniciou sua intervenção dizendo que é oriundo do Movimento de Cultura Viva Comunitária, e que antes de ser representante de seu país no programa, participou do que considera o marco mais importante de El Salvador no tema: o fato de ter sediado o 2º Congresso Latino-americano de Cultura Viva Comunitária, em 2015. “Para nós, foi o posicionamento mais importante para, desde o movimento, podermos dialogar com quem estava no governo. Isso deu origem à criação em El Salvador, em 2016, de um incentivo chamado Pontos de Cultura, inspirado na experiência brasileira e em todo o movimento que vinha se desenvolvendo”, destacou.
“Isso contribuiu para que pudéssemos gerar e tornar visíveis as iniciativas que em El Salvador já desenvolviam a cultura viva nos territórios, possibilitando que as organizações fossem reconhecidas como Pontos de Cultura. Foi uma das primeiras vezes que conseguimos acessar fundos competitivos para apoiar estas iniciativas que, como diz um amigo, já funcionavam nos territórios, sem o Estado, apesar do Estado, e inclusive contra o Estado”, acrescentou.
Em 2019, Romero ingressou no governo e assumiu o cargo de REPPI (representante) do país no programa. Depois de alguns meses, veio a pandemia. “Foi uma fase muito, muito difícil para todos. Uma das primeiras iniciativas foi dar assistência alimentar imediata para poder levar recursos e alimentos à população, a todas as pessoas do movimento de Cultura Viva”, lembrou, antes de destacar algumas iniciativas do programa, como os editais que permitiram o acesso a recursos financeiros para promover as festas que acontecem nos territórios, e as bolsas de estudo para processos de formação de organizações e grupos de cultura viva comunitária.
“O importante que aprendemos ao longo do caminho é que esta é uma dinâmica de construção coletiva, de um diálogo que pode e deve existir entre organizações comunitárias e funcionários públicos que no momento têm esta dinâmica de tomada de decisão. É um prazer estar aqui e esperamos vê-los no México, no 6º Congresso Latino-americano de Cultura Viva Comunitária”, concluiu.
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EQUADOR
Marcia Ushiña, representante técnica do Equador no programa, também seguiu o cronograma iniciado por Benhabib, destacando que para seu país foi importante a expedição da Lei Orgânica da Cultura, em 2016. Esta lei define as atribuições, competências e obrigações do Estado, os fundamentos das políticas públicas que visam garantir o exercício dos direitos culturais e da interculturalidade, contemplando a Cultura Viva Comunitária nos seus princípios.
“Este é o marco regulatório que nos permite atuar na alocação de financiamento para projetos e na aproximação com organizações que trabalham em políticas públicas em suas comunidades. É o que permite o fortalecimento das organizações e uma revitalização com consciência política daquilo que são os seus costumes, a sua memória, as suas línguas”, frisou.
Conforme detalhou Ushiña, em 2016 foi emitida a Lei Orgânica da Cultura, e em 2017, o Equador entrou no programa. Nos últimos anos, o governo equatoriano lançou três concursos públicos para atribuir fundos a diferentes projetos e propostas de gestores culturais de comunidades, cidades, nacionalidades e territórios descentralizados, inicialmente com o objetivo de fortalecer atividades em função das suas tradições.
”Atualmente, o que pretendemos é entrar com mais cuidado e com mais orçamento para fortalecer as organizações, sua política, sua organização, em função da revitalização dos resgates da memória, da segurança alimentar e também na defesa da natureza. Esse é, digamos, o modelo com o qual vamos agora construir os próximos encontros e concursos públicos”, afirmou.
Segundo ela, desde o ano em que o Equador faz parte do programa, foram disponibilizados recursos para cerca de 70 projetos, que foram desenvolvidos em diferentes cidades e províncias do país, tanto nas montanhas, no litoral e na Amazônia. “Tem sido um aprendizado constante, permanente, mas também muito desafiador”, comentou.
Este ano, no mês de julho, foram anunciados os 30 projetos vencedores do concurso público “Cultura Viva Comunitária: difusão, promoção e fortalecimento de comunidades”. Esses projetos estão em fase de implementação e o desafio agora é acompanhar como estão se desenvolvendo, para que isso sirva de experiência para os próximos que receberão os recursos em 2025.
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COSTA RICA
Johanna Madrigal Araya, diretora de Gestão Sociocultural do Ministério da Cultura e Juventude da Costa Rica, lembrou que seu país sediou o VI Congresso Ibero-americano de Cultura, que aconteceu na cidade de San José, de 11 a 13 de abril de 2014. Neste evento, que teve como tema culturas vivas comunitárias, foi lançado oficialmente o programa IberCultura Viva. “Tivemos a honra de acolher as primeiras sessões de trabalho e isso tem sido fundamental para o nosso país. Nos sentimos honrados em fazer parte do programa IberCultura Viva, que nos ensinou muito”, disse.
Uma das principais lições aprendidas, segundo ela, tem a ver com o fato de que um programa de Pontos de Cultura, como o que existe na Costa Rica desde 2015, é uma possibilidade flexível e adaptável ao contexto e às diferentes diversidades e realidades dos países. “Cada um dos nossos países conseguiu assimilá-lo, operá-lo de diferentes formas e a partir daí também pudemos aprender e replicar tudo isso em outros serviços que oferecemos no Departamento de Gestão Sociocultural”, comentou, destacando o contribuição do programa na implementação da Política Nacional de Direitos Culturais do país.
“O IberCultura Viva veio para nos dar mecanismos, instrumentos para entender, para orientar como realizar parte da nossa política e como buscar cada vez mais o acesso e o exercício efetivo, bem como o gozo dos direitos culturais tão necessários na região ibero-americana e que estão abandonados há muito tempo. Em geral, fala-se muito sobre direitos humanos, mas infelizmente os direitos culturais foram deixados para trás. Temos que continuar lutando, ativando espaços, trabalhando para que haja cada vez mais acesso a isso. Acredito que a partir do programa, na participação que fazemos internamente em cada um dos países, é esse o compromisso e o esforço que procuramos”, notou.
A representante da Costa Rica também mencionou a importância de participar do Comitê Executivo e do Conselho Intergovernamental do IberCultura Viva, com a intenção de continuar a trabalhar juntos para construir melhores realidades em cada um dos países e na região como um todo. “Temos interesse em estar lá, poder estar mais perto das comunidades, dos territórios, das organizações de base comunitária. É aí que está o nosso grande desafio: cada vez mais implementar, buscar, pesquisar como se conectar, se aproximar das populações e de sua diversidade. Então é seguir compartilhando, criando em conjunto para um futuro melhor, para uma região ibero-americana melhor, com acesso e fruição dos direitos culturais”.
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URUGUAI
Ao expressar a sua alegria em participar nestes dias de trabalho em Brasília, o uruguaio Juan Carlos Barreto disse considerar muito importante garantir que um programa com essas características esteja completando 10 anos. Ele destacou o poder das redes de trabalho colaborativo, o fato de poder ouvir as experiências das e dos companheiros e ver como se pode melhorar as ações desenvolvidas no seu país, como, por exemplo, o programa Pontos de Cultura, um dos mais importantes na política cultural territorial.
Além de reforçar que os Pontos de Cultura estão distribuídos por todo o Uruguai, “em diferentes regiões, com suas diferentes características e identidades”, Barreto mencionou outras iniciativas da área de Gestão Territorial da Direção Nacional de Cultura, como o programa de Festivais Uruguaios, que trabalha para fortalecer, apoiar e reconhecer as festas populares como patrimônio imaterial do país, e o programa Usinas Culturais, que está completando 15 anos.
Localizadas em todo o território nacional (mais de 20 em funcionamento), as Usinas Culturais são centros regionais que dispõem de salas de gravação musical e equipamentos para produção audiovisual. O objetivo central é promover o potencial criativo de cidadãos e cidadãs por meio da utilização de novas tecnologias, com acesso democrático e gratuito. “É um programa que vale muito a pena conhecer. Nesse período, muita gente já passou por lá”, afirmou.
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CHILE
Marianela Riquelme Aguilar, vice-presidenta do IberCultura Viva e chefa do Departamento de Cidadania Cultural do Ministério das Culturas, das Artes e do Patrimônio do Chile, iniciou sua participação nesta mesa mencionando o “orgulho” de poder estar no programa desde o começo. “Desde 2015, o Chile participa, oferecendo às organizações culturais comunitárias – e hoje aos Pontos de Cultura Comunitária – as possibilidades de ter esta base, uma base de partilha, de alianças, de tecer redes importantes para as organizações culturais comunitárias”, destacou.
Abrindo sua apresentação sobre o programa Pontos de Cultura Comunitária, que está em seu segundo ano de implementação no Chile, ela explicou que este é também o resultado do trabalho que vem sendo realizado neste âmbito. “O programa IberCultura Viva significou para muitos países um refúgio, um espaço de resistência contra os altos e baixos das ondas que recebemos de diferentes governos, diferentes administrações nacionais e territoriais, que muitas vezes sentem uma desconexão com as comunidades. Hoje temos no Chile o compromisso do presidente Gabriel Boric de lançar um programa como os Pontos de Cultura, Comunitária, que consegue converter uma política pública em uma política latino-americana, abraçada por muitos países no que diz respeito ao trabalho das comunidades”.
Um processo participativo
Quanto ao processo de construção da política pública, Riquelme destacou o trabalho colaborativo das organizações culturais comunitárias do Chile que se espalham por todo o território nacional, reconhecendo que, sem elas, não seria possível ter um programa como o que existe hoje. “Esta tem sido a conclusão de um processo interessante de articulação, de partilha de experiências, de partilha de saberes entre países, do ponto de vista técnico, mas também do ponto de vista mais humano e territorial”, celebrou, destacando a necessidade fazer a vinculação entre as linguagens da institucionalidade e os tempos e linguagens das comunidades no território.
A implementação do programa Pontos de Cultura Comunitária no Chile ocorreu após um processo participativo em que foi possível realizar 121 Diálogos Cidadãos nas 16 regiões do país, em outubro e novembro de 2022, com mais de 1.400 participantes pertencentes a 825 organizações culturais comunitárias. Nestes espaços de conversa articulados pelo Ministério das Culturas, das Artes e do Património, representantes de municípios e organizações culturais comunitárias puderam partilhar, propor e discutir, com base nas suas experiências territoriais, propostas para o desenvolvimento de um programa público de culturas comunitárias.
O programa, que foi divulgado em 2022 e começou a ser implementado em 2023, conta hoje com 535 Pontos de Cultura Comunitária cadastrados em todo o país. Uma cifra que, segundo a representante do Chile, é “absolutamente diversa, muito enriquecida por todo o trabalho que as pessoas realizam no seu território, com a realidade que em algumas ocasiões é muito difícil, mas com a força que nos dá o trabalho solidário que é gerado no âmbito da cultura viva comunitária para o bem viver”.
Neste registo nacional há uma importante representação dos povos indígenas, particularmente dos andinos Aymara, com uma percentagem bastante elevada, superior à dos Mapuche e Kolla, e também com a incorporação do povo Rapa Nui. Também estão representadas pessoas idosas, com deficiência, crianças, adolescentes e comunidades migrantes pertencentes a organizações comunitárias, o que confirma a diversidade que possuem em seus territórios.
“São organizações sem fins lucrativos que têm raízes comunitárias e um impacto positivo reconhecido em cada um dos territórios que habitam, com reconhecimento local e uma valorização importante das suas comunidades”, reforçou a vice-presidenta do programa, explicando que o apoio é dado por meio de linhas de trabalho dedicadas ao fortalecimento de organizações culturais comunitárias e planos de articulação, para que possam se vincular com outras organizações e desenvolver ações conjuntas. Outra linha interessante que estão desenvolvendo é a formação, que conta com a colaboração de um consórcio de universidades do Chile.
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REPÚBLICA DOMINICANA
Henry Mercedes Vales, diretor geral de Mecenato do Ministério da Cultura da República Dominicana, anunciou no encontro em Brasília a incorporação plena do país ao IberCultura VIva, após um ano de participação nas atividades do programa como país convidado. Ele iniciou sua participação nesta mesa mencionando a celebração da XXI Conferência Ibero-americana de Ministros e Ministras da Cultura que se realizou em Santo Domingo, no dia 21 de outubro de 2021, e um dos acordos alcançados nessa ocasião: o de promover a coordenação com diversos atores para o financiamento de projetos culturais que promovam o mecenato cultural na América Latina e deem visibilidade à cultura como objeto de responsabilidade social corporativa. “Como a questão do mecenato está ligada à questão da cultura comunitária? É o mecanismo que temos neste momento para podermos buscar financiamento, buscar a sustentabilidade dos projetos culturais”, explicou o diretor.
O Ministério da Cultura foi criado na República Dominicana em 2000. Em 2010, foi emitida uma nova Constituição, que em seu artigo 67 estabelece a questão dos direitos culturais. Henry Mercedes disse que de 2013 a 2019 houve uma convocatória que teve um impacto muito direto nos projetos culturais de base comunitária, nos projetos de cultura viva, mas a pandemia da Covid-19 desmantelou todos esses processos. A ideia de ativar a Lei do Mecenato seria então o mecanismo de financiamento desses projetos, porque viria de fundos do setor privado, e também da Cooperação e de fundos públicos de outras instituições que pudessem ser articuladas.
Além disso, ele comentou que o Ministério da Cultura tem, por exemplo, uma Direção de Participação Popular, onde existe um Departamento de Carnaval, algo que se celebra no seu país, em diferentes regiões, durante todo o mês de fevereiro, e como uma festa que se repete em datas diversas, como no dia 16 de agosto, feriado da Independência, e até na Semana Santa, quando uma cidade o celebra nos cemitérios, sobre as sepulturas. “Em algumas cidades, o Carnaval é uma expressão viva que se manifesta com grande diversidade”, assinalou.
Nesta mesma direção está o Departamento de Cultura de Bairro, que trabalha todos os dias para fortalecer a identidade cultural dos bairros, promovendo práticas e tradições que enriquecem as comunidades. “É um departamento ativo e que trabalha muito diretamente com todas as manifestações populares”, disse, antes de destacar alguns projetos apoiados por meio do mecanismo de mecenato, como um festival de teatro infanto-juvenil, uma iniciativa de uma associação que trabalha com a questão da violência de género em abrigos; um projeto sobre a história do merengue, além de projetos voltados à criação de um sistema de informação e gestão de projetos culturais e outro vinculado à formação de gestores culturais.
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PARAGUAI
Estela Franceschelli, que recentemente assumiu a função de representante do Paraguai no IberCultura Viva, iniciou a sua apresentação dizendo que no seu país, em 2010 e 2011, foram instalados 98 Pontos de Cultura. “As idas e vindas das mudanças de governo e de orientações fizeram com que esses 98 Pontos de Cultura enfraquecessem progressivamente. Porém, neste momento temos 47 Pontos de Cultura reconhecidos”, explicou, lembrando que em 2021 o governo paraguaio apresentou o programa Pontos de Cultura como uma das estratégias para a reativação do setor cultural, após o período de emergência sanitária, a fim de fortalecer e garantir a sustentabilidade dos espaços e centros culturais comunitários em todo o país.
O Paraguai foi um dos primeiros países a aderir ao programa IberCultura Viva após a sua criação, aprovada em outubro de 2013, na 23ª Cúpula Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo, na Cidade do Panamá. A Secretaria Nacional da Cultura esteve presente nas reuniões do Conselho Intergovernamental de 2014 a 2016, ano em que saiu do programa. Após participar das atividades do IberCultura Viva durante o ano de 2022, como país convidado, o governo do Paraguai oficializou sua reincorporação ao Conselho Intergovernamental como país membro em março de 2023.
“Na Secretaria de Cultura do Paraguai existe um mandato primeiro e fundamental, que é o de garantir direitos. Às vezes falhamos um pouco no objetivo, mas no geral é o que temos feito e isso se reflete no fato de hoje existirem três redes nacionais de gestores culturais comunitários. A maioria deles vem de comunidades e cidades muito pequenas, muitos povos indígenas. O programa IberCultura Viva tem proporcionado compreensão, reflexão e análise. Precisamos muito de tudo isso, mas ainda assim acho que estamos no caminho certo”, afirmou.
Estela Franceschelli também mencionou os três projetos do Paraguai que foram selecionados este ano no Edital IberCultura Viva de Apoio a Redes e Projetos de Trabalho Colaborativo e estão em andamento em seu país. São eles: o 4º Encontro Nacional de Gestão Cultural Comunitária, apresentado pelo Centro de Desarrollo de las Artes y la Cultura Avaré Sumé; “Por uma lei para espaços culturais no Paraguai”, apresentada por Red Escucha, e “Inclusão Digital para o Desenvolvimento Cultural no Chaco Paraguaio (IDDC Chaco)”, proposta pela Asociación Melodía para la Promoción de la Educación y la Cultura.
“El Chaco é uma área muito pobre, bastante abandonada, muito seca, quase sem internet, com muitos povos indígenas e grandes áreas despovoadas. Porém, para esta jornada de formação, temos mais de 4.550 gestores comunitários inscritos, que vão participar de uma capacitação intensiva para aprender a administrar redes sociais e se interconectar”, comemorou a REPPI do Paraguai, referindo-se ao projeto de criação da rede Chaco. de gestores culturais comunitários. “Por outro lado, acabamos de ter uma experiência bastante importante a nível urbano, as jornadas de formação e reflexão da Red Escucha, que é uma rede de centros e espaços urbanos com um grande desafio de refletir, analisar e construir uma proposta de lei que regulamente os espaços públicos comunitários”.
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ESPAÑA
Jazmín Beirak, diretora geral de Direitos Culturais do Ministério da Cultura da Espanha, disse estar muito feliz pela oportunidade de ter podido partilhar estes debates, naquela que foi a sua primeira participação no Conselho Intergovernamental do IberCultura Viva. Sua apresentação começou com a explicação de que a Direção Geral dos Direitos Culturais, criada há nove meses, é a primeira ação concreta institucional de um compromisso político do governo espanhol. “Quando esta nova equipe governamental chegou ao Ministério da Cultura, um dos eixos fundamentais que quis introduzir foram os direitos culturais, como linha estratégica para colocar a cidadania no centro, como principal destinatário da ação pública”, afirmou.
Segundo ela, o trabalho tem se concentrado em manejar um conceito extenso de cultura, saindo da dicotomia da cultura como objeto de consumo, como obra, e encontrando-a mais com a ideia de cultura como o comum, como o compartilhado. “E também compreender que o direito de acesso à cultura vai além do direito aos bens e serviços, do direito aos espetáculos, como usuário, como espectador. Antes disso, tem a ver com o desenvolvimento de capacidades, de uma identidade, de um pertencimento comunitário, com o manejo dos códigos e de um património, com a cultura comunitária, com as tradições, com a própria gestão dos projetos culturais”, acrescentou.
Nesse sentido, o Ministério da Cultura alinhou-se com o que já diziam a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais sobre a ideia de participar da vida cultural, e tem procurado abordar questões como a atenção ao território, a igualdade, a ideia de que a existência de uma oferta cultural não garante o acesso à cultura e à participação cultural, mas sim que são necessárias políticas específicas que tenham em conta condições e determinantes para isso. “Entender a diversidade num sentido amplo, étnico, racial, linguístico, com atenção às deficiências, à igualdade de género. E a ideia da transversalidade da cultura, entendendo que a cultura não é um setor separado do resto das nossas realidades, mas que tem muito a ver, por exemplo, com a educação, com a saúde”, resumiu.
Para Beirak, a incorporação dos direitos culturais na ação do Ministério permitiu-lhes completar e complementar algo que já estava sendo realizado do ponto de vista setorial e patrimonial. “Agora, na Espanha, chamamos este marco de ‘Direitos Culturais’, e é algo que tem uma tradição de décadas, mas também outros significantes, entre eles a cultura viva, a democracia cultural, os impactos sociais da cultura. É todo um campo semântico no qual estamos falando de elementos muito semelhantes. Por isso é essencial olhar a América Latina em tudo isto, porque só temos uma política institucional há 9 meses, e aqui há projetos que já duram 20 anos, 15 anos, 10 anos. Para nós, é fundamental olhar para o que vocês estão fazendo, aprender e transferir esse conhecimento para o nosso território”, afirmou.
Um dos dois importantes projetos em que estão trabalhando é o Encontro “Cultura e Cidadania”, que é anterior ao lançamento da Direção Geral dos Direitos Culturais, mas que segue a mesma linha, embora sem o nome “direitos culturais”. “É um encontro que existe há 10 anos e que nos tem ajudado a dar visibilidade, gerar redes, conectar e valorizar todas aquelas práticas comunitárias que se desenvolvem no território espanhol, com uma ideia de inovação, experimentação, geração de uma nova institucionalidade. E que também tem uma derivada no meio rural, Cultura e Ruralidades”, explicou.
A 11ª edição do encontro “Cultura e Cidadania” terá lugar em Barcelona em setembro de 2025, dias antes da celebração do Mondiacult, e com os seus principais eixos temáticos alinhados com os que serão discutidos neste evento da UNESCO: os direitos culturais, a cultura da paz e a inteligência artificial.
O segundo projeto que está em curso é o primeiro Plano Nacional dos Direitos Culturais, que tem apresentação prevista para maio de 2025. “No fundo é um roteiro que traçamos, um instrumento que nos vai ajudar a identificar quais ações vamos querer realizar na Direção dos Direitos Culturais. É um plano ambicioso, composto por 13 eixos que organizam todas as ações que queremos desenvolver”, adiantou.
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Uma rede espanhola de Pontos de Cultura
Um desses eixos é o do território, do desenvolvimento local e do desenvolvimento comunitário, no qual está prevista a possibilidade de implementar uma rede de Pontos de Cultura na Espanha. Outros exemplos seriam um eixo específico de educação, para que as políticas possam ser partilhadas com o Ministério da Educação, e um eixo de avaliação da política cultural, a ser reivindicado como uma política de igualdade com as políticas de trabalho, de finanças, de segurança social. Ou seja, algo que não dependa do gosto de quem governa num determinado momento, e que não se trate de uma “política decorativa”, mas sim de uma política pública como todas as outras.
“É também um processo ambicioso em termos de participação. Temos contado com associações, entidades, especialistas que trabalham na área dos direitos culturais, são mais ou menos 300, 400 pessoas participando. Também com o setor profissional, com as indústrias culturais. Nos parece fundamental abrir esse espaço porque acreditamos que é preciso compreender que são vasos comunicantes, ou seja, não é antagônico levar arte e cultura às escolas, pois isso ajuda as indústrias a formar público e a gerar profissionais. É um circuito que você tem que saber conectar”, acrescentou. Para a participação dos cidadãos e cidadãs, a Direção Geral dos Direitos Culturais criou uma plataforma online, por meio da qual recolheram cerca de mil contribuições.
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MÉXICO
Norma Cruz Hernández, responsável técnica do México, destacou a importância destas jornadas de trabalho para gerar novas perspectivas e colaborações, e agradeceu às organizações culturais de base comunitária, “o coração do movimento, a razão pela qual o programa IberCultura Viva está aqui”. “Todo o nosso reconhecimento vai para as organizações de cada um dos países”, reforçou, antes de voltar à linha do tempo iniciada por Diego Benhabib e lembrar que o México participa do programa desde o seu início, em 2014; esteve na presidência do Conselho Intergovernamental no triénio 2021-2023, e em 2024 segue integrando o Comitê Executivo. “Continuamos nesse aprendizado, nesse fortalecimento, nessa luta pela potência da cultura viva.”
Ao mencionar o impacto que IberCultura Viva teve em seu país, ela destacou que mais de 120 pessoas, integrantes de organizações de povos originários, indígenas e afrodescendentes, estiveram presentes nas diversas convocatórias e concursos do programa, e que no Mapa IberCultura Viva estão cadastradas mais de 140 organizações culturais comunitárias e mais de 900 agentes mexicanos.
Mencionou, também, que a experiência adquirida com a participação no programa contribuiu para a criação do programa Cultura Comunitária, que a Secretaria de Cultura do Governo do México instituiu a partir de 2019, buscando destacar que a cultura é um direito humano e que são as pessoas, as comunidades, as localidades, que estão no centro das políticas culturais. “Temos uma dívida histórica com todas as populações que foram excluídas de alguma forma. É aí que devemos construir, começando de baixo para cima”, assinalou.
Uma das principais apostas do programa Cultura Comunitária no México são os Semilleros Creativos, um modelo pedagógico de formação artística voltado para infâncias e juventudes em condições de vulnerabilidade. Nesses grupos, crianças e jovens podem aprender linguagens artísticas (artes cênicas, artes visuais, escrita criativa, música, produção audiovisual) e expressões culturais (línguas indígenas e artes tradicionais, como têxteis, bordados, cerâmica e brincadeiras) gratuitamente, com o objetivo de desenvolver atitudes e habilidades e participar da vida cultural de suas comunidades.
Norma Cruz explicou que os Semilleros Creativos são criados a partir de um diagnóstico, que lhes permite mapear em nível nacional quais são as áreas onde há alto índice de violência, atraso social, os pontos que têm interesse em abordar com maior prioridade para que as crianças e os jovens tenham espaços mais seguros para si e para as suas famílias. Hoje existem mais de 400 Semilleros Creativos no país, e neste período foram realizadas mais de 36 mil atividades, onde participaram mais de 4 milhões de pessoas de 711 municípios.
Outra área de atuação do programa Cultura Comunitária são as jornadas culturais comunitárias, que buscam a recuperação afetiva dos espaços públicos. “São atividades que estão de alguma forma ligadas a ferramentas de mediação sociocultural e são intergeracionais. Aqui recuperamos espaços muitas vezes em desuso ou relacionados com a violência”, explicou, antes de salientar a importância da formação e da participação cultural comunitária. “A partir do programa acreditamos também que as pessoas são públicos ativos, que tudo começa na escuta das necessidades e interesses, que tudo se constrói em conjunto e partilhado.”
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BRASIL
João Pontes, diretor da Política Nacional de Cultura Viva e representante do Brasil no IberCultura Viva, falou sobre a alegria de poder retomar esta política, que começou como um programa em 2004, num momento de democratização do país, de efervescência política, de construção de uma esfera de participação. “Esta é uma resposta importante e criativa do país para o debate sobre os direitos culturais”, afirmou.
Ao contextualizar o caminho percorrido até o lançamento do programa Cultura Viva no Brasil, há 20 anos, ele fez referência à experiência francesa do Ministério dos Negócios Culturais, na segunda metade do século 20, quando se passou a entender a importância de promover políticas públicas para o conjunto da população, e citou iniciativas de governos progressistas em cidades como Porto Alegre e São Paulo, em especial na gestão de Marilena Chauí, com as experiência de descentralização da cultura, em que o Estado e as prefeituras disponibilizavam oficinas e atividades nos territórios e comunidades.
“A cultura viva vem como uma inovação importante, que é o reconhecimento de que não cabe ao Estado somente levar bens e serviços culturais, de que não compete ao Estado promover o acesso aos cidadãos e cidadãs somente por meio dos equipamentos, mas sim reconhecendo o conceito de que em todos territórios e comunidades já existem grupos culturais que promovem o acesso da população, que são as raízes mais profundas da sua diversidade cultural. É neste espírito que surge o programa Cultura Viva”, comentou.
Do discurso de posse do ministro Gilberto Gil, em janeiro de 2003, ele trouxe o trecho do “do-in antropológico”, a ideia do Estado massageando pontos vitais, mas momentaneamente desprezados ou adormecidos, do corpo cultural do país. Falou do sentido filosófico programático, “ao mesmo tempo simples e sofisticado”, do que são os Pontos de Cultura, esses pontos que não tem fórmula nem regra, que podem ter sede ou não, podem trabalhar com formação, criação, produção e/ou difusão, mas que tem como princípio básico a presença da comunidade nesses processos culturais, de forma gratuita e continuada.
Depois de lembrar algumas ações que se realizaram ao longo desses 20 anos de Cultura Viva no Brasil, como Ação Griô e Cultura de Ponto a Ponto, João Pontes chamou a atenção para a forma como esta política é entendida hoje no Brasil: é a política de base comunitária do Sistema Nacional de Cultura. Ou seja, assim como os sistemas de saúde ou de educação têm seus postos de saúde e suas escolas, aqui se encontram os Pontos e Pontões de Cultura, em diálogo com o poder público, mostrando que a sociedade civil não é apenas beneficiária, e sim protagonista na execução da política.
“A participação é uma diretriz fundamental. Não haveria outra forma de fazer a política pública senão em diálogo, de maneira horizontal, com a sociedade civil”, destacou o diretor. Em 2025, os fóruns, onde se dão os principais diálogos e participação, terão sua grande edição junto à Teia, o encontro nacional dos Pontos e Pontões de Cultura, que se realizará entre setembro e outubro na cidade de Vitória (Espírito Santo).
Em sua apresentação, Pontes também destacou a aprovação da Lei Cultura Viva, que transformou o programa em política de Estado em 2014 (“uma lei de autoria da deputada Jandira Feghali, com forte participação da sociedade civil na sua construção e mobilização do Ministério da Cultura”). Falou do cadastro nacional, que hoje conta com 6.500 Pontos e Pontões de Cultura em todo o Brasil; de instrumentos que facilitam as formas de parceria entre a sociedade civil e o Estado, como o Termo de Compromisso Cultural (TCC), e do recém-aprovado Marco do Fomento à Cultura, “que tem uma forte inspiração na Lei Cultura Viva e sua regulamentação, porque tem o foco no objeto dos processos culturais e não nos instrumentos”.
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Cinco gerações de Cultura Viva
Para o Ministério da Cultura, esta é a quinta geração da política de Cultura Viva. A primeira abarca o período 2004-2008, com os primeiros editais do MinC; a segunda, entre 2008-2014, é marcada pela descentralização de recursos e o redesenho do Cultura Viva. A terceira (2014-2016) inicia com a aprovação da lei e com instrumentos que facilitam a parceria entre Estado e sociedade civil. “Em 2016, tivemos o golpe parlamentar no país e um processo de desmonte da política pública. Não por completo, porque vimos servidores e servidoras que vieram em defesa dos instrumentos, mas paramos de ter investimento, editais, e havia um ambiente de censura e perseguição aos grupos culturais. Agora estamos nesta quinta fase, de reconstrução, de retomada de diálogo com a sociedade civil, de maior pactuação entre estados e municípios”, resumiu.
Essa reconstrução, segundo ele, é feita a partir da base com a rede de Pontões de Cultura, que hoje somam 42, atuando em quase todos os estados brasileiros (com exceção de 4), sendo 15 deles temáticos. E acima de tudo, é uma retomada feita com o maior investimento da história da Política Nacional de Cultura Viva (PNCV), a partir da vinculação de recursos da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB).
A PNAB prevê recursos por um período de 5 anos, garantindo um mínimo de 10% do valor total para a PNCV. São 3 bilhões de reais por ano, 15 bilhões de reais ao todo; o que dá para a PNCV um mínimo anual de 300 milhões de reais (cerca de 50 milhões de dólares). Neste primeiro ano de implementação, por uma decisão da ministra da Cultura, a vinculação foi de 13%, o que significou um valor de 388 milhões de reais para a PNCV. A expectativa de fomento, segundo o diretor, é de 14 mil Pontos e Pontões de Cultura.
“Este é um momento muito importante. Em todas as 27 unidades da federação, vinculamos para 696 municípios. E mais do que o dobro, por vontade própria, decidiram vincular seus recursos à Cultura Viva, o que faz com que este número de municípios passe de 1.400. Como os governos estaduais também terão seus editais, a gente acha que pode chegar a 2 mil municípios brasileiros com Pontos de Cultura fomentados”, anunciou João Pontes.
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Seminário comemorativo: resultados e desafios do IberCultura Viva para os próximos 10 anos
Em 18, dez 2024 | Em Notícias, Seminários | Por IberCultura
(Fotos: LR Fernandes)
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[SEMINÁRIO | MESA 1]
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O ano de 2024 marcou não apenas os 10 anos do programa IberCultura Viva, mas também os 20 de Cultura Viva no Brasil. As comemorações dessas duas efemérides foram estruturadas em quatro eixos (Memória, Reflexão, Futuro e Celebração) que se distribuíram entre as mesas dos dois seminários propostos para festejar a história vitoriosa desta política cultural de base comunitária, que surgiu no Brasil em 2004 e desde então vem inspirando diferentes países no Espaço Ibero-americano. O primeiro seminário, centrado no modelo brasileiro, foi realizado em Salvador (Bahia), em julho deste ano. O segundo, que celebrou a primeira década deste programa de cooperação, se deu em Brasília, nos dias 27 e 28 de novembro. A mesa inaugural, dedicada aos resultados do IberCultura Viva nesses 10 anos, passou também pelo impacto desta política no Brasil e os desafios para os próximos 10 anos.
Para Márcia Rollemberg, secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura do Brasil e presidenta do IberCultura Viva, um dos principais resultados desse processo é o impacto desta política junto à sociedade civil, e a sociedade civil impactando o Estado. “É uma relação que trouxe inovações de democracia, de qualificar processos democráticos. O programa Cultura Viva inspirou o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), que se construiu no mesmo período, em um processo permanente de participação. Hoje a gente tem a participação social não só na escuta, mas na gestão da política. A gente senta com a Comissão Nacional de Pontos de Cultura para implementar estratégias”, comentou.
Na apresentação que encerrou a primeira mesa do seminário, a presidenta também destacou a importância do diálogo e da construção conjunta com a rede de Pontões de Cultura que hoje existe no Brasil. São 42 Pontões fomentados pelo Ministério da Cultura, 27 territoriais e 15 temáticos, fazendo inclusive parcerias com outros ministérios, em áreas como patrimônio e memória, gênero, educação, acessibilidade, culturas indígenas, cultura de matriz africana, entre outras pautas.
“É (necessário) esse entendimento da cultura como um determinante da saúde, como um componente intrínseco, o primeiro da nossa humanidade, do nosso processo educacional, e esses componentes todos que a gente vive no momento para a promoção da diversidade, uma diversidade que foi tão negada nessa região.”, observou. “Este é um momento de refletir sobre a nossa história e de encontrar capítulos comuns. Nas culturas indígenas, por exemplo. Os povos originários já estavam aqui, e esta não é uma história de 500 anos. É milenar. Eles já ocupavam essa região e não tinham essas fronteiras de países. Eram povos, nações, e até hoje são. Precisamos entender que temos uma dívida com relação a isso”.
Segundo ela, é tempo de falar de direitos culturais e de como eles fortalecem um conjunto de direitos, como o direito ao território, o direito a ser quem se é, o direito a ter a própria história contada e visibilizada. “Vivemos em um mundo que nos pede atitude, como vamos agir. Acho que este é um momento de reflexão e de buscar essa ação”, comentou, ressaltando que esta é uma pauta presente em todo o mundo, inclusive por conta das guerras, dos movimentos migratórios.
Pensando na cultura como um conjunto de normas e responsabilidades em três dimensões (simbólica, econômica e cidadã), Márcia Rollemberg buscou chamar a atenção também para o fato de que o exercício dos direitos culturais, além de potencializar esses direitos, a equidade e a inclusão, “nos permite conectarmos em redes, tecendo histórias muitas vezes não contadas, favorecendo encontros.”
Por isso, ao fazer um balanço desses primeiros anos do IberCultura Viva, ela pontuou como primeiro resultado a cooperação para expandir esta política que reconhece os direitos culturais, “que não é só o direito de acessar a cultura, mas o direito de fazer a cultura”. Um segundo resultado seria o estímulo à participação, ao intercâmbio e ao fortalecimento das redes da sociedade civil, e um terceiro seria a ampliação da política de Pontos de Cultura na Ibero-América, numa integração e inter-relação que transcende os governos.
“Queremos contribuir com o mundo, com esta grande diversidade, esta nossa alegria, esta forma de ser e de bem conviver, e buscar fazer disso uma realidade, porque sabemos que temos nossas contradições”, acrescentou. “Que a gente possa trabalhar pelos cinco ‘pês’ do Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): pessoas, planeta, prosperidade, paz e parcerias. Porque, como sempre digo, a cooperação é a moeda do terceiro milênio: se não a utilizamos bem, vamos torrar o mundo e não vai sobrar mais ninguém.”
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Trabalho colaborativo
Em sua intervenção, ela lembrou que, no âmbito deste programa de cooperação, o trabalho colaborativo conta com vários componentes: a Secretaria Geral Ibero-americana (SEGIB), como organismo de parceria; os governos dos países membros; os movimentos e redes locais, nacionais e latino-americanas de cultura de base comunitária; os governos de estados, províncias e municípios; os agentes e fazedores de cultura, “que são nossa razão de existir”. Todos unidos para alcançar um mesmo objetivo.
Olhando para trás, vendo os resultado do presente, ela cita alguns, como a bem-sucedida experiência de formação iniciada em 2018 com o Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária, desenvolvido em conjunto com a Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (FLACSO-Argentina); a composição do Banco de Saberes Culturais e Comunitários IberCultura Viva; as publicações feitas nesse período; o Grupo de Trabalho de Sistematização que se formou com 59 pesquisadores e pesquisadoras de 10 países ibero-americanos e que em breve se desdobrará também na Rede Educativa IberCultura Viva.
Mirando para os próximos 10 anos, jogando a flecha lá adiante, Márcia Rollemberg mencionou a importância de adotar novos compromissos, buscando sinergia temporal e histórica com o programa; de ter cada vez mais clara a dimensão da cultura como um bem público; de promover a democracia e a justiça social; de contribuir para a resiliência diante das mudanças climáticas, e de contribuir para superar os desafios propostos pela inteligência artificial. “Se bem utilizada, a inteligência artificial pode ser algo bom para todos, para que possamos ter tempo para desenvolver nossas inteligências emocionais, espirituais, sensoriais. Quem sabe não teremos uma nova dimensão de humanidade a partir da inteligência artificial?”, questionou.
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Compromissos para mais 10 anos
E para que o programa IberCultura Viva possa seguir por pelo menos mais 10 anos de travessia, a presidenta do Conselho Intergovernamental enumerou seis compromissos: 1) Qualificar os dados; 2) Ampliar a integração do campo da diversidade cultural; 3) Avaliar os impactos; 4) Dar mais visibilidade às políticas dos países membros; 5) Incorporar novos conceitos; 6) Melhorar a política de comunicação.
No primeiro deles, lembrou que toda política pública tem três pilares: informação, educação e comunicação. “É um bem público E qualquer política, para ser acessada, as pessoas precisam saber que ela existe. Então é importante a informação, saber se é efetiva, se funciona, buscar dados, evidências e controle social”, comentou. Segundo ela, os dados históricos de cada ação desenvolvida agregam valor à cooperação, e a disponibilidade e qualidade dos dados e informações contribuem para a melhoria das ações e das políticas que promovem a cidadania cultural, sempre alinhadas com a agenda local, nacional, regional e mundial.
Sobre o segundo compromisso, de ampliar a integração do campo de diversidade cultural, reforçou a importância da inclusão de segmentos que querem ser vistos e querem participar, partindo do princípio “Nada sobre nós sem nós” para promover mais a escuta, a participação social e a interação com novas vozes. Também mencionou a ideia de incorporar as questões de gênero, com estudos e ações específicas; valorizar e promover a rica diversidade cultural da região como um ativo para o desenvolvimento sustentável e o bem viver, além de potencializar os encontros de saberes ancestrais, tradicionais e populares, de povos indígenas, povos de matriz africana e de outros povos e comunidades que habitam nossos territórios.
A respeito do terceiro compromisso, de avaliação dos impactos, ela disse parecer difícil, mas não impossível. Nesse sentido, propôs dar visibilidade aos trabalhos desenvolvidos pelos alunos e alunas bolsistas da Pós-graduação em Políticas Culturais de Base Comunitária da FLACSO-Argentina, e aos impactos desse curso em suas trajetórias. E levantou questões relevantes que poderiam ser levantadas, como as maneiras com que os países membros fazem a avaliação de suas políticas culturais; quais as formas de avaliar o trabalho dos Pontos de Cultura nos diferentes países, como é a legitimação das comunidades, quais ferramentas de sistematização são utilizadas.
Dar mais visibilidade às políticas dos países membros, que seria o quarto compromisso, vem da ideia de ampliar e consolidar essa rede entre os países, potencializando as trocas de experiências e dando visibilidade às políticas de cultura de base comunitária de cada um deles. Ela também comentou que a participação em foros como Mondiacult, a Conferência Mundial da UNESCO sobre Políticas Culturais e Desenvolvimento Sustentável, que em 2025 terá lugar em Barcelona (Espanha), é fundamental para posicionar a cultura comunitária nos âmbitos internacionais vinculados à cultura.
O quinto compromisso, que diz respeito à incorporação de novos conceitos, incluiria questões como a vinculação entre a população e as políticas públicas diante de desafios propostos, por exemplo, pela cultura digital, pelas redes sociais e pela inteligência artificial. Além disso, há a intenção de criar grupos de trabalho (GTs) de participação social com novas agendas e outros atores sociais, especialmente as juventudes. E de ressaltar e potencializar a transversalidade da cultura, que valoriza, dá sentido e contribui para o alcance dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU.
Por fim, o sexto compromisso, de melhorar a política de comunicação, tendo em vista a tríade informação, educação e comunicação. “Quando falamos em qualificar a comunicação, falamos de uma comunicação pensada de maneira horizontal. De um processo interativo de respeito, de espaço, de um lugar de fala de cada um, de busca por consensos, por difundir seus conteúdos e experiências, por qualificar e difundir a produção do IberCultura Viva”.
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Este balanço apresentado por Márcia Rollemberg encerrou a Mesa 1 do seminário comemorativo (“Resultados e desafios do programa IberCultura Viva”), que também contou com uma linha do tempo da cultura de base comunitária na região ibero-americana, a cargo de Diego Benhabib, consultor de redes e formação do IberCultura Viva, e um panorama da Cultura Viva Comunitária, traçado por representantes dos países membros que viajaram a Brasília para a 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental, realizada nos dois dias anteriores. A mediação ficou com Flor Minici, secretária técnica do IberCultura Viva.
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IberCultura Viva marca presença do XVI Encontro de Mestres do Mundo
Em 12, dez 2024 | Em Cultura Comunitária, Destaque, Direitos culturais, Notícias | Por IberCultura
O IberCultura Viva marcou presença no XVI Encontro de Mestres do Mundo, realizado no Cariri (Ceará, Brasil) reafirmando seu compromisso com a valorização dos “tesouros vivos” das culturas populares e tradicionais. A mestra Olinda Silvano (Perú) e o mestre Raúl Pérez (México) participaram do evento – realizado de 5 a 7 de dezembro – a convite do Programa, enriquecendo os diálogos com experiências trazidas diretamente de seus territórios de origem.
A presidenta do IberCultura Viva, Márcia Rollemberg, também teve voz ativa no encontro e participou da roda de conversa sobre “Notório Saber: Construindo e implementando a política”. “O painel nos faz pensar um pouco na história. As estruturas do Estado brasileiro vieram da Europa para servir uma visão de poder e o campo da educação é um aparelho do Estado. Quando a gente pensa em ter um mestre dentro das universidades, é fazer uma grande revolução de inverter e de falar: temos esse outro lado, que também tem saberes”, sustentou.
Na avaliação de Márcia, que também é secretária de Cidadania e Diversidade Cultura do Ministério da Cultura brasileiro, promover este reconhecimento significa abrir espaço para novos horizontes. “Aprofundar essa relação e esse reconhecimento é, antes de tudo, um processo de ampliar, de fazer rachaduras, de penetrar águas, de oxigenar essas estruturas historicamente eurocêntricas, racistas. É um momento de mostrar uma busca de maior equidade de participação na sociedade”, reforçou.
Saberes em rede
A internacionalização das culturas tradicionais populares também foi tema de um painel e apontou perspectivas para um maior integração de diferentes territórios. O debate destacou as contribuições da mestra e do mestre convidados pelo IberCultura Viva.
A artista amazônica do Peru, Olinda Silvano, do povo shipibo-konibo, é mestra de kené, que são desenhos tradicionais pintados sobre tecidos, cerâmicas, madeira e corpos. Seu trabalho é reconhecido e premiado internacionalmente e ela compartilhou um pouco de suas experiências e cosmovisões no evento. “Aqui no Encontro de Mestres do Mundo represento o meu país como mulher, artista, liderança indígena. Me sinto honrada de estar aqui para difundir minha identidade cultural. Me sinto muito contente em lutar contra discriminações e por direitos”.
Olinda destacou que a arte que ela desenvolve ao lado de outras artistas é 100% ecológica e vinda da ancestralidade e da profunda integração com a natureza. “Nós trabalhamos cantando espiritualmente. Nós não estudamos na universidade. Nosso trabalho vem da memória ancestral, de nossas avós, de geração em geração e também das plantas medicinais. E assim crescemos. Nossos desenhos não vem de nenhum livro, eles surgem da mente”.
Além fronteiras
O mestre Raúl Pérez, do México, acredita que as trocas estabelecidas durante o Encontro revelam raízes culturais que se conectam sem limites geográficos. “Os intercâmbios trarão frutos maravilhosos, já que todos os países envolvidos temos muitas semelhanças e enfrentamos dificuldades parecidas também na difusão da cultura popular e comunitária.
A participação no XVI Encontro de Mestres do Mundo simboliza o esforço do IberCultura Viva em abrir espaços e celebrar os saberes de guardiãs e guardiões das culturas populares e comunitárias, promovendo também a força das trocas intergeracionais.
Fortalecendo a cultura viva comunitária: um balanço dos 7 anos da pós-graduação internacional da FLACSO
O Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária foi lançado em 2018, como uma construção conjunta de IberCultura Viva e FLACSO Argentina, com o objetivo de fortalecer a formação e a pesquisa das políticas culturais de base comunitária e o conceito de “cultura viva” como política pública. Este curso foi um dos grandes acertos deste programa de cooperação cultural iniciado em 2014 por governos de 10 países ibero-americanos (hoje são 13), como mostra o relatório/balanço “Fortalecendo a Cultura Viva Comunitária”, apresentado durante o seminário comemorativo dos 10 anos do IberCultura Viva, em Brasília, no dia 28 de outubro.
A ideia de contar com um espaço de formação acadêmica vinculado ao programa começou a ser gestada em 2016. Um estudo encomendado pelo IberCultura Viva mostrou que havia uma grande demanda por formação em gestão cultural com enfoque territorial e comunitário, mas não existia nenhuma oferta específica no tema, e somente 40% das ofertas existentes (nas áreas de gestão e políticas culturais) contavam com alguma abordagem dentro de suas propostas curriculares.
O interesse foi grande desde o início. Todos os anos, pelo menos 400 pessoas enviam suas inscrições para o Edital de Bolsas que o IberCultura Viva costuma lançar em dezembro. Na primeira convocatória, para a turma de 2018, 437 pessoas se candidataram às bolsas. Em 2024, havia 525 candidatos. Em suas sete edições, entre 2018 e 2024, o programa concedeu 722 bolsas a representantes de organizações culturais comunitárias e pessoas que trabalham em organismos públicos de Cultura nos países membros. Para a turma de 2024, foram concedidas 104 bolsas a pessoas de 13 países. Estes números se mantêm para a edição de 2025, que terá inscrições abertas a partir deste mês de dezembro.
O curso está dirigido a setores públicos de cultura (gestores/as, funcionários/as ou trabalhadores/as da área de Cultura em órgãos nacionais, estaduais e municipais), a gestores/as comunitários/as e a integrantes de organizações da sociedade civil. Para concorrer a uma das bolsas concedidas pelo programa, é preciso comprovar experiência em gestão cultural comunitária e/ou na elaboração e implementação de políticas públicas. Fora do programa de bolsas, no entanto, podem se matricular todas as pessoas interessadas em cursá-lo de maneira particular.
Como afirmam na apresentação do relatório, a cada edição se tece uma rede cada vez mais sólida de organizações culturais comunitárias da Ibero-América, assim como de gestores/as públicos/as, educativos/as e de comunicação, com um forte vínculo territorial. “Esta rede, que promove a relação e o aprofundamento entre cultura e território, cultura e identidade, está construindo uma nova história de políticas públicas no contexto ibero-americano”, ressaltam os organizadores da publicação.
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Pesquisas e entrevistas
Belén Igarzábal, diretora da Área Comunicação e Cultura da FLACSO-Argentina e coordenadora acadêmica (junto com Franco Rizzi) desta pós-graduação internacional, apresentou no seminário alguns dos principais resultados obtidos nesses sete anos de construção conjunta. “Tem sido um trabalho muito rico, proveitoso, colaborativo”, comentou, ao explicar que este relatório/balanço foi elaborado pela equipe da FLACSO-Argentina neste semestre, a partir de questionários e entrevistas em profundidade com pessoas bolsistas.
A primeira parte do informe é um resumo das sete turmas que se formaram entre 2018 e 2024; a segunda traz os resultados da pesquisa feita com 200 pessoas que receberam bolsas do IberCultura Viva, e a terceira apresenta 12 trabalhos finais, selecionados entre os 469 entregues até 2023 (a sétima turma encerrou recentemente o ano letivo, por isso os números de 2024 não foram computados) para ilustrar alguns casos de diferentes países, localizações, gêneros, âmbitos de trabalho, em regiões diversas do continente.
Entre os números de destaque do relatório, a coordenadora acadêmica chamou a atenção para alguns dados coletados a partir da quarta turma (2021), que mostraram que 25% das pessoas bolsistas são afrodescendentes ou pertencem a povos originários. Do total de 722 bolsistas, 66% são mulheres. Entre as 200 pessoas que responderam às entrevistas, 138 eram mulheres, 61 homens e 1 transmasculino. A idade variou dos 27 aos 67 anos. Outro dado relevante foi a combinação do trabalho público com o trabalho comunitário: 78% das pessoas entrevistadas atuam (ou atuaram) em ambos.
Como balanço dos sete anos percorridos, foi feita uma retrospectiva das sete turmas que se formaram, para conhecer o impacto que teve o programa nas pessoas bolsistas e em seu vínculo com o desenvolvimento de políticas culturais de base comunitária. Também foram compilados os relatórios apresentados ano a ano e feitas pesquisas específicas, recolhendo experiências e aprendizagens em primeira pessoa. O material oferece uma perspectiva dos logros alcançados, as lições aprendidas e os desafios pendentes na consolidação e na construção das políticas culturais de base comunitária da Ibero-América.
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Aqui se encontra a publicação da FLACSO-Argentina: https://cutt.ly/teBNn97n
Cultura viva comunitária: um trabalho em rede de formação, pesquisa e extensão
(Fotos: LR Fernandes)
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Em seus 10 anos de existência, o programa IberCultura Viva desenvolveu dois programas de ação (2015 e 2016-2017) e três planos estratégicos trienais – PET (2018-2020, 2021-2023 e o atual, 2024-2026). Inicialmente, as atividades estavam centradas em dois eixos: a promoção de intercâmbios e o desenvolvimento de redes entre organizações culturais de base comunitária, mediante editais, e ações de comunicação. Em 2017, passaram a ser incentivadas ações de formação em políticas e gestão cultural de base comunitária. Este foi um dos grandes acertos deste programa de cooperação, como mostraram as pessoas participantes da Mesa 3 do Seminário Comemorativo, “Atuação em rede na formação, pesquisa e extensão”, que encerrou a jornada de debates e reflexões em Brasília, na tarde de 28 de novembro.
Um dos principais temas deste painel, o Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária, lançado em 2018, foi uma construção conjunta do IberCultura Viva com a Área de Comunicação e Cultura da FLACSO-Argentina. Todos os anos, o programa oferece bolsas para este curso e recebe pelo menos 400 inscrições de pessoas interessadas. Este ano, que teve número recorde de candidaturas, foram enviadas 525 inscrições para o Edital de Bolsas. Somando as sete turmas que se formaram entre 2018 e 2024, o IberCultura Viva concedeu 722 bolsas para essa pós-graduação virtual da FLACSO-Argentina.
Outra ação formativa importante na história do programa foi a criação, em 2021, do Grupo de Trabalho sobre Sistematização e Divulgação de Práticas e Metodologias de Políticas Culturais de Base Comunitária (GT de Sistematização). Por meio de chamada pública, 59 pessoas de 10 países foram selecionadas para compor este GT. A iniciativa rendeu um ciclo de seminários, uma publicação e a participação de integrantes do grupo em encontros e congressos. Este ano, o GT se dedicou a elaborar a proposta para a criação da Rede Educativa IberCultura Viva, que será lançada em 2025.
Tanto o curso da FLACSO como o GT de Sistematização e a futura Rede Educativa foram comentados nesta terceira mesa do seminário. A conversa contou também com uma panorama das iniciativas de formação que vêm sendo construídas no campo das políticas culturais, uma apresentação sobre o Consórcio Universitário Cultura Viva, criado há um ano no Brasil, e outra sobre as iniciativas que buscam incluir os conhecimentos tradicionais dos mestres e mestras das culturas populares na sala de aula, como uma forma de humanizar e pluralizar a universidade.
Participaram da mesa: Alexandre Santini, presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa; Deborah Rebello Lima, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Paraná; Diego Pigini, da Universidade Nacional de Córdoba, representando o GT de Sistematização do IberCultura Viva; Tião Soares, diretor de Culturas Populares e Tradicionais da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (SCDC/MinC), e Belén Igarzábal, diretora da Área Comunicação e Cultura da FLACSO-Argentina e coordenadora acadêmica do Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária.
Dois alunos desse curso, a equatoriana María Pía Alcivar Vásquez e o uruguaio Ce Tao Vignolo Gayero, também foram convidados a subir ao palco para falar da experiência acadêmica a partir de suas próprias vivências. A mediação ficou a cargo de Emiliano Fuentes Firmani, ex-secretário técnico do IberCultura Viva (2016-2022) e um dos diretores da editora argentina RGC (Redes de Gestión Cultural).
Para Emiliano, o tema desta mesa é fundamental na história do programa, uma vez que as propostas formativas nas universidades, nas instituições de ensino, trabalhavam muito pouco a cultura comunitária como tal. “Nesse processo, tanto a pós-graduação internacional que o IberCultura Viva fez com a FLACSO, como a rede que foi se formando, têm muito a ver com a sistematização, a construção de metodologias, até para pensar como o programa pode ser um interventor para as políticas culturais de base comunitária, como uma espécie de manual de boas práticas, para que os governos, e também a sociedade civil, tenham possibilidades de nortear suas ações”, afirmou.
A seguir, as apresentações de cada uma das pessoas convidadas.
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Um “ecossistema” formado por governos, universidades, organizações e pelos saberes e fazeres comunitários
Alexandre Santini, presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa, começou sua apresentação falando da importância de espaços de encontro e formação como este seminário. Em seus 15 minutos de fala, ele buscou traçar um panorama das iniciativas de formação que vêm sendo construídas no campo das políticas culturais, e especificamente do trabalho em rede, formação, pesquisa e extensão no campo da cultura viva comunitária.
“Quando a gente fala de cultura viva comunitária, a gente fala de ações do Estado, de políticas públicas, de organizações da sociedade civil, do campo normativo (leis, decretos, ordenanças, tratados) e da produção de conhecimento, estudos e reflexão”, destacou, trazendo à mesa o discurso de posse de Gilberto Gil como ministro da Cultura (2003), quando ele diz que fazer política cultural é fazer cultura. “Eu amplio essa compreensão para a gente entender que a formação em gestão cultural é também um fazer cultural, é também produzir cultura.”
Segundo ele, quando se fala de formação, é na perspectiva de que ela tem um horizonte ético e político. E um horizonte epistemológico. O termo “descolonização”, por exemplo, estava no tema do 1º Congresso Latino-americano de Cultura Viva Comunitária (“Cultura, descolonização e bem viver”), realizado em maio de 2013, na Bolívia. Mas o conceito de descolonização que ali está presente não seria o mesmo da ideia de “decolonialidade”, que se tornou mais corrente nos últimos anos. “Ele tem a ver com o constitucionalismo andino. E esse horizonte está relacionado à ideia de bem viver também. Nesse contexto, numa relação também indissociável com a discussão da política pública, do papel do Estado, do Estado descolonizador”, acrescentou.
Falando em conceitos, lembrou que a cultura viva comunitária se define de várias formas. Ao citar o documento de criação da Plataforma Puente Cultura Viva Comunitária, que reuniu uma centena de organizações culturais em Medellín (Colômbia) em 2010, ele chamou a atenção para o caráter político da organização desse movimento. “É um movimento político que interpela os processos de construção do poder, o capitalismo, o neoliberalismo, quer dizer, interpela de maneira crítica toda essa conjuntura e traz postulados para lidar com essa perspectiva”, comentou.
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Santini mencionou, ainda, a definição de colegas pesquisadores que defendem que, nesse processo, o que se gestou foi uma escola latino-americana de políticas culturais. “A América Latina foi importadora de modelos de política cultural (o modelo francês, o modelo espanhol, o modelo anglo-saxão), e a partir do século 21, a partir dessa experiência da cultura viva comunitária, nós estamos trabalhando com a perspectiva de uma escola latino-americana que se nutre dessas experiências, da formulação dessas políticas, e que permitiu estruturar também o processo de pesquisa em nível regional”, afirmou.
Ao falar dos processos de formação, feitos por governos, universidades, instituições, pelas organizações e pelos saberes e fazeres comunitários, ele ressaltou as ideias de “ecossistema” e “trama”, já que não há exatamente uma hierarquia entre essas experiências. Entre os espaços formais, citou o Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária (FLACSO-Argentina); o GT de Sistematização; a Rede Educativa IberCultura Viva, que será formalizada em breve; o Consórcio Universitário Cultura Viva, que vem trabalhando com o Ministério da Cultura no Brasil; o Diplomado em Gestão Cultural Comunitária para os Pontos de Cultura Comunitária do Chile; o Seminário Internacional de Políticas Culturais da Fundação Casa de Rui Barbosa; a Cátedra Unesco de Políticas Culturais e Gestão-FCRB.
Entre os espaços “não acadêmicos” desse ecossistema, entraram na lista os Congressos Latino-americanos de Cultura Viva Comunitária, os círculos da palavra, os Conservatórios Permanentes CVC, as caravanas da cultura viva comunitária, as Teias (encontros nacionais de Pontos de Cultura do Brasil), os congressos locais e nacionais de CVC. “Esses espaços não formais são absolutamente formativos. Quem vai a um Congresso Latino-americano de Cultura Viva Comunitária volta transformado dessa experiência”, afirmou, para em seguida ressaltar a importância de governos e instituições oferecerem recursos, bolsas, prêmios para pesquisas, cursos, especializações, oficinas, etc.
“A cultura viva comunitária só existe porque existem as organizações de base, mas nós só chegamos aonde chegamos, a 20 anos de Cultura Viva no Brasil e a 10 anos de IberCultura Viva, porque existem também os estados nacionais e os governos locais. Sem essa intersetorialidade não seria possível falar dessa experiência consolidada como é”, afirmou Santini. Para ele, os espaços de encontro, diálogo e intercâmbio são fundamentais tanto para a formação como para a realização da própria política. “Aqui se discutem políticas públicas, aqui se formulam conceitos, aqui a gente vai construindo acordos que vão gerando adiante processos deliberativos e formativos.”
A Lei Cultura Viva, por exemplo, foi aprovada em 2014, mas começou a ser gestada nos fóruns da Comissão Nacional dos Pontos de Cultura, nas Teias. “Desde 2007, 2008, já se falava em criar uma lei para transformar o programa em política de Estado. E isso virou lei mesmo, de verdade, e esta lei foi fundamental no período de destruição das políticas culturais. Informou muita coisa para a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura, e hoje é a inspiração para a Política Nacional das Artes. É isso: esses espaços que começam com diálogo, com interlocução, eles acabam se tornando espaço também de decisão e de deliberação, apontando importantes decisões para o futuro”, observou.
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Consórcio Universitário Cultura Viva: uma mobilização poética e política de “agitadores entrincheirados”
Deborah Rebello Lima, docente na Universidade Federal do Paraná (UFPR), participou do seminário como representante do Consórcio Universitário Cultura Viva. Esta ação colaborativa de pesquisa e extensão sobre a Política Nacional de Cultura Viva e seus desdobramentos reúne três universidades do Sul, Sudeste e Nordeste do Brasil – a UFPR, a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA) – e é desenvolvida em parceria com a Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (SCDC/MinC).
Numa definição não formal, é uma rede de “agitadores entrincheirados”, segundo ela. “O consórcio veio de uma mobilização poética e política de nós, pesquisadores que estamos dentro da academia e que entendemos a importância de colocar o espaço da universidade a serviço do fortalecimento da reconstrução da agenda de políticas públicas no Brasil. Podemos dizer que somos apaixonados por esse então programa, até virar política, seus movimentos internacionais, cada um numa temporalidade, numa temática diferente. O nosso vínculo é de engajamento, é uma reflexão da universidade a serviço da sociedade”, explicou.
Sua apresentação foi estruturada em torno de quatro questões que considera essenciais: 1) O lugar do Consórcio da rede; 2) A potência Cultura Viva para o trabalho das universidades; 3) A redefinição de uma ação em rede para formação, pesquisa e extensão, e 4) A dimensão de rede em outras perspectivas.
Na contextualização inicial, ela lembrou que o Brasil viveu a partir de 2003 uma espécie de “primavera das políticas culturais” com o então ministro Gilberto Gil. O discurso de posse de Gil, também citado por Alexandre Santini, é o que chamaria de “tratado”, uma importante mudança de paradigma. Essa mudança se daria a partir de quatro pilares: o conceito de cultura; a redefinição do papel do Estado; a ênfase em que política pública se faz com participação social, e a ênfase na diversidade. “Essas quatro frentes conceituais foram especialmente importantes para a locomotiva do que foi a gestão de Cultura no Brasil a partir de 2003”, reforçou.
Para a professora e pesquisadora, o programa Cultura Viva não é resultado dessa agenda, e sim estruturante dessa agenda. “Por conta dessa primavera, a gente viu o engajamento social, o transbordamento da pasta cultural para outras áreas e o fortalecimento do campo da cultura, não apenas numa perspectiva da linguagem do simbólico estrito, mas do modo de vida, da disputa de valores, da disputa de um modelo de sociedade. Consequentemente, o conservadorismo, ao se levantar, escolhe o campo cultural, no caso brasileiro, como um dos seus alvos principais. E não foi trivial o impacto disso no Brasil. A extinção do Ministério da Cultura, em 2016 e em 2019, provocou efeitos que, para serem recuperados, vão demandar muito tempo”, observou.
O Consórcio Universitário Cultura Viva surge, então, nesse contexto de retomada, de reconstrução da agenda de políticas públicas de cultura no Brasil. Esse trabalho, iniciado há um ano, é um esforço de ação contínua em que se entende o binômio “pesquisa e formação” como a sua força motriz. A ideia é que a universidade dialogue com essa rede como um integrante, um elemento a mais, e que tenha um papel arregimentador em determinados processos sociais, numa interface colaborativa e respeitosa com a rede de Pontos e Pontões de Cultura. “A gente respeita muito o diálogo entre saberes e a forma como vamos nos colocar e oferecer colaboração”, disse.
O binômio pesquisa e formação seria, portanto, um “catalisador de ação” do consórcio. Em termos de pesquisa, as principais frentes do grupo são: 1) Análises orçamentárias, com ênfase na comparação ao longo dos 20 anos e do essencial impacto da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB) na gestão da Política Nacional de Cultura Viva (PNCV); 2) Levantamento da estrutura de institucionalização da política (nacional e internacionalmente); 3) Ponderações sobre o impacto econômico da ação no território brasileiro; 4) Inflexões sobre o fundo IberCultura Viva e suas potencialidades.
Em termos de formação, a estrutura é focada em três categorias principais: 1) Pontões: Metodologia de Mapeamento e Diagnóstico; 2) Gestores: foco na operacionalização da PNCV com a PNAB, e 3) Agentes Cultura Viva: priorização na reaproximação de novos públicos e arregimentação da rede. Um dos produtos que vêm sendo produzidos pelo consórcio é o podcast “Cultura é Viva!”, uma série de 10 episódios que busca contribuir com a formação dos Agentes Cultura Viva, jovens selecionados pelos Pontões de Cultura que formalizaram parceria com o MinC para atuar no mapeamento, diagnóstico, formação, articulação e mobilização da rede no país. A intenção é poder produzir alguns episódios em espanhol também, para poder circular.
Além do binômio pesquisa e formação, Deborah Rebello ressaltou a importância de encontros celebrativos (e formativos) como este seminário, e dois grandes encontros organizados pelo Consórcio Universitário Cultura Viva este ano. O primeiro deles, realizado de 3 a 6 de julho em Salvador, foi o Encontro Nacional Cultura Viva 20 Anos, que deu ênfase à memória, à reflexão e ao olhar para o futuro, para traçar novos caminhos, e teve sua programação construída em conjunto com a Comissão Nacional de Pontos de Cultura. O segundo, que também teve lugar em Salvador, de 20 a 23 de agosto, foi o Encontro Internacional de Pesquisa sobre a Cultura Viva, que se deu no âmbito do 20º Encontro de Estudos de Transdisciplinares de Cultura (Enecult).
A potência da Cultura Viva para o trabalho das universidades foi o tema que encerrou sua apresentação. Além de destacar a preocupação do grupo em reativar/reaquecer o campo de pesquisa sobre a PNCV no Brasil, ela mencionou três exemplos importantes de ações, no ensino, desenvolvidas pelas universidades integrantes do consórcio. A UFBA, por exemplo, está criando uma disciplina extensionista para trazer inclusive ponteiros/as e mestres/as para dentro da universidade. A UFF acabou de executar uma disciplina com um debate territorial de base comunitária da PNCV, e a UFPR está fazendo uma disciplina sobre o debate internacional, incluindo o IberCultura Viva e a rede latino-americana de Cultura Viva Comunitária.
“Tudo que a gente faz é ação extensionista, é para fora, é de maneira dialógica. É interessante a gente pensar que todos esses encontros são territórios de aprendizagem. São ambientes para a construção programática, para a ativação dessa gramática, para a ativação de conceitos, etc. Quando a gente olha para a PNCV, vê uma série de sub-redes temáticas, especialmente importantes. Mas a gente defende que a rede Cultura Viva é todo mundo junto. São as universidades, as organizações, os gestores públicos, os gestores dos Pontos de Cultura e das organizações que ainda não são reconhecidas como Pontos, mas têm o trabalho comunitário do território. É especialmente relevante que a gente entenda e reforce a potencialidade dessa rede”, defendeu.
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GT de Sistematização e Rede Educativa IberCultura Viva: intercâmbio e cooperação entre pesquisadores
Diego Pigini, um dos integrantes do Grupo de Trabalho sobre Sistematização e Divulgação de Práticas e Metodologias de Políticas Culturais de Base Comunitária (GT de Sistematização) do IberCultura Viva, é também representante de uma rede argentina de universidades que pretende contribuir com reflexões e ferramentas para promover a cultura comunitária na região: Encuentro de Universidades por la Cultura Comunitaria (EUCC). Em sua intervenção, ele fez um resumo da trajetória do GT e apresentou a proposta de Rede Educativa IberCultura Viva, uma ideia que vem sendo discutida pelo grupo desde 2022, foi formatada neste ano de 2024 e será lançada formalmente em 2025.
Pigini começou sua apresentação explicando que o GT de Sistematização foi formado a partir de uma convocatória pública que foi lançada pelo IberCultura Viva em junho de 2021 e que resultou em 59 pessoas selecionadas (37 mulheres e 22 homens) de 10 países. Desse total, 48 pessoas estavam vinculadas de alguma maneira a universidades; 4 estavam vinculadas a institutos, e 7 a outras instituições que desenvolvem linhas de pesquisa. No que diz respeito à área de trabalho, 31 se dedicavam à pesquisa; 15 a projetos de extensão, e 12 a atividades de formação.
O GT foi criado com alguns propósitos, como o de contribuir para a construção de um sistema de informação representativo da diversidade dos países que integram o programa e ajudar na difusão de trabalhos de pesquisa e reflexões sobre políticas culturais de base comunitária. Também estavam entre seus objetivos promover o intercâmbio e a cooperação entre pessoas que se dedicam à pesquisa desse tema; estimular a realização de estudos sobre políticas de base comunitária desenvolvidas por governos federais e locais; participar de eventos dedicados a reflexões sobre essas políticas e, especialmente, promover a construção de uma rede de universidades vinculadas a IberCultura Viva.
Entre as ações desenvolvidas pelo grupo nesses três anos de trabalho, Pigini lembrou que, em 2022, o GT promoveu um ciclo de seminários virtuais (com os temas “Culturas comunitárias e diversidades”, “Políticas públicas de base comunitária”, “Gestão cultural comunitária” e “Patrimônio cultural, memórias e museus comunitários”) e participou do 5º Congresso Latino-americano de Cultura Viva Comunitária, no Peru. Em 2023, a partir das produções elaboradas nos seminários, o grupo lançou o livro digital “Desafios, debates e experiências sobre as culturas comunitárias”, e em 2024, participou de uma das mesas do Encontro Internacional de Pesquisa sobre Cultura Viva, realizado em conjunto com o 20º Enecult, em Salvador (Bahia).
Este ano, a principal aposta do GT foi a elaboração de uma proposta da Rede Educativa IberCultura Viva, iniciativa que vem sendo trabalhada com a Unidade Técnica do programa nos últimos meses. O grupo impulsor desta rede é formado por Diego Pigini (Universidade Nacional de Córdoba, Argentina), Elena Román (Universidad Autónoma de la Ciudad de México), Rocío Orozco Sánchez (Licenciatura en Artes da Secretaría de Cultura de Jalisco e ITESO, México), Paola de la Vega Velastegui (Pontifícia Universidad Católica del Ecuador), Daniel Zas (Escuela Popular de Música, Argentina) e Marcelo Vitarelli (Universidad Nacional de San Luis, Argentina).
Conforme a proposta apresentada pelo GT, a iniciativa conta com cinco objetivos:
1) Garantir laços de cooperação das universidades e instituciones educativas ibero-americanos com o programa IberCultura Viva, construindo temários comuns situados a partir de um compromisso social, ético e político em torno das culturas comunitárias, sua gestão e as políticas culturais que as acompanham;
2) Sensibilizar sobre a importância da cultura comunitária como estratégia voltada a contribuir com o bem viver e o desenvolvimento humano no âmbito dos ODS, da Agenda 2030 e do Pacto Futuro;
3) Gerar processos de pesquisa, sistematização e publicação de experiências territoriais e de análise, avaliação e reflexão sobre a políticas culturais de base comunitária existentes, tanto em nível nacional como local;
4) Instalar e reforçar, nos âmbitos institucionais educativos, a possibilidade de construção de conhecimento no campo da cultura comunitária, por meio do incentivo da produção investigativa e extensionista, entre outras possíveis;
5) Fomentar o diálogo interdisciplinar de saberes e intersetorial em torno das culturas comunitárias.
“Tudo isso é uma primeira proposta, que segue sujeita a deliberação. Ontem, na 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental IberCultura Viva, foi aprovada a decisão de avançar na formação da rede, o que habilita o caminho. Temos coisas pensadas, mas com certeza ainda poderão fortalecer e nutrir”, comentou o ex-diretor de Cultura Comunitária da Municipalidade de Córdoba (2015-2019) que há cinco anos integra a equipe da Subsecretaria de Cultura da Universidade Nacional de Córdoba, tendo sido também um dos impulsores da criação da rede argentina Encuentro de las Universidades por la Cultura Comunitaria (EUCC).
Segundo a proposta apresentada pelo GT, poderão participar desta nova rede do IberCultura Viva instituições educativas com constituição jurídica formal, de gestão pública, privada ou comunitária, do Espaço Ibero-americano. Entre elas, universidades públicas (federais ou estaduais, por meio de reitorias, decanatos, secretarias de extensão, faculdades) e escolas populares de cultura, administradas por organizações comunitárias com personalidade jurídica, funcionamento estrutural de escola e, pelo menos, cinco anos de trajetória. Outra possibilidade seria a integração de redes ou consórcios nacionais, como seria o caso da rede argentina EUCC e do Consórcio Universitário Cultura Viva, no Brasil..
A participação será institucional, diferentemente do GT de Sistematização, que se dá a título pessoal (apesar da necessidade de um vínculo com uma instituição educativa). A adesão será voluntária, sem aportes financeiros. O programa IberCultura Viva definirá um orçamento anual para o cumprimento dos objetivos da rede e seus planos anuais de trabalho. A ideia é que a rede possa gerir, com a colaboração do programa, aportes externos e das próprias instituições educativas.
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A inclusão de mestres e mestras de culturas populares e tradicionais na universidade: “pluriversidade”
Tião Soares, diretor de Promoção das Culturas Populares e Tradicionais da SCDC/MinC, começou entoando uma canção de João do Vale (“Na asa do vento”) e avisando que nesta mesa de gente que fala em espanhol e português, ele vinha mesmo era com seu “nordestinês”. Ao falar de circularidade e interculturalidade, ele defendeu a inclusão dos conhecimentos tradicionais dos mestres e mestras das culturas populares na sala de aula, como uma forma de humanizar e pluralizar a universidade, tornando-a “pluriversidade”. “Mas ela só se torna pluriversidade a partir de uma percepção pluriepistêmica. E isso será possível não somente incluindo os conhecimentos tradicionais na sala de aula, mas também incluindo nos currículos escolares disciplinas que dizem respeito às comunidades, às culturas locais. Porque não adianta fazer um espetáculo de mestre/a dentro da universidade, aquilo ali virar um evento e não se deixar enraizar”, observou.
Definindo-se como um “bonequeiro”, um brincante das culturas tradicionais populares que também é acadêmico (“mais brincante do que acadêmico”), um “brincador”, Tião Soares vem tentando introduzir as experiências tradicionais nos debates públicos, especialmente na compreensão e na apreensão do que vem a ser uma política cultural. “Nós não podemos perceber nem conceber uma política cultural sem escutar o mundo”, ensina o diretor de Culturas Populares e Tradicionais do MinC.
“O Estado não faz, efetivamente, cultura. É essa a nossa razão de trabalhar essa concepção da política cultural, com a pluralidade escutatória que temos feito pelo Brasil inteiro, trazendo os diversos campos do conhecimento, desde o meio ambiente, o transporte público, a saúde, a educação, para elaborar uma política cultural. Arte é cultura, mas cultura não é só arte. Precisamos entender que os Pontos de Cultura compreendem todos os ativos da sociedade que estão envolvidos nessa política cultural”, disse.
A própria definição de atuação em rede, segundo ele, seria essa colaboração das diferentes instituições, profissionais e comunidades, para que possam, horizontalmente, fazer as discussões, “auscultar e escutar, antes de criarem oratórias, narrativas totalmente prontas”. Lembrando uma conhecida frase de Gilberto Gil (“o povo sabe o quer, mas também quer o que não sabe”), ele comentou a importância da formação colaborativa, com a troca de saberes e experiências, e de entender os espaços-territórios como espaços formativos.
“Nós precisamos trabalhar a ideia da territorialidade, a ideia de que as nossas linguagens, as nossas expressões, elas transcendem esse espaço físico. Portanto, precisamos trabalhar esta rede de compreensão, que é dialógica, que dialoga com alguém que esteja lá do outro lado do mundo, porque pertence à minha linguagem, à minha forma de me expressar, de agir. A ampliação desses horizontes, o desenvolvimento dessas competências, talvez transdisciplinares, é que nos faz entender a ideia da extensão, mas, sobretudo, da formação e da pesquisa”, acrescentou.
Numa ação conjunta com a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi) do Ministério da Educação, a Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura está fazendo um projeto piloto nas cinco regiões do Brasil, com mestres e mestras das culturas tradicionais populares ensinando aos professores de escolas do ensino fundamental a brincar, a trocar conhecimentos e experiências. Esta rede está sendo facilitada por cinco institutos federais, contou Tião Soares.
“Esse projeto piloto tem por objetivo ampliar e amplificar estes conhecimentos tradicionais dentro da sala de aula, mas também para que tenhamos no currículo escolar as disciplinas das tradições, da nossa ancestralidade”, comentou o diretor, lembrando que as Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 estabelecem a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e indígenas nas escolas de ensino fundamental e médio. “Mas sem os mestres e mestras, que detém efetivamente, a partir do seu brincar, todo um conhecimento orgânico, a partir de seus terreiros. E é na terreirada onde se compreende as formas das oralidades, das escutas e das auscultas”, afirmou.
Em sua apresentação, ele também destacou a importância dos Pontões de Cultura temáticos que são apoiados pelo MinC, como a Rede das Culturas Populares e Tradicionais, por exemplo, que está fazendo um curso de especialização para pessoas graduadas ou não, com mais de 2000 inscrições de todo o Brasil. Mencionou, ainda, a ideia de uma rede de institutos federais, capitaneada pelo Instituto Federal do Ceará, para o aprofundamento do estudo do notório saber. “Os mestres e as mestras precisam ser reconhecidos/as e titulados como notório saber”, reforçou.
Além de citar o exemplo da Universidade Federal de Minas Gerais, com seis mestres titulados como professores e doutores, e que dão aulas nas universidades como professores visitantes, Tião Soares falou da experiência do professor José Jorge de Carvalho com o Encontro de Saberes na Universidade de Brasília. E adiantou que no dia 4 de dezembro, os Ministérios da Cultura e da Educação assinariam um acordo de cooperação técnica para implementar políticas culturais e educativas, incluindo ações culturais nas escolas de tempo integral e nas universidades. Entre elas, a inserção de saberes tradicionais dos mestres e mestras da cultura.
“Nós estamos muito afinados, aqui na Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural, em tratar também de uma Política Nacional para as Culturas Tradicionais Populares que esteja altamente imbricada com todos esses conhecimentos, sobretudo olhando para a proteção, para a valorização dos territórios dos povos e comunidades tradicionais. (…) Que a gente possa criar observatórios e contribuir para essas políticas sociais e humanas, criando redes, incentivando esses museus orgânicos, que são os terreiros das mestras e dos mestres das culturas tradicionais. É ali onde eles desenvolvem as suas brincadeiras, onde transmitem seus conhecimentos”, afirmou.
Segundo ele, é um trabalho em rede, com formação, pesquisa e extensão, que pode trazer uma luz no fim do túnel, “para que a gente possa entender que é a partir dos conhecimentos tradicionais, das nossas ancestralidades que as redes se horizontalizam, se interconectam e produzem afeições, afetividade e agregação de conhecimentos.”
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Um balanço do Curso de Pós-graduação Internacional em Políticas Culturais de Base Comunitária da FLACSO
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Belén Igarzábal, coordenadora acadêmica (junto com Franco Rizzi) do Curso de Pós-Graduação em Políticas Culturales de Base Comunitária, apresentou alguns dos principais resultados obtidos nesses sete anos de construção conjunta com a FLACSO Argentina. “Tem sido um trabalho muito rico, proveitoso, colaborativo, de equipe, que vai se manifestando em distintas questões”, comentou. O trabalho realizado neste período está resumido num relatório/balanço que a equipe da FLACSO-Argentina elaborou este semestre, a partir de pesquisas e entrevistas com pessoas bolsistas. (Aqui se encontra a publicação)
A primeira parte do informe é um resumo das sete turmas que se formaram entre 2018 e 2024; a segunda traz os resultados da pesquisa feita com 200 pessoas que receberam bolsas do IberCultura Viva, e a terceira apresenta 12 trabalhos finais, selecionados entre os 469 entregues até 2023 (a sétima turma, de 2024, acaba de encerrar o ano letivo) para ilustrar alguns casos de diferentes países, localizações, gêneros, âmbitos de trabalho, em regiões diversas do continente.
O curso está dirigido a setores públicos de cultura (gestores/as, funcionários/as ou trabalhadores/as da área de Cultura em órgãos nacionais, estaduais e municipais), a gestores/as comunitários/as e a integrantes de organizações da sociedade civil. As aulas se dividem em cinco módulos (“Processos culturais contemporâneos”; “Políticas culturais”; “Cultura de base comunitária”; “Redes e cultura colaborativa”; “Elaboração, monitoramento e avaliação de políticas públicas”). Além de assistir às aulas, os alunos e alunas participam de fóruns e encontros sincrônicos e devem entregar um trabalho parcial e um trabalho final.
“Não é um conhecimento assimétrico, e sim um aprendizado coletivo. Há casos de alunos e alunas que têm muita experiência. Este curso conta com a riqueza de bolsistas e docentes, que também são gestores públicos e gestores comunitários, e isso gera um diálogo horizontal”, comentou Belén. Além de trazer alguns números, a coordenadora buscou mostrar como dialogam as diferentes experiências e perspectivas que estão em todo o território ibero-americano, que se tecem em temáticas e desafios comuns.
Ela também chamou a atenção para alguns dados coletados a partir da quarta turma (2021), que mostraram que 25% das pessoas bolsistas são afrodescendentes ou pertencem a povos originários. Do total de 722 bolsistas, 66% são mulheres. Entre as 200 pessoas que responderam às entrevistas, 138 eram mulheres, 61 homens e 1 transmasculino. A idade variou dos 27 aos 67 anos.
Um dado interessante é a combinação do trabalho público com o trabalho comunitário: 78% das pessoas entrevistadas atuam (ou atuaram) em ambos. “Nas entrevistas em profundidade, pudemos investigar um pouco mais qualitativamente e vimos que a maioria das pessoas bolsistas trabalharam nos dois âmbitos, público e comunitário, em alguns momentos, de acordo com os governos ou a institucionalidade. Isso é importante porque o conhecimento sempre chega ao comunitário, seja pela via pública ou pela via das organizações culturais comunitárias”, observou.
Segundo ela, todas as pessoas bolsistas “valorizam enormemente” os aportes do IberCultura Viva, especialmente no que diz respeito às políticas e ao desenvolvimento da cultura comunitária. E veem a importância da sistematização, porque ali professores/as e companheiros/as põem ordem e nome no que se faz no cotidiano. “Este nome gera autorreconhecimento e valorização. Um companheiro dizia que checava as anotações antes de se encontrar com o prefeito, porque já não estava ‘só” como gestor cultural, e sim como parte da cultura viva comunitária. Esta é uma matriz de pensamento e conhecimento. Não é um conceito, é um sentir saber. É um formar parte de um modo de ver a cultura e a gestão”, definiu.
O impacto se vê nos projetos nos territórios. Como mostra o balanço realizado pela Área de Comunicação e Cultura da FLACSO-Argentina, algumas dessas pesquisas-aprendizagens se traduzem em ordenanças, leis, projetos e políticas locais/municipais de cultura; em trabalhos com povos originários, com Pontos de Cultura, jovens, colectivos LGBTQIA+, comunidades afrodescendentes, mulheres rurais. O balanço oferece uma perspectiva dos logros alcançados, as lições aprendidas e os desafios pendentes na consolidação e construção das políticas culturais de base comunitária..
Contando a experiência a partir das próprias vivências: o exemplo de dois gestores culturais bolsistas do curso
A equatoriana María Pía Alcivar Vásquez, uma das estudantes bolsistas do curso, foi convidada a participar do seminário para contar de que maneira essa experiência contribuiu para o seu desempenho como gestora cultural. “Nesta oportunidade de fazer a pós-graduação, uma das questões que mais valorizo é a possibilidade de reconhecer e visibilizar as complementaridades que temos como latino-americanos em nossos objetivos e modos de gestão da cultura comunitária. Uma gestão que mobilizamos a partir de vozes que muitas vezes eram relegadas à periferia e que começam a ter protagonismo”, comentou.
Ela também mencionou a possibilidade, a partir das demandas da cidadania, de criar estratégias e soluções a problemáticas sociais que nascem de baixo para cima, e a possibilidade de isso se converter de alguma maneira nos agentes de mudança que chegam aos territórios. “Visibilizar essas experiências foi uma das grandes oportunidades que a pós-graduação me deixou, de modo geral. E que também contribuiu, a partir do componente acadêmico, para a descolonização do conhecimento. Eu me formei em gestão cultural, mas com um mestrado na Europa, e a pós-graduação virou uma plataforma para difundir o conhecimento gerado nos territórios e essas experiências dos comuns latino-americanos”, completou a bolsista, que trabalha em uma fundação da sociedade civil, sem fins lucrativos.
Segundo ela, com esse curso da FLACSO, veio a oportunidade de vincular processos de construção participativa de políticas públicas na municipalidade, e de poder inserir a cultura em diálogos que normalmente não são assumidos como “culturais”, como o planejamento do território. “No ano passado, eu vinha colaborando nos processos de participação cidadã para os planos de desenvolvimento territorial em algumas municipalidades da minha província. Instalar a reflexão desde o âmbito cultural, nesses processos de planejamento territorial, também foi uma oportunidade que este curso trouxe, de ampliar a mirada”.
María Pía apresentou como trabalho final do curso um projeto armado para o trabalho prático, que agora está sendo implementado. “A fundação onde trabalho se dedica a temas de gestão de patrimônio, com investigação participativa e educação patrimonial. E esse projeto fala de um processo em uma comunidade rural, El Cerrito, que aspira organizar um museu comunitário. É sobre o processo da rota cultural do Cerrito”, explicou.
O projeto “Umiña: o retorno à origem” é o resultado de uma reflexão coletiva colocada em prática pelos vizinhos e vizinhas de El Cerrito, uma pequena comunidade rural da costa equatoriana, de história milenar. O projeto consiste na criação de um circuito cultural turístico a partir do envolvimento ativo da comunidade nas diferentes fases do processo e no desenvolvimento de uma série de atividades que permitam aos moradores a identificação e valorização de seus recursos culturais, a geração de narrativas próprias, a ativação e gestão de uma plataforma de comunicação que dê visibilidade a seus recursos e a cotidianidade do processo.
Além de Pía Alcivar, a mesa contou com a participação do uruguaio Ce Tao Vignolo Gayero, também bolsista do curso, que apresentou o projeto “Acervo Nacional de Arte Contemporânea Uruguaia” como trabalho final. Se trata de um projeto cultural comunitário de criação de uma coleção de arte contemporânea on-line, com o objetivo de comunicar e promover a produção artística visual contemporânea uruguaia e ser insumo para o desenvolvimento de uma política cultural de formação de públicos e aquisição de obras de arte contemporâneas uruguaias para os acervos públicos nacionais e departamentais. É um projeto de participação público-privada que ele sonha ver um dia implementado.
“Sou sobrevivente de 30 anos de produção individualista e morta de arte no Uruguai, um país que não tem uma política de construção de acervos de arte contemporânea e conta com uma lei de cultura que não tem recursos para a produção de arte contemporânea. Na pós-graduação, eu compreendi que o problema não sou eu, e sim o sistema”, afirmou Ce, hoje funcionário da área de Gestão Territorial do Ministério de Educação e Cultura.
“Por outro lado, valorizo muito a bolsa, porque todo o meu tempo é investido em atividades que não tem relação com a produção econômica nem com o consumo. Se eu não tivesse tido a oportunidade de fazer essa pós-graduação de forma gratuita, eu não poderia ter feito. Agradeço muito. Não tenho mais palavras”, disse, visivelmente emocionado. “Vocês me devolveram a esperança.”
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Todos juntos somos fortes: uma homenagem aos trabalhadores da Cultura na gestão pública
Ao final do seminário, a secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do MinC e presidenta do IberCultura Viva, Márcia Rollemberg, manifestou sua alegria com estes momentos de confraternização, convivência e troca. Falou sobre a participação dos países, o fortalecimento da cooperação, a importância de escutar depoimentos sobre o trabalho da formação, numa “confirmação da educação como um eixo estratégico dentro desse processo”.
“Estou emocionada, feliz, porque isso tudo foi alimento que a gente leva para a alma. Eu falo muito sobre as instituições, sobre o que elas são. Se a gente passa à noite pelo Ministério da Cultura, está tudo apagado. E o que é aquele prédio apagado? Aquilo só é Ministério da Cultura com as pessoas, os servidores. Por isso eu queria deixar aqui uma homenagem a todos os trabalhadores da área da cultura que trabalham na gestão pública. A nossa demanda é enorme. O campo de direitos culturais é um campo de grande reparação no Brasil, com as questões de matriz africana, indígena, das periferias, neste país tão desigual. Creio que a gente está num trabalho sério, e que todos nós juntos fazemos muita diferença no mundo. Que a gente siga junto, siga irmanado, e supere as nossas divergências. Porque a gente tem muito mais convergência, tem muito mais coisa para fazer junto do que separado.”
A jornada terminou com o grupo Seu Estrelo e o Fuá do Terreiro, Ponto de Cultura criado há 20 anos em Brasília e reconhecido como patrimônio cultural imaterial do Distrito Federal. O grupo liderado por Tico Magalhães é formado por brincantes que criaram o Mito do Calango Voador, uma mitologia que narra de forma singular o surgimento do mundo, do cerrado e de Brasília, e oferece à música popular brasileira um novo ritmo, o samba pisado, povoando o imaginário da cultura nacional com novas figuras fantásticas.
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Integração cultural ibero-americana: representantes de instituições e organizações comunitárias reúnem-se na segunda mesa do seminário
Em 05, dez 2024 | Em Cooperação Ibero-americana, Notícias | Por IberCultura
(Fotos: LR Fernandes)
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“Integração cultural ibero-americana” foi o tema do segundo painel do seminário comemorativo dos 10 anos do IberCultura Viva, realizado na quinta-feira, 28 de novembro, na sede do Banco do Brasil, em Brasília. A mediadora foi Marianela Riquelme Aguilar, chefe do Departamento de Cidadania Cultural do Ministério das Culturas, das Artes e do Patrimônio do Chile e vice-presidenta do IberCultura Viva.
Na abertura da mesa, Marianela comentou que esta celebração da primeira década do programa tem permitido intersecções institucionais interessantes, como a conversa desta tarde, que aproxima a comunidade e a instituição. “Este é um caminho que nos tem acompanhado no âmbito do programa. Foi a comunidade que levou os governos a comprometerem-se com a cultura comunitária e esse compromisso deu origem a este programa”, lembrou.
Interessada em ver como as instituições e comunidades identificam o caminho percorrido nesta integração cultural ibero-americana, a mediadora propôs às pessoas participantes desta mesa que refletissem sobre o quanto avançamos, o quanto contribuímos para essa integração e que tipo de integração queremos “para as próximas décadas”.
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Institucionalidade e institucionalização
A espanhola Sara Díez Ortiz de Uriarte, a primeira a tomar a palavra, falou em nome da Secretaria Geral Ibero-Americana (SEGIB) sobre o tema “Institucionalidade e cooperação”. Comentou que no âmbito das Cúpulas Ibero-americanas de Chefes de Estado e de Governo, às quais estão adscritos este e outros programas de cooperação, participam 22 países. No entanto, os dois países ibéricos desta lista não possuem políticas culturais de base comunitária inspiradas no modelo brasileiro de Cultura Viva.
“A minha premissa é que a institucionalidade é ibero-americana, mas a institucionalização (do modelo de política Cultura Viva) é latino-americana”, definiu a representante da SEGIB, lembrando que Portugal não participa no programa e que a Espanha, diferentemente de outros países membros, não possui uma política de Pontos de Cultura ou algo equivalente. “Espero que isso possa ser revertido. Na verdade, há um lindo intercâmbio entre a Espanha e o Brasil, quando a representante da Espanha diz que não tem esse modelo de política cultural estabelecido e que chega a este programa como uma ouvinte mais ativa para eventualmente, no âmbito do Plano de Direitos Culturais a ser desenvolvido no Ministério da Cultura, poder implementar esse modelo de política pública”, observou.
Para ela, o programa atingiu uma certa maturidade institucional, com política pública para replicar e avançar nesta integração, com um instrumento muito flexível. “Se não fosse flexível não funcionaria, porque as realidades de cada país, e dentro dos territórios que compõem cada país, são muito diversas”, afirmou, destacando que os países avançam a velocidades diferentes na implementação e avaliação de suas políticas de base comunitária.
Em termos de cooperação local – um déficit que, segundo ela, é transversal a todos os 14 programas de cooperação do Espaço Cultural Ibero-americano-, o IberCultura Viva seria o que mais tem suprido esta carência, já que desde 2019 conta com a Rede de Cidades e Governos Locais. “Embora também tenhamos falado da necessidade de articulação local, no sentido de que a rede tem que ser mais porosa, tem que chegar mais ao território”, destacou.
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O exemplo de Niterói
Representando a Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais, Júlia Pacheco, secretária das Culturas de Niterói (Rio de Janeiro), falou da importância do intercâmbio de experiências para o fortalecimento do programa. “Escutando, falando, participando é que a gente constrói. Nossa troca é fundamental e ajuda a garantir os direitos culturais”, afirmou, lembrando que a rede Cultura Viva é uma rede consolidada em Niterói, e que a cidade conseguiu mantê-la ativa nos últimos anos porque tinha leis próprias, funcionando de maneira independente do governo federal.
Ao mencionar o histórico de políticas culturais do município fluminense, a secretária ressaltou que é preciso pensar o território em primeiro lugar, reconhecendo as diferenças locais. Também citou a Carta dos Direitos Culturais, que foi lançada em Niterói em novembro de 2021, depois de oito meses de construção participativa. Para a elaboração desse documento, foram realizados 21 encontros com a sociedade civil, instituições e governo. “A Carta é um documento muito importante para a cidade. Um documento construído com muitos encontros, muita escuta, circulando o território para ouvir o povo. Um documento que o povo de Niterói tem orgulho de dizer que construído ali”, afirmou Júlia Pacheco
A iniciativa foi inspirada na experiência de San Luis Potosí (México), numa das ações de intercâmbio da Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais. Este ano, as cidades de Concepción, no Chile, e Quilmes, na Argentina, também decidiram lançar suas Cartas de Direitos Culturais, tendo como modelo as experiências de San Luis Potosí e Niterói.
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O início do movimento
O argentino Eduardo Balán, que esteve em Brasília representando o Instituto Latino-americano para a Promoção da Cultura Viva Comunitária, começou sua intervenção emocionado, lembrando que vem de uma organização de base, El Culebrón Timbal, que hoje é um centro cultural em um subúrbio de Buenos Aires Aires. Em Moreno, onde está localizado este centro cultural, existe um ônibus antigo, um coletivo que tem palco itinerante, uma rádio comunitária e, há dois anos, uma escola primária que tem como foco a cultura viva comunitária.
“Mas nem sempre foi assim. Há 25 anos, havia apenas uma trupe, um grupo de artistas de rua e uma banda de rock. Eu também estava lá e com aquele grupo decidimos fazer uma turnê pela América Latina, que tinha como objetivo chegar a Chiapas, no México. Estamos falando do ano de 1999”, disse Balán, citando sua passagem pelo Uruguai, Brasil, Chile, Bolívia, Peru e Equador, até que o ônibus se extraviou. “Nunca chegamos a Chiapas, mas voltamos muito diferentes dessa viagem. Já estávamos contaminados pela perspectiva da cultura viva comunitária e a partir daí começou outro caminho”.
Primeiro eles se envolveram na rede Arte e Transformação Social; mais tarde, essa rede deu origem à Articulação Latino-Americana Cultural e Política (ALACP). “Ali começamos a cunhar a ideia de cultura comunitária, porque até aquele momento não sabíamos explicar o que fazíamos. E nesse caminho terminamos, em 2009, no Fórum Social Mundial em Belém (Brasil), onde montamos uma tenda gigante com outras organizações para discutir cultura e política. Lá encontramos a maré de experiências do Brasil, que reivindicava o tal programa Cultura Viva e falava em Pontos de Cultura”, lembrou.
Nessa ideia de “imaginar um movimento que unisse o continente brasileiro com o continente de língua espanhola da América Latina”, surgiu o termo “cultura viva comunitária” e marcos como a criação da Plataforma Puente CVC; a Caravana pela Vida: De Copacabana a Copacabana; o 1º Congresso Latino-Americano de Cultura Viva Comunitária, na Bolívia (2013), onde nasceu o Movimento Latino-Americano de Cultura Viva Comunitária, e o lançamento do programa IberCultura Viva durante o 6º Congresso Ibero-Americano de Cultura, na Costa Rica (2014).
Depois de invocar a figura de Iván Nogales (1963-2019), sociólogo boliviano fundador do Teatro Trono que foi fundamental nesta construção (“Não estaríamos aqui se não fosse a sua militância, o seu trabalho e tudo o que nos ensinou”), Balán destacou que o Movimento Latino-Americano de Cultura Viva Comunitária foi “uma aposta política” para colocar em diálogo todas as experiências que existem nos territórios. “O movimento obedeceu à vontade de um punhado de organizações que vinham do trabalho artístico na comunidade, porque sabíamos que o que fazíamos com as comunidades só poderia ser explicado dentro de um novo conceito, que era a cultura viva comunitária”, disse.
O Instituto Latino-Americano para a Promoção da Cultura Viva Comunitária (ILACVC), que foi construído coletivamente este ano, é uma proposta de ferramenta organizacional com o propósito de fortalecer os processos, organizações e redes de Cultura Viva Comunitária no continente através de ações de formação, pesquisa e sistematização, e apoio técnico, político e econômico. Uma de suas prioridades, como explicou Eduardo Balán nesta mesa, é construir um fundo latino-americano para apoiar congressos nacionais, bem como um Repositório Latino-Americano de CVC que reúna leis, portarias, projetos e publicações ligadas à promoção da cultura viva comunitária.
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Que tipo de integração queremos?
Marcos Rocha, que faz parte de uma organização cearense, a Fábrica de Imagens, e do movimento cearense Cultura Viva Comunitária, participou da mesa como representante do Pontão de Cultura Pátria Grande de Integração Latino-Americana e Territórios de Fronteira, da Comissão Nacional de Pontos de Cultura e da Equipe de Acompanhamento Continental do Movimento Latino-americano de Cultura Viva Comunitária. Esta instância foi criada em 2019, no 4º Congresso Latino-americano de CVC, e ratificada na edição seguinte no Peru, em 2022, como um espaço que é apoiado por porta-vozes dos processos de cada país, e que é composto apenas por representantes de organizações comunitárias ou vocerías da sociedade civil.
Além de citar algumas ações recentemente realizadas pela EAC e pelo Pontão de Cultura Pátria Grande, como os Conversatórios Permanentes CVC, que vem sendo transmitidos no YouTube, Marcos Rocha explicou que o objetivo não é apenas integrar por integrar, mas debater, refletir sobre que tipo de integração se quer, por que e para quê. “Essa pergunta pode ser feita para o elemento básico de tudo: Por que um Ponto de Cultura? Qual é o sentido dele na sociedade? O sentido da transformação? “Não são questões banais, não são apenas termos”, provocou.
“Um governo com traços conservadores pode inclusive apoiar um projeto transformador que não abale nenhuma estrutura. Políticas de reconhecimento e participação, sem redistribuição das riquezas produzidas coletivamente por um país, são políticas públicas para controlar o caos, para deixar as coisas quietinhas, como uma espécie de analgésico, um remedinho para que a coisa não estrague muito de uma vez. São perguntas importantes”, afirmou.
Ao detalhar a aposta do Pontão Pátria Grande por trabalhar a questão dos territórios fronteiriços, ele convidou as pessoas presentes para um diálogo nesse sentido. “A fronteira tem um papel fundamental, é o espaço do hibridismo. Não é necessariamente meu ou seu, é algo híbrido que faz daquele campo uma intersecção”, acrescentou, esclarecendo que se referia às fronteiras não apenas geográficas, mas de sentido. “O povo palestino hoje está em nossa fronteira. Como dialogamos com esses povos também? Temos feito trabalhos interessantes, com sedes virtuais em vários estados, como Roraima e Santa Catarina, onde discutimos sobre arte e política, mais para a revolução que para a transformação”.
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Rumo ao México: reconhecendo os esforços
E que elementos podemos considerar para tornar possível a integração ibero-americana? Rut Mendoza García, representante do Grupo Impulsor México, que organiza o 6º Congresso Latino-Americano de Cultura Viva Comunitária, acredita que um primeiro elemento seria a forma como nomeamos este chamado à integração. “Podemos ampliar, modificar ou considerar as palavras América Latina, América Hispânica ou Abya Yala, entre outras, porque são formas de nomear o território e cada uma delas tem sua carga política e sua narrativa própria”, sugeriu.
“O segundo ponto é que com a atuação da sociedade civil, redes, organizações de base e comunidades, vamos contribuir para esta integração com a celebração do 6º Congresso Latino-americano de Cultura Viva Comunitária, que será realizado em Cherán. (Michoacán, México), uma comunidade indígena, um povo purépecha. Para que? Bom, para que mundos possíveis apareçam, essa é a nossa motivação”, destacou.
Um terceiro seria o apelo à memória, reconhecendo os esforços realizados pelas organizações de base nestes mais de 10 anos de Movimento de Cultura Viva Comunitária. E um quarto ponto seria destacar que Abya Yala é um continente diversificado. “Ocupamos vocerías, somos portadores da palavra coletiva que reflete essa diversidade dos países que compõem o que hoje chamamos de Ibero-América. Para nós, é preciso rodar a voz, os rostos, as ideias, quando as decisões são tomadas”, disse.
“Para a integração é preciso acompanhar, é preciso estar próximo dos espaços de trabalho e das organizações de base. (…) Para que a cooperação seja possível e futura, sabemos que são necessários diálogos entre organizações e instituições. E a integração também precisa de alegria, cooperação, camaradagem. Precisa convocar esses espaços de formação para organizações de base. Precisamos ter mais empatia uns com os outros, trabalhar juntos”, ressaltou.
Rut Mendoza finalizou sua intervenção com um convite às organizações para celebrarem a oitava edição do Congresso Latino-americano de CVC, em 2028, em um país da América Central e/ou do Caribe. As edições anteriores foram realizadas na Bolívia (2013), em El Salvador (2015), Equador (2017), Argentina (2019) e Peru (2022). O sexto será no México; o sétimo na Colômbia e, segundo ela, seria hora de olhar novamente para a América Central e o Caribe.
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No encerramento da mesa, após o vídeo “La Cumbia de la Tierra”, apresentado por Rut Mendoza, o argentino Eduardo Balán projetou uma produção colaborativa de vários grupos da América Latina, que além de uma homenagem ao México mostrou a proposta de a Caravana Quetzalcóatl, que acontecerá no México em abril, próximo ao 6º Congresso Latino-Americano da CVC.
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Reunião de gestores de Cultura Viva encerra o seminário comemorativo dos 10 anos do IberCultura Viva em Brasília
Em 29, nov 2024 | Em Governos Locais, Notícias | Por IberCultura
(Fotos: Ascom MinC)
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Cerca de 50 gestoras e gestores de Cultura Viva de diferentes partes do Brasil participaram na manhã desta sexta-feira (29/11), no Ministério da Cultura, em Brasília, da reunião que encerrou o seminário comemorativo dos 10 anos do programa IberCultura Viva e que foi liderada por João Pontes, diretor da Política Nacional Cultura Viva.
Segundo ele, a iniciativa é um esforço conjunto para valorizar as trajetórias culturais locais e construir um modelo participativo, considerando as especificidades de cada território. “A troca de ideias e ações é fundamental para garantir o fortalecimento das políticas culturais”, explicou o diretor do MinC e representante do Brasil no programa IberCultura Viva.
O encontro, em formato híbrido, contou com 38 participantes por videoconferência e 20 de modo presencial. Entre as pessoas presentes estavam dois representantes de países membros do IberCultura Viva (Walter Romero, de El Salvador, e Henry Mercedes Vales, da República Dominicana) e a Unidade Técnica do programa. Flor Minici, secretária técnica do IberCultura Viva, e Diego Benhabib, consultor de redes e formação, apresentaram durante a reunião a Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais.
Outras três pessoas que haviam participado, no dia anterior (28/11), de uma das mesas do seminário, dedicada ao tema “Integração cultural ibero-americana”, também estavam nesta reunião com gestores brasileiros: o argentino Eduardo Balán, representando o Instituto Latino-americano de Cultura Viva Comunitária; a mexicana Rut Mendoza García, representante do Grupo Impulsor do 6º Congresso Latino-americano de Culturas Vivas Comunitárias (que se realizará em abril de 2025 na comunidade indígena de Cherán, Michoacán), e Marcos Rocha, representante da Comissão Nacional de Pontos de Cultura, da Equipe de Acompanhamento Continental de Cultura Viva Comunitária e do Pontão de Cultura Pátria Grande para a Integração Latino-americana e Territórios Fronteiriços.
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A jornada começou com uma apresentação do plano de implementação da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB) na Política Nacional Cultura Viva (PNCV). A desburocratização de instrumentos normativos e a facilitação do acesso às orientações da PNCV foram alguns dos temas abordados, assim como a possibilidade de oferecimento de bolsas aos mestres e mestras da cultura popular. Segundo João Pontes, este compartilhamento de saberes – junto às escolas e aos espaços informais – permitirá “que as tradições, as memórias, especialmente as de tradição oral, sejam valorizadas, reconhecidas, como grandes detentores e detentoras de saberes”.
A apresentação da Rede de Cidades e Governos Locais começou com uma introdução por parte da secretária técnica do IberCultura Viva, Flor Minici, que contou um pouco da experiência desta instância, que nasceu como grupo de trabalho em 2017 (em Quito, Equador), se formalizou como rede em 2019 (em Buenos Aires, Argentina) e desde então recebeu a adesão de 37 municípios, estados e províncias de sete países ibero-americanos. Do Brasil fazem parte as cidades de Niterói (Rio de Janeiro) e São Leopoldo (Rio Grande do Sul).
Essa iniciativa de articulação com governos locais surgiu como uma linha de ação do IberCultura Viva, entendendo que estas são as instâncias do poder público que mais se aproximam das organizações culturais comunitárias e dos povos originários, os principais sujeitos com que o programa trabalha. Com esta rede, busca-se criar espaços de reflexão, para gerar consensos e relatos comuns sobre o que são as políticas culturais de base comunitária e como se pode melhorar a implementação e o impacto destas políticas nos territórios.
“Para nós, esta é uma experiência a destacar, e muito, não somente pela possibilidade de articulação e de intercâmbio de experiências entre os governos, e de apoio do programa para a realização das atividades propostas pelos governos locais, mas também porque a Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais funciona como um laboratório de políticas públicas que permite alojar debates e experiências, e realizar processos de participação democrática”, afirmou Minici.
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Durante a reunião, o argentino Diego Benhabib explicou que para formar parte desta rede é necessário enviar ao programa uma carta de intenção de adesão, assinada pela máxima autoridade do governo local. Também é preciso assumir o compromisso de realizar, em articulação com o programa, pelo menos duas atividades vinculadas à cultura comunitária em seus territórios.
“Um dos principais benefícios (de participar da rede) é o intercâmbio de experiências sobre as políticas culturais de base comunitária que se implementam em suas localidades e que aportam matizes, metodologias, diferentes formas de fomento em seus territórios, e a criação de espaços de participação social para a construção ou a reafirmação dos direitos culturais”, destacou Benhabib.
Como exemplo, Minici e Benhabib citaram o processo de construção coletiva da Carta de Direitos Culturais da Cidade de San Luis Potosí (México). Por conta dessa experiência, realizada entre outubro de 2018 e maio de 2021, a cidade de Niterói também promoveu uma série de rodas de conversa com a população local para debater e formatar propostas para sua Carta de Direitos Culturais. O documento final da cidade fluminense foi apresentado em 5 de novembro de 2021, no Encontro “Cultura é um Direito”, promovido pela Secretaria Municipal das Culturas de Niterói.
Essa foi uma das ações de cooperação que surgiram no âmbito da Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais, e que depois também inspiraram as cidades de Concepción (Chile), que lançou sua Carta de Direitos Culturais em 26 de agosto, depois de um ano e meio de construção participativa, e de Quilmes (Argentina), que deu início a esse processo há duas semanas.
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Fortalecendo a rede
Walter Romero, diretor nacional de Espaços Culturais do Ministério de Cultura de El Salvador, mencionou a 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental, que se realizou em Brasília nos dias 26 e 27 de novembro, e destacou que parte do trabalho havia sido dedicada a pensar no fortalecimento da Rede de Cidades e Governos Locais.
“Algumas iniciativas vêm caminhando e a ideia é que essa rede possa seguir se fortalecendo. O programa tem claro que não estamos inventando a cultura, e sim estamos aprendendo com a base, com essa cultura que leva anos, que é milenar, e que também somos agentes que formamos parte desse tecido. Nos sentimos muito esperançosos com os desafios que vêm do plano que aprovamos para o próximo ano e também esperamos que muito mais gente se contagie com essa esperança, essa alegria, esse diálogo que podemos ir construindo todos: organizações culturais de base, governos locais, governos estaduais, governos federais”, afirmou Romero.
Henry Mercedes Vales, diretor geral de Mecenato do Ministério de Cultura da República Dominicana, disse que o que mais o entusiasma, na experiência do Brasil com Cultura Viva, é ver como articular, desde as instituições públicas, redes que sejam vivas e que sejam redes a partir de políticas públicas.
“É ver como estabelecer políticas públicas que possam garantir a sustentabilidade dessas estratégias, e que estejam acima da ação do governo da vez. Como fazer que essas estratégias sejam das organizações de base comunitária, para que se estruturem e se fortaleçam. E que nós, como servidores públicos, possamos acompanhar isso, fortalecer para que aconteça, mas desde a estrutura comunitária. Isso levamos como lição e devemos de alguma forma promover em nosso país”, comentou.
Terminada a apresentação, dois gestores presentes manifestaram interesse em aderir à Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais: o secretário de Cultura de Alto Paraíso de Goiás, Raphael Veiga, e o diretor do Departamento de Cultura do Município de Matão/SP, Juliano Ricci Jacopini.
> Saiba mais sobre a Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais: https://iberculturaviva.org/rede-de-cidades/
Começa o seminário que comemora os 10 anos do programa: mirando no horizonte para mais uma década
Em 28, nov 2024 | Em Destaque, Notícias, Seminários | Por IberCultura
(Fotos: Filipe Araújo/MinC e LR Fernandes)
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Depois dos dois dias de debates e acordos na 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental, teve início na noite desta quarta-feira (27/11), em Brasília, o seminário comemorativo dos 10 anos do programa IberCultura Viva. O encontro, pensado como um espaço para refletir sobre os resultados alcançados nesta primeira década de cooperação e os desafios que se encontram nesta travessia, contou com a presença da ministra da Cultura do Brasil, Margareth Menezes, na cerimônia de abertura, na sede do Banco do Brasil.
Margareth Menezes fez uma saudação carinhosa, especial pelos 10 anos do IberCultura Viva, “programa que nos conta uma história, uma história que a gente acredita, porque nós que trabalhamos com arte e cultura sabemos que nesse âmbito não existe fronteira”. Falou da “costura” que faz a política de Cultura Viva, “esse enlace para chegar a quem está lá na ponta, dignificando e contando com o reconhecimento da comunidade”, numa união de forças, numa rede que se alastra a todo momento.
Ao lembrar que os 10 anos do IberCultura Viva coincidem com os 20 anos de Cultura Viva no Brasil, a ministra afirmou que, para além da celebração, a ideia é fortalecer o compromisso com as culturas vivas comunitárias, que refletem a riqueza e a diversidade ibero-americana. Ao celebrar a incorporação da República Dominicana, anunciada no dia anterior, ela disse que a cooperação Internacional vem mostrando que pode ser uma ferramenta poderosa de transformação social e cultural na busca por um mundo mais justo e um planeta sustentável.
“Idealizado há uma década como espaço de integração e valorização das expressões culturais locais, o IberCultura Viva tem se tornado uma força transformadora para as políticas culturais de base comunitária dos países que integram este programa de cooperação. Desde sua criação, tem garantido o protagonismo das mais diversas organizações culturais comunitárias, dos povos e comunidades indígenas, afrodescendentes, camponeses, grupos urbanos, periféricos e de cultura digital, promovendo a criação de redes culturais que ultrapassam nossas fronteiras geográficas, reforçando a cultura como promotora de desenvolvimento, emancipação e justiça social”, destacou.
Segundo ela, o programa materializa a conexão entre cultura, educação, desenvolvimento, inclusão social e cidadania com uma prática de política abrangente, descentralizada, em rede e em diálogo e escuta com as comunidades, com os territórios. “O IberCultura Viva nos ensina que a cultura é o coração pulsante das nossas sociedades. É a alma, a identidade do nosso povo, e pode ser a força de transformação na paz. Que este seminário seja um espaço de inspiração, mobilização e diálogo. E que possamos continuar tecendo essas redes que conectam nossas comunidades, nossos territórios, nossos sonhos e corações”, complementou.
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Reatando laços
Márcia Rollemberg, secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (MinC) e presidenta do IberCultura Viva, lembrou que voltou ao cargo neste 2024, depois de 10 anos (ela estava no MinC entre 2011 e 2014 e foi a primeira presidente do programa), e que considera “uma honra” fazer parte dessa história. “São momentos de reatar laços. Se o ministro Gilberto Gil tocou o corpo com a sua poética, eu digo que com a sua estética, que a gente redesenhou, a ministra veio dar a sua métrica, que é trazer a cultura viva para o tamanho do Brasil, e o seu reforço ético, de ter uma cultura efetiva, que fale com os seus propósitos maiores, que seja inclusiva”, afirmou.
Como diz o Manifesto IberCultura Viva +10 Anos, o momento é de tecer memórias, celebrar a diversidade, ampliar as redes e construir o futuro. É de resgatar a história para pensar o futuro, “assim como uma flecha que quanto mais a puxarmos para trás, mais a projetamos para frente”. “Vamos seguir lado a lado, trabalhando irmanados. Mirando no horizonte, lançamos uma flecha adiante para conquistar mais uma década de travessia. Com cooperação, com política cultural de base comunitária e com participação social, vamos seguir tecendo esse futuro linha a linha, ponto a ponto, numa grande teia para enfrentar os desafios da emergência climática, para habitarmos um mundo cada vez mais sustentável, igualitário, sem preconceitos e guiados por valores democráticos e de justiça social”, finalizou a presidenta.
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Construindo juntos
Sara Díez Ortiz de Uriarte, que participou do seminário como representante da Secretaria Geral Ibero-americana (SEGIB), explicou que o IberCultura Viva é um dos 14 programas de cooperação cultural adscritos ao Espaço Cultural Ibero-americano e que, portanto, é um instrumento de cooperação bi-regional e horizontal adscrito às Cúpulas Ibero-Americanas. Ao agradecer o convite para comemorar a história “dessa política de aprofundamento democrático”, ela destacou que um dos maiores logros do programa é a gradual construção e implementação dessa política nos países da América Latina.
“Queremos continuar construindo futuros, ampliando redes, pensando em memórias e celebrando a diversidade. São valores muito importantes neste momento, num contexto mundial de questionamento do multilateralismo, dos fundamentos da democracia”, observou. “Comemoramos 10 anos de uma política que fomenta autonomia em termos de desenvolvimento cultural. Dos 14 programas culturais que temos, acho que o IberCultura Viva é o mais solidário e o mais imaginativo. É o mais solidário porque adota a agenda da justiça social e climática. E o mais imaginativo por sua articulação com sociedade civil, academia, governos locais. Sigamos juntos construindo este instrumento de cooperação que teve tantos desafios, alegrias e logros nesta primeira década”.
O embaixador Laudemar Gonçalves de Aguiar Neto, secretário de Promoção Comercial, Ciência, Tecnologia, Inovação e Cultura do Ministério de Relações Exteriores, destacou a celebração dos 10 anos do programa como “um ato importante que comprova o fortalecimento de um ideal que une os países ibero-americanos em torno de uma causa comum, a promoção da cultura como ferramenta de transformação, inclusão e integração”. “Nesses 10 anos, o IberCultura Viva consolidou-se como essa ponte que conecta histórias, línguas, identidades, reafirmando a centralidade da cultura de base comunitária como mediadora intercultural e construtora de consensos”.
Segundo o embaixador, o IberCultura Viva celebra e difunde as expressões culturais de nossas comunidades, reconhecendo nelas a base para uma sociedade mais justa, solidária e democrática. “Ao celebrarmos esta primeira década, vamos olhar para o futuro com a flecha que foi dita e que os próximos anos sejam de ainda mais colaboração, criatividade e inclusão. (…) Que o programa siga sendo um exemplo de como a cultura pode e deve atuar como mediadora em tempos de crise, em tempos de oposições e como força motriz em momentos de esperança”, completou.
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Na abertura da cerimônia, o vice-presidente de Negócios de Governo e Sustentabilidade Empresarial do Banco do Brasil, José Ricardo Sasseron, ressaltou a relevância do seminário e a importância da integração entre os povos, entre a cultura dos povos latinos, americanos e ibéricos, e os brasileiros. “Vocês que trabalham com cultura têm um papel muito importante que é conservar a memória do povo de cada país e trocar experiências”, disse o anfitrião.
Júlia Pacheco, secretária das Culturas de Niterói (Rio de Janeiro), compareceu como representante da Rede IberCultura Viva de Cidades e Governos Locais e também destacou a importância do intercâmbio de experiências entre municípios. “É no território das cidades que a cultura acontece”, ressaltou. “Cada gestor, cada Ponto de Cultura, cada um que está aqui quer transformar o mundo para fazer com que a gente viva num lugar melhor. A cultura tem esse potencial, é esse espaço.”
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Com os esforços das organizações
A mexicana Rut Mendoza García, por sua vez, falou em nome do Grupo Impulsor do 6º Congresso Latino-americano de Culturas Vivas Comunitárias (que se realizará em Cherán, Michoacán, em abril de 2025) e da Equipe de Acompanhamento Continental do Movimento de Cultura Viva Comunitária. Em sua intervenção na abertura, ela mencionou alguns dos esforços que foram feitos pela sociedade civil e que acabaram contribuindo para a criação do programa, em outubro de 2013, na 23ª Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo, no Panamá (o lançamento formal se deu em abril de 2014, no 6º Congresso Ibero-americano de Cultura, na Costa Rica).
“Em 2010 começaram a buscar fundos para que as organizações de base pudessemos nos reunir, falar, saber que acontece nos nossos territórios e para onde vamos. Em 2011, as redes foram convocadas através da Plataforma Puente, para promover e difundir a cultura viva comunitária. Em 2013, celebramos nosso primeiro Congresso Latino-americano de CVC na Bolívia, com cerca de 1.200 pessoas participantes. E agora, passados 10 anos, estamos aqui, onde também há um esforço das coletividades, das organizações, para saber o que se passou nesses 10 anos e para onde vamos. Felicitamos esta celebração, e que estes 10, 20, 30 anos mais sejam acompanhados, sim, dos governos, mas que também sejam consideradas as organizações de base, porque estamos fazendo esforços muito grandes em nossos territórios”, observou a mexicana.
O argentino Eduardo Balán, líder do grupo El Culebrón Timbal que veio representando o Instituto Latino-americano de Promoção da Cultura Viva Comunitária, disse ser um motivo de muita alegria poder estar em Brasília para celebrar os 10 anos do IberCultura Viva e falar da integração ibero-americana, de seu valor para a construção da democracia e do desenvolvimento dos povos. Ao questionar como essa integração se posiciona diante dos desafios que a região terá nos próximos 10 ou 20 anos, Balán busca trazer a perspectiva das organizações culturais comunitárias da “Abya Yala” (América), que, segundo ele, está numa encruzilhada.
“Há dois futuros possíveis para nosso continente: ser uma zona liberada para o extrativismo, a violência, a desigualdade e a pobreza; ou ser uma região com a rede de economias colaborativas e comunitárias mais poderosas do planeta. É uma possibilidade, uma potencialidade. Nosso destino como continente está ligado à luta pela vida e isso implica uma relação distinta com a mãe natureza, com a produção de alimentos, com outros tipos de tratamentos de saúde e de educação”, explicou. “Outro desafio que temos é o de ser protagonistas de um modelo de desenvolvimento baseado na democracia participativa. Em uma economia social, na cultura viva comunitária, num modo de abordar a vida que seja mais colaborativo que competitivo.”
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⇒ Confira o vídeo da transmissão no canal do IberCultura Viva no YouTube
14ª Reunião do Conselho Intergovernamental termina com acordos e o anúncio da adesão da República Dominicana
Em 28, nov 2024 | Em Conselho Intergovernamental, Destaque, Notícias | Por IberCultura
A 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental da IberCultura Viva terminou nesta quarta-feira, 27 de novembro, em Brasília, com importantes avanços para fortalecer a cultura comunitária na Ibero-América. Entre os acordos firmados, foram aprovadas estratégias e recursos para ampliar o impacto do programa em 2025, como a ampliação de alianças, a promoção de pesquisas acadêmicas ligadas ao conhecimento popular, o fortalecimento de temas como a cultura infância e a implementação de iniciativas culturais ações alinhadas com os desafios da emergência climática.
Também foi definida a realização do 5º Encontro de Redes IberCultura Viva no âmbito da TEIA, o encontro nacional de Pontos e Pontões de Cultura, que se realizará em Vitória (Espírito Santo) entre setembro e outubro de 2025. A ideia é que participem deste encontro representantes de redes culturais comunitárias selecionadas nos Editais IberCultura Viva de Apoio a Redes e Projetos de Trabalho Colaborativo.
Um dos destaques desta 14ª Reunião do CI foi o anúncio da adesão formal da República Dominicana ao Conselho Intergovernamental, após um ano de participação como país convidado, somando um total de 13 países membros. Henry Mercedes Vales, diretor geral de Mecenato do Ministério da Cultura da República Dominicana, anunciou a decisão do país de se incorporar ao programa, na abertura deste encontro presencial, na terça-feira (26/11).
O primeiro dia foi dedicado à apresentação de relatórios: o informe financeiro, por Marcos Acle, gerente de Cooperação do Escritório Sub-regional da Secretaria Geral Ibero-Americana (SEGIB) para o Cone Sul; e o de gestão, por Flor Minici, secretária técnica do IberCultura Viva. As pessoas participantes também traçaram um panorama das políticas culturais de base comunitária que se desenvolvem nos seus territórios. Ao longo da tarde foram apresentados os avanços e desafios de iniciativas como os programas Pontos de Cultura (no caso do Chile, Pontos de Cultura Comunitária), os Semilleros Creativos (no México), as Becas Taller (na Costa Rica) e as Usinas Culturales (do Uruguai).
O segundo dia começou com o convite de Giselle Dupin, coordenadora de Promoção da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura do Brasil (MinC) e representante técnica da presidência do programa, para que as/os representantes dos países membros inscrevam propostas e eventos para comemorar os 20 anos da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais da UNESCO. Entre outros objetivos, esta convenção procura promover o diálogo entre culturas, a fim de garantir intercâmbios culturais mais amplos e equilibrados em favor do respeito intercultural e de uma cultura de paz, bem como promover a interculturalidade, com o espírito de construir pontes entre os povos.
Em seguida, Sara Díez Ortiz de Uriarte, técnica do Espaço Cultural Ibero-Americano, comentou alguns marcos da Cooperação Ibero-Americana. Destacou, por exemplo, a 29ª Cúpula Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo, realizada em Cuenca (Equador) nos dias 12 e 15 de novembro, com o lema “Inovação, Inclusão e Sustentabilidade”. Esta edição resultou num robusto programa de ação e a Espanha assumiu a secretaria pro tempore da Conferência Ibero-Americana.
A representante da Secretaria Geral Ibero-americana (SEGIB) também falou sobre a Mondiacult 2025, a Conferência Mundial da UNESCO sobre Políticas Culturais e Desenvolvimento Sustentável, que se realizará em Barcelona no final de setembro; o 9º Congresso Ibero-Americano de Cultura, que acontecerá no Chile em abril de 2025, tendo como tema a inteligência artificial, e a 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento, que será em Sevilha (Espanha) nos dias 30 de junho e 1º de julho.
Norma Cruz, representante técnica da Secretaria de Cultura do Governo do México no programa, apresentou a proposta do Grupo Impulsor para o 6º Congresso Latino-Americano de Culturas Vivas Comunitárias, que será realizado de 11 a 16 de abril de 2025 em Cherán, Michoacán. Segundo ela, Cherán foi o local escolhido para esta edição porque, histórica e politicamente, esta comunidade camponesa é um exemplo de autogoverno e de luta para defender territórios. “Pela sua autonomia e, sobretudo, por ser um exemplo de organização”, ressaltou.
João Pontes, diretor da Política Nacional de Cultura Viva e representante do Brasil no IberCultura Viva, apresentou um relatório sobre a TEIA 2025, as edições anteriores e os temas propostos. Ele comentou que nesta edição a intenção é abordar temas como justiça climática e bem viver, integração de Pontos de Cultura, economia solidária e cultura alimentar, entre outros. A ideia é que este evento seja preparatório para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30).
Diego Benhabib, consultor de redes e formação da Unidade Técnica, comentou a participação da presidenta do IberCultura Viva, a secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura do Brasil, Márcia Rollemberg, no 1º Encontro Internacional de Cultura Infância, realizado em outubro em Córdoba (Argentina). Nesta ocasião, ela assinou uma carta de compromisso para formar um grupo de trabalho para promover o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para as crianças.
Tendo em conta a relevância de iniciativas como os Semilleros Creativos, promovidos no México por meio do programa Cultura Comunitária, a presidência propôs a criação de um grupo de trabalho (GT) para dar continuidade e viabilizar este compromisso que foi assinado com a Agência Cultura Córdoba e o programa Ibercena. A secretária técnica do IberCultura Viva, Flor Minici, destacou que serão criados dois GTs de Participação Social: o GT Cultura Infância e o GT Tesouros Vivos, também citados no dia anterior. Em seguida, Minici apresentou a proposta do Plano Operacional Anual (POA 2025).
No POA 2025 está prevista a sétima edição do concurso de curtas audiovisuais do programa (o último foi lançado em 2021, com o tema “Juventude e cultura comunitária”). O CI aprovou que esta edição seja realizada sob o tema “Tesouros Vivos, Saberes e Tradições”, com ênfase nos povos originários, indígenas e de matriz africana.
Além disso, o plano foi aprovado com a indicação de que o Edital de Mobilidade 2025 apoie a realização do 6º Congresso Latino-Americano de Culturas Vivas Comunitárias, com a opção de as organizações participarem também do Seminário Internacional de Experiências de Gestão em Políticas Culturais de Base Comunitárias na América Latina e Ibero-América, proposta pelo Instituto Latino-Americano para a Promoção da Cultura Viva Comunitária.
Os participantes do CI também aprovaram a criação da Rede Educativa IberCultura Viva, a ser integrada por qualquer instituição de ensino com constituição jurídica formal, de gestão pública, privada ou comunitária, do Espaço Ibero-Americano.
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Leia a ata da 14ª Reunião do Conselho Intergovernamental
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