Experiencias
Por IberCultura
Em23, nov 2015 | EmEl Salvador | PorIberCultura
Tiempos Nuevos Teatro (TNT): a arte do cotidiano nas montanhas de Chalatenango
A Associação Tiempos Nuevos Teatro (TNT) surgiu em 1993, um ano depois da assinatura dos Acordos de Paz que terminou com mais de uma década de guerra civil em El Salvador. Surgiu nas montanhas de um departamento (estado) historicamente excluído, Chalatenango, e ali permanece depois de 22 anos. E é dali, de um povoado de 1.300 habitantes na zona rural salvadorenha, que se projeta como uma referência em arte comunitária para toda a América Latina.
“Em El Salvador sempre houve uma grande criatividade a combater a fera, durante várias décadas de conflito, como todo processo de libertação”, destaca o produtor cultural Julio Monge, um dos fundadores do grupo. “E desde o princípio estava clara a nossa missão como artistas populares: ‘construir cidadania através de processos educativos, artísticos e culturais, da organização e da participação dos diferentes setores da comunidade, como uma forma de desenvolvimento individual e coletiva, para a transformação social’”.
Seus primeiros integrantes eram em sua maioria jovens que sobreviveram a massacres e atropelos diversos durante os anos de conflito armado, e começavam a viver com a esperança dos novos tempos. Eram jovens vinculados a grupos de educação popular que conseguiram se formar como produtores culturais e artistas cênicos, para apoiar a educação e a participação da comunidade.
Entre as linhas de trabalho seguidas pela TNT estão o apoio à educação (educando crianças e alfabetizando adultos), a facilitação de oficinas e formação artística, o fortalecimento da memória histórica, a promoção da liderança juvenil, criativa, inovadora e com senso crítico, a valorização dos povos originários, a recuperação e a resignificação de espaços culturais (praças, parques, casas comunales, etc).
A companhia
Respeito, alegria, companheirismo, solidariedade, liberdade e equidade são os valores que norteiam o trabalho da associação, que em duas décadas de existência montou mais de 40 espetáculos e realizou mais de 600 sessões nos palcos mais diversos, desde salas de teatro até parques, ruas e praças de todos os tipos.
A companhia monta obras de reconhecidos dramaturgos nacionais e internacionais, mas muitos de seus espetáculos são de criação coletiva, inspirados na realidade cotidiana. São obras de teatro relacionadas, por exemplo, a campanhas de sensibilização de temas como aleitamento materno, alcoolismo ou gravidez na adolescência.
Seus integrantes percorrem muitas comunidades de Chalatenango e da zona paracentral do país, levando figurinos e cenários nos ombros, caminhando por veredas e morros. Alguns jovens da comunidade que se integram à TNT conciliam estudo formal, trabalho agrícola e formação artística.
O centro cultural
O projeto começou em San José Las Flores, primeiro município repovoado após o conflito armado. Em 2008, a sede da associação mudou de lugar, instalando-se em San Antonio Los Ranchos, um dos povoados que a TNT acompanhou desde o início. Ali se criou o Centro Cultural Jon Cortina, sua principal aposta para estes anos.
O centro cultural tem quatro salas: 1) a Sala Virginia Peña, onde está o escritório da área de educação, comunicações e administração; 2) a Sala Roberto Armijo, de uso múltiplo, utilizado como centro de capacitação; 3) a Sala Dimas Rodríguez, dedicada à “midiateca” (biblioteca, ludoteca e videoteca); e 4) a Sala Hermana Sofía, onde são montadas exposições de memória histórica e pinturas.
No Centro Cultural Jon Cortina, o trabalho artístico e social da TNT vem ampliando sua oferta. Além de atividades dirigidas a pessoas com deficiência e com mais de 65 anos, eles realizam oficinas artísticas em parceria com professores e alunos de educação básica. A partir do centro também se impulsiona a produção de eventos como o Festival Artístico Chalateco, o Festival do Maíz e os encontros artísticos centro-americanos.
Hoje, a TNT faz parte de redes locais, nacionais, regionais e internacionais, como o Movimento de Arte Comunitaria Centro-americano (Maraca), a Rede Meso-americana El Caleidoscopio, a Rede Latino-americana de Teatro em Comunidade, e a Rede Latino-americana de Arte e Transformação Social.
“Já não é tempo de resistir, é tempo de construir, de propor, de fazer, de tomar a iniciativa, de dar um passo mais”, ressalta Julio Monge. “É hora de enredar-se, mas primeiro fortalecendo os grupos, as associações, fundações, corporações, desde baixo, desde a base. É necessário trabalhar em redes e não para as redes.”
(**Texto publicado em 23 de novembro de 2015)
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Saiba mais:
https://tntlosranchos.blogspot.com.br/