Experiencias
Por IberCultura
Em20, mar 2017 | EmPeru | PorIberCultura
La Tarumba e o programa Cuerda Firme: o circo que transforma vidas
Em Lima existe um Ponto de Cultura que desde 1984 mostra ao mundo que o circo transforma vidas. La Tarumba, esta associação cultural sem fins lucrativos instalada em uma casa-teatro-escola no distrito de Miraflores, nasceu de um sonho compartilhado por um grupo de jovens artistas liderados por Fernando Zevallos e Estela Paredes. Convencidos da influência da arte nos processos de desenvolvimento de uma sociedade, seus fundadores buscaram integrar teatro, circo e música em uma proposta artístico-educativa pioneira, inclusiva e de identidade peruana, mas também universal. Conseguiram o que queriam com uma metodologia baseada no jogo, no afeto e na criatividade, e assim eles vêm demonstrando que através do circo pode-se desenvolver uma pedagogia para a vida.
La Tarumba tem duas linhas centrais de ação: a artística e a pedagógica. A linha pedagógica está vinculada principalmente à escola profissional de circo social e as oficinas para crianças, adolescentes e adultos (a escola recebe mais de 1.000 alunos por ano). Os espetáculos, por sua vez, contam com um elenco profissional, sobretudo peruano, e têm como uma de suas missões levar à sociedade a importância do reconhecimento e o desenvolvimento da identidade. Para o grupo, os espetáculos “permitem sensibilização, diversão, participação e uma possibilidade fecunda para a compreensão da vida”.
Desde 2003 a organização conta com tendas de circo equipadas com 900 poltronas, preparadas para a itinerância. Com elas. o “Mundo Tarumba” se traslada a outras regiões do país, levando espetáculos e oficinas que buscam motivar a reflexão e o otimismo. Nestes mais de 30 anos de trajetória eles produziram 25 espetáculos, com mais de 5.000 apresentações em temporadas, festivais e excursões em Peru, América Latina e Europa.
Cuerda firme
Há três anos, La Tarumba deu um de seus maiores saltos ao assumir a coordenação regional do programa Cuerda Firme, executado de maneira colaborativa e participativa com duas organizações “hermanas” que também trabalham com circo social: o Circo del Sur, da Argentina, e o Circo del Mundo, do Chile. As três escolas se juntaram com a intenção de capacitar 1.500 jovens da região por meio das artes circenses, para desenvolver habilidades socioemocionais que lhes permitissem ter acesso da melhor forma a um emprego. A iniciativa nasceu em La Tarumba
O projeto “Métodos de formación innovadores para jóvenes en riesgo: el circo social como alternativa para mejorar la empleabilidad” nasceu em La Tarumba a partir do programa Circo Invisible, que também deu origem à Escola de Formação Profissional de Circo Social. Recém-finalizado, o projeto foi realizado graças a um convênio firmado com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, por meio do Fundo Multilateral de Investimentos (BID-Fomin), e com a participação do Cirque du Soleil como aliado estratégico.
O processo foi desafiador e trouxe aprendizagens significativas, segundo a coordenadora regional do projeto, Itziar Rubio Barrera. “O objetivo era fundamentalmente criar um modelo regional de caráter inovador que tomasse a arte como ferramenta pedagógica para erradicar ou melhorar um problema estrutural que temos, que é o desemprego juvenil, em jovens com situação de vulnerabilidade social”, resume.
Resultados
Os resultados regionais são bastante positivos. “Dos 1.500 participantes, 55% deveriam inserir-se no mercado de trabalho neste processo de três anos, com 40% de participação de mulheres assegurado, para garantir uma participação equitativa de gênero. Conseguimos. Mais do que isso, superamos algumas metas”, afirma a coordenadora.
Os números também mostram que 93% dos participantes melhoraram suas habilidades em comunicação, autoestima, trabalho em equipe, criatividade e compromisso. São estas as chamadas “habilidades brandas”, ou socioemocionais, descritas no programa como “as competências através das quais as pessoas entre 18 e 29 anos podem interiorizar uma série de aspectos como o manejo de suas emoções, o estabelecimento de metas positivas, confiança e autoestima, a relação com seu entorno ou a tomada responsável de decisões”.
Como ressalta Itziar, “as escolas La Tarumba (Peru), Circo del Sur (Argentina) e Circo del Mundo (Chile) conseguiram demonstrar – através da criação do modelo educativo regional para a empregabilidade Cuerda Firme – que o circo possui um valor agregado como ferramenta para a transformação social”.
Ferramentas
Além de desenvolver tais habilidades nos participantes, o projeto pretendia criar uma ferramenta de avaliação para estas competências, algo de caráter científico que pudesse aproximar o circo da academia. Uma ferramenta viva, já que as habilidades socio-emocionais são uma questão subjetiva, não se trata de algo material que alguém pode quantificar facilmente. Para isso, contaram com a colaboração de especialistas, escutaram o mercado, os agentes que empregam estes jovens (que buscam neles?), as escolas, os próprios jovens.
“Sobretudo nos importa o que passa na vida destes jovens, e o que passa na vida mais além do projeto. Trabalhamos com seres humanos em um entorno muito especial, uma população que vive situações bem duras e muitas vezes injustas”, comenta Itziar. “Para nós, é importante manejar o afeto e tratar de contagiar e compartilhar. O que queremos é que Cuerda Firme seja uma filosofia de trabalho para muitas organizações na região.”
Depoimentos
Muitos dos alunos que ingressaram e concluíram as oficinas conseguiram um emprego e desenvolver os próprios empreendimentos. O website do programa (www.cuerdafirme.com) reúne alguns depoimentos de jovenes que participaram das atividades, a exemplo da peruana Tracy Zavala:
“(…) Cuerda Firme me ofereceu a oportunidade de trabalhar dentro da tenda de La Tarumba como assistente. Ao fazê-lo, coloquei em prática o que aprendi dentro da oficina, que é enfrentar meus medos dos clientes, e assim eles puderam levar uma boa imagem de La Tarumba. Me sinto abençoada, pois nos meus curtos 23 anos pude alcançar um dos meus principais objetivos: ter minha microempresa e poder dirigi-la. Dou graças a Deus pela vida e por tantas alegrias que o dia a dia me dá, e a Cuerda Firme pelas oportunidades que me ofereceu. Espero pertencer à nova temporada de La Tarumba!”
Joshep Henrye Vicente Ccanto, de 18 anos, também fala da experiência de maneira entusiasmada:
“(…) Minha melhor oportunidade chegou quando conheci La Tarumba e o programa Cuerda Firme. Aí foi onde pude desenvolver muitas das habilidades que eu nem sequer sabia que tinha: me expressar de maneira assertiva; me expressar de maneira corporal; fazer malabares; superar meus medos a novos desafios. Descobri que posso fazer muitas coisas, é só umq questão de esforço e perseverança.
Aprendi a caminhar em perna-de-pau, a ser eu mesmo, a dizer o que penso, como elaborar um CV. Aprendi com os benefícios de um trabalho formal, com o que esperam do meu trabalho, o trabalho em equipe! E assim muitas coisas mais. Atualmente, estou trabalhando no Poder Judiciário como auxiliar de administração e fazendo cursos no SENATI (ofimática) e FORGE (logística e humanística), e ambos estão indo muito bem. Minha família se sente muito feliz de que eu tenha melhorado de uma maneira surpreendente. Tenho muitos sonhos. (...)”
Manifesto
Os sonhos são muitos, e grandes, e parecem seguir um bom caminho, como mostra o “Manifesto Cuerda Firme”, construído em um processo criativo pelos jovens participantes de projeto:
“Yo soy cuerda firme
Me gusta afrontar la vida y
lograr mis metas
sin miedo a tropezar.
Supero barreras y retos día a día
y me mantengo firme en todos mis sueños.
Amo el arte, la música, el teatro,
soy circo y soy alegría.
Déjame enseñarte y ser tu
compañero en esta travesía.
Un verso dice:
‘el arte es un arma cargada de futuro’.
En mi cuerda están estos sueños.
Mis lazos no se rompen”.
(*Texto publicado em 20 de março de 2017)