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Instrutores indígenas criam vocabulário com perspectiva de gênero para trabalhar em comunidades de Chiapas Instrutores indígenas criam vocabulário com perspectiva de gênero para trabalhar em comunidades de Chiapas 

Por IberCultura

EnEm 03, jun 2024 | Em | Por IberCultura

Instrutores indígenas criam vocabulário com perspectiva de gênero para trabalhar em comunidades de Chiapas 

[CENZONTLE]

 

No estado de Chiapas, no México, uma equipe multidisciplinar que trabalha com mulheres em comunidades indígenas de cinco municípios criou o projeto ““Vocabulário com perspectiva de gênero em línguas originárias”. A iniciativa foi uma das 16 selecionadas na convocatória “Cenzontle: uma janela para as línguas originárias da Ibero-América”, promovida pelos programas IberCultura Viva e Ibermemoria Sonora, Fotográfica y Audiovisual.

No fórum virtual realizado nos dias 21 e 22 de fevereiro de 2024, por ocasião do Dia Internacional da Língua Materna, cinco integrantes deste grupo de instrutores indígenas de Chiapas falaram sobre o vocabulário que nasceu de uma “necessidade linguística”. Isto é, pela necessidade de falar de realidades impossíveis de nomear, porque não existiam em tseltal, tsotsil e tojolabal, as línguas faladas nestas comunidades onde ministravam oficinas formativas e produtivas.

“A ideia surgiu do trabalho de campo que fazemos, porque trabalhamos a questão do gênero com as mulheres, desde os direitos humanos, a irmandade, os direitos à saúde, a violência, o machismo, os micromachismos… E na hora de ministrar estas oficinas encontrávamos termos que não existiam em nossa língua”, disse Bertha Lorena Cruz Hernández, responsável pela inscrição do projeto, no fórum virtual do dia 22.

Depois de utilizar muitos termos em espanhol, por falta de outros em tsotsil (sua língua materna), Bertha Lorena percebeu que isso acontecia nas três línguas, e que colegas de trabalho também faziam empréstimos linguísticos, o que dificultava a compreensão da disciplina e diminuía o uso da língua originária. Foi por isso que começou a ser desenvolvido um vocabulário com perspectiva de género, incluindo palavras e termos como violência psicológica, autonomia, disparidades de género, empatia, equidade, assédio sexual, feminicídio, assédio, abuso sexual, sexting e misoginia, entre outros. . 

“Como sabemos, as línguas hegemônicas estão sempre renovando seu vocabulário. Sororidade, por exemplo, é uma palavra relativamente nova, criada a partir de necessidades linguísticas, para o pleno exercício dos direitos humanos. Então começamos a pensar: como podemos, como falantes de línguas indígenas, fortalecer e revitalizar a nossa língua?”, comentou a responsável pelo projeto.

Para solucionar essa deficiência linguística que existia ao trabalhar as questões de gênero com mulheres indígenas, foi proposta como primeira tarefa um vocabulário de 100 palavras, no qual a equipe deveria não apenas traduzir e interpretar, mas em alguns casos fazer uma ressignificação de palavras , ou criações técnicas de novas palavras. 

O grupo tem trabalhado na questão do género em coordenação com a Secretaria de Igualdade de Gênero do Governo do Estado de Chiapas, e na questão da linguística, com o apoio da Universidade Intercultural de Chiapas.

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Três grupos étnicos, cinco municípios

O projeto foi apresentado à convocatória “Cenzontle” enquanto era desenvolvido com pessoas de cinco municípios pertencentes ao estado de Chiapas: Las Margaritas (onde se fala tojolabal); os municípios de Chanal, Oxchuc e Yajalón (onde se fala o tseltal) e Zinacantán (onde se fala o tsotsil). A equipe multidisciplinar que atua no campo é formada por pessoas descendentes dessas etnias e pertencentes a esses municípios.

As 13 pessoas que compõem a equipe – 10 mulheres e 3 homens – são advogadas, psicólogas, sociólogas e pessoas com formação em línguas e cultura e ciências da educação. No início do projeto, o grupo reuniu-se em diferentes espaços que lhes foram disponibilizados, analisando e partilhando ideias sobre a metodologia a realizar. Posteriormente foi feita a seleção e elaboração da lista de 100 palavras, foi criada uma tabela como ferramenta para trabalhar nos meses seguintes e seguiu-se com a tradução, interpretação, criação e ressignificação das palavras.

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Apoio metodológico

“No início nos conhecemos e tivemos um primeiro contato com a Universidade Intercultural de Chiapas, com o professor Meneses, que nos ajudou a criar essas palavras, para começar a trabalhar de acordo com o vocabulário que temos”, contou Pedro Aureliano, membro da equipe tsotsil do projeto que também participou do fórum. 

Victor Hugo Gomez, um dos representantes da etnia Tseltal no fórum, também mencionou o apoio do professor Meneses, que os ajudou a encontrar as novas palavras, tentando vislumbrar ou gerar uma visão sobre elas. “Somos originários da comunidade, por isso tivemos que começar a pensar qual era a palavra adequada para adaptar”, destacou, citando como exemplo o conceito de gênero, que se “refere ao conjunto de ideias, crenças e atribuições sociais e políticas construídas em cada cultura e momento histórico”. 

Como a palavra “gênero” não existia em tseltal, eles tiveram que pensar em como poderia ser pronunciada nesta língua. “A partir daí a professora começou a nos pedir comparações de palavras, a nos perguntar como essa palavra é descrita na língua tseltal, e assim aos poucos fomos encontrando esse procedimento, adaptando-o de acordo com a nossa forma de compreensão. Foi um trabalho um pouco duro, mas acho que conseguimos”, comentou Gómez. “Chajbtalel foi a palavra que escolheram para definir “gênero”. A escolha é baseada na combinação de dois termos: chajb, que significa grupo, e talel, que se traduz como modo de ser.

Vilma Guadalupe López Gómez, por sua vez, citou como exemplos dois conceitos – consciência de gênero e misoginia – e a forma como foram construídos em tojolabal. No primeiro caso, apontou o processo de criação do conceito, por meio do próprio léxico da língua. Conforme explicado durante o fórum virtual, o termo escolhido para ser entendido como “consciência de gênero” em tojolabal significa literalmente “estar consciente para que homens e mulheres vivam bem”. Para a palavra “misoginia”, foi feita uma composição que literalmente significa “ódio às mulheres”.

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Processo de socialização

Durante o fórum, Vilma López destacou que esse vocabulário ainda está em processo de socialização com as mulheres indígenas e vem sendo trabalhado com o programa do Centro para o Desenvolvimento das Mulheres. Segundo ela, a iniciativa também se dirige a todos os profissionais (ou “profesionistas”, como se diz no México) que falam uma língua indígena “e, claro, também a todos aqueles que não falam a língua, porque é bom conhecer as questões de gênero, pois nas comunidades indígenas, em sua maioria, não se fala muito sobre isso.”

Com a publicação do vocabulário e a socialização às comunidades indígenas, o grupo promotor do projeto espera poder cobrir necessidades linguísticas, dando nomes a ações, situações e adjetivos que antes não podiam ser expressos em tojolabal, tseltal e tsotsil, para que estes termos comecem a ser de uso diário e, assim, possam reduzir as disparidades de desigualdade de género. 

Além disso, espera-se que a iniciativa possa inspirar projetos em outras áreas. “Esperamos que seja uma ferramenta não só para mulheres e profissionais como nós, que trabalham com questões de gênero. Poderia ser também um divisor de águas para solucionar necessidades linguísticas em outras áreas, saúde, direito, áreas onde a língua deve ser revitalizada”, resumiu Bertha Lorena Cruz. 

Participantes do projeto no fórum virtual que se levou a cabo no Dia da Língua Materna

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Sobre Cenzontle

 

A convocatória “Cenzontle: uma janela para as línguas nativas da Ibero-América” foi lançada pela IberCultura Viva e Ibermemoria Sonora, Fotográfica y Audiovisual no dia 21 de fevereiro de 2023, Dia Internacional da Língua Materna, com o objetivo de tornar visível e valorizar a línguas dos povos originários da região ibero-americana, bem como promover o seu uso e preservação. 

A iniciativa destinava-se a projetos concluídos, em desenvolvimento ou a realizar, voltados para processos de conservação, registro, pesquisa, divulgação, educação, gestão e valorização das línguas indígenas ou nativas dos países membros destes dois programas de cooperação vinculados à Secretaria Geral Ibero-Americana (SEGIB).

O “Vocabulário com perspectiva de género em línguas originárias” foi um dos 16 projetos premiados nesta primeira edição do concurso (com um valor de 950 dólares cada). No total, foram selecionadas iniciativas de 10 países: México, Panamá, Chile, Peru, Uruguai, Colômbia, Argentina, Costa Rica, Paraguai e Equador. 

Leia também:

Programas de Cooperação Ibero-Americana promovem um vocabulário com perspectiva de gênero nas línguas indígenas

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Saiba mais sobre as comunidades participantes do projeto:

 

Tolojabal

O município Las Margaritas está localizado no estado de Chiapas, entre os limites do Altiplano Central e da Serra Norte. Fundado como vila por decreto de 9 de dezembro de 1871, foi elevado à categoria de cidade em 1981. O povoado se formou com os habitantes da então Ranchería Las Margaritas; sua geonomia pode ser traduzida como “lugar de mulheres bonitas”. A população atual é formada por mestiços e tojolabales. A maioria de suas localidades apresenta elevada taxa de atraso social e econômico, o que aumenta as disparidades de gênero.

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Tseltal

Os municípios tseltal de Chanal, Oxchuc e Yajalón estão localizados nas Terras Altas de Chiapas e têm população indígena. Na história de Oxchuc (em espanhol se traduz como “Três Nós”) diz-se que foi invadido pelos espanhóis no século XVI. Em 1936 foi instituído como município e refletiu diversas mudanças sociopolíticas ao longo do tempo. É um dos poucos municípios do estado de Chiapas onde governam mulheres e atualmente o sistema eleitoral é realizado por usos e costumes. A grande maioria da população vive em extrema pobreza. 

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Chanal (em espanhol se traduz como “Sábio que ensina”) é outro município indígena Tseltal que faz fronteira com Oxchuc. Em 1935 foi atribuída a categoria de município livre. Tem 13.678 habitantes, dos quais 50,8% são mulheres (INEGI 2020); 68% da população total vive em pobreza extrema, a maioria mulheres e crianças. 

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Yajalón vem do Tzeltal “Yashalum”, que significa “Terra Verde”. Em 1963 foi designada a categoria de cidade de Yajalón, e a população total é de 40.285 habitantes, dos quais 19.590 são homens e 20.695 são mulheres. É um município com elevado grau de marginalização e atraso social, onde a população mais vulnerável são mulheres, meninas e meninos.

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Tsotsil

O município de Zinacantán (nome em nahuatl, que traduzido para o espanhol é “Lugar dos morcegos”) também pertence à região de Altos de Chiapas. Antes da chegada dos espanhóis, era conhecido na região mesoamericana como centro de troca de produtos. Tem uma população de 45.373 habitantes, sendo 53,5% mulheres (INEGI 2020), e quase metade da população encontra-se em elevado grau de vulnerabilidade social, maioritariamente mulheres e crianças.

 

 

 

Colmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimentoColmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimentoColmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimentoColmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimentoColmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimentoColmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimento

Por IberCultura

EnEm 08, jan 2020 | Em | Por IberCultura

Colmenas de Zapopan: uma rede de centros comunitários de inclusão e empreendimento

(Texto e fotos: Dirección de Desarrollo Comunitario del Gobierno Municipal de Zapopan)

 

No município de Zapopan (Jalisco, México) existe uma rede de Centros Comunitários de Inclusão e Empreendimento, conhecidos como “las Colmenas”, que procura enfrentar a crise ambiental, social e econômica por meio da construção de um sentir comum e a promoção dos princípios essenciais da Cultura Viva Comunitária.

As Colmenas buscam ser espaços seguros e inclusivos, que possam gerar comunidades de aprendizagem através da gestão de serviços (oficinas, capacitações, assessorias e eventos) cujo propósito seja o desenvolvimento de ferramentas e a socialização de conhecimentos que promovam o desenvolvimento integral, fortaleçam a coletividade, regenerem o tecido social e estimulem a criação de projetos comunitários. 

Esta iniciativa do Governo Municipal de Zapopan aposta no espaço público como um elemento articulador, estruturante e regulador da cidade, de onde se pode contribuir para melhorar questões ambientais, dinâmicas e práticas sociais, e a qualidade de vida dos cidadãos. Concebidas como espaços vivos, cheios de cultura e dinâmicas coletivas, as Colmenas buscam consolidar o bem comum a partir dos elementos característicos que o espaço público deveria ter. Ou seja, de interesse público, includente e com um desenho universal que fomente a integração social.

Para isso, as Colmenas propõem um modelo de trabalho em rede que consiste em alcançar um balanço adequado entre a participação da comunidade, do setor público, das organizações da sociedade civil, da iniciativa privada e de outros atores capazes de incidir positivamente em cada âmbito estratégico. Dentro deste modelo inovador, a participação comunitária se destaca em todas as etapas e processos, através de entrevistas, diagnósticos e assembleias, que têm permitido que as Colmenas estejam – na medida do possível – verdadeiramente aterradas nos problemas, necessidades e desejos das e dos vizinhos. 

 

Antecedentes

Em 2013, o Governo Municipal de Zapopan firmou um convênio com ONU-Habitat, o programa das Nações Unidas para os assentamentos humanos. Desta colaboração surgiu a Estratégia Territorial Zapopan 2030 (ETZ2030), elaborada sob as diretrizes da Agenda 2030 e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável por uma equipe interdisciplinar de especialistas locais e internacionais e o Escritório de Projetos Estratégicos de Zapopan, com um forte componente de participação cidadã.

Em termos territoriais, Zapopan é o município mais extenso da Área Metropolitana de Guadalajara (AMG) e também o que mais tem crescido em termos absolutos nos últimos 20 anos. Em termos de infraestrutura, seu crescimento tem sido desordenado e disperso, e em seu território se observam grandes contrastes, pois enquanto abriga uma das áreas socioeconômicas mais dinâmicas do país, também mantém muitos setores na informalidade e sem serviços básicos. Em Zapopan, zonas funcionais e bem conectadas convivem com territórios de urbanização dispersa, sem serviços e equipamentos públicos. 

A ETZ2030 diagnosticou o município através de âmbitos estratégicos (Distrito Centro, Arco Primavera, Valle de Tesistán, Las Mesas e Santa Ana – El Colli) que posteriormente foram delimitados como polígonos de intervenção. Em cada um deles foram feitos diagnósticos técnicos, que analisaram sua localização, população, meio físico natural e vulnerabilidade, espaço e estrutura urbana, serviços e equipamento e conectividade. As Colmenas foram colocadas em três dos âmbitos estratégicos, considerados os mais desiguais e com maior índice de marginalização: Colmena Miramar para Santa Ana-Tepetitlán, Colmena San Juan de Ocotán para Arco Primavera, e Colmena Villa de Guadalupe para Las Mesas. 

A rede de Colmenas faz parte dos Projetos Urbanos Integrais Sustentáveis (PUIS), instrumentos de desenvolvimento sustentável alinhados com a ETZ2030, onde a articulação de ações estratégicas resulta mais próxima à realidade das comunidades de Zapopan. Os PUIS foram definidos a partir de um diagnóstico que considerou os níveis de marginalidade, criminalidade, oferta econômica, equipamento médico e educativo, conectividade do transporte público, limites naturais, análise de redes sócio-urbanas, densidade populacional, possibilidades reais de trabalho, entre outros. As Colmenas buscam contribuir para a solução da falta de oportunidades educativas, laborais e culturais nestas comunidades. 

Colmena Miramar

 

Grupos de trabalho

O modelo de operação das Colmenas contempla grupos de trabalho, programas transversais, redes de trabalho e oferta de serviços como oficinas, capacitações, assessorias e eventos. Os grupos de trabalho – ou clusters – organizam suas atividades e delineamentos em torno de áreas específicas de conhecimento que se definem a partir das necessidades detectadas nas comunidades. Os grupos de trabalho são os encarregados de diagnosticar, elaborar e avaliar os serviços para a comunidade relativos à sua área específica de conhecimento: educação, tecnologia, meio ambiente, arte, cultura e esporte, e saúde integral. 

O grupo de trabalho de educação articula os serviços que buscam o aprendizado de conhecimentos úteis para a vida comunitária, assim como habilidades que facilitem o exercício do direito à cidade e ao espaço público. Este cluster aproxima a comunidade de oportunidades acadêmicas, sociolaborais e de empreendimento através de opções autogeridas e coletivas de ingresso. A oferta de serviços abarca a educação formal, oficinas socioprodutivas e de empreendimento como alternativas de autoemprego e educação não formal como gestão de formas de organização coletiva para a solução de problemas. 

Já o grupo de trabalho de tecnologia aproveita os recursos tecnológicos para a solução de problemas comunitários. Está profundamente relacionado com o grupo de trabalho de educação, pois colaboram na oferta de ferramentas digitais e de comunicação para o desenvolvimento social. Este cluster também faz trabalhos de comunicação interna e externa e atende às necessidades de tecnologia das Colmenas, já que seus afazeres são transversais ao trabalho dos outros clusters. 

Colmena San Juan de Ocotán

 

O cluster de meio ambiente promove a sustentabilidade de cada Colmena e o melhor aproveitamento de recursos através do manejo de resíduos  e o cuidado, proteção e manejo dos centros naturais vinculados às Colmenas. Este grupo de trabalho busca gerar na comunidade uma melhor compreensão dos sistemas naturais e sua relação com a sociedade. Para isso, promove a educação ambiental, a agricultura urbana, a sustentabilidade e o consumo responsável. Com o tratamento desses assuntos, criam ferramentas gerais de consciência ambiental, para reconectar com o entorno natural, de trabalho em equipe e de regeneração do tecido social. 

O grupo de arte, cultura e esporte, por sua vez, trabalha para gerar processos de integração, desenvolvimento social, inclusão e construção da interculturalidade através de processos artísticos, culturais e desportivos. Este cluster busca transformar a Colmena em um espaço onde se promova o exercício cultural e se identifiquem, facilitem e fortaleçam os processos que já se dão no território, assim como relacionar pessoas, saberes e recursos. Este grupo propicia o intercâmbio de saberes comunitários intergeracionais, interculturais e promove o nascimento de novos processos comunitários. O cluster anima e motiva a participação comunitária e a ressignificação de experiências culturais, utilizando a arte como ferramenta de transformação social, revigora o exercício dos direitos culturais, e sua defesa. 

Por fim, o cluster de saúde integral compreende a atenção à saúde integral – desde o médico, nutricional e odontológico –, a atenção à saúde psicossocial, e à saúde comunitária, que aposta em práticas de cuidados pessoais, familiares e coletivas que permitam a gestão de ferramentas individuais e coletivas para a regeneração do tecido social que derivam no bem-estar físico, social e psicológico da população.

Colmena Villa de Guadalupe

 

Programas transversais

Para que os grupos de trabalho articulem a oferta de serviços, foi elaborada uma série de programas transversais comuns às atividades das três Colmenas. Os programas transversais são dinâmicos, transformam-se e adaptam-se segundo a realidade específica de cada Colmena. Atualmente existem os programas transversais de gênero, inclusão, interculturalidade, cuidados comunitários, saberes comunitários e empreendimento. 

O programa transversal de gênero promove a implementação da perspectiva de gênero em todos os serviços das Colmenas. Seu objetivo geral é criar ferramentas para que todos reflexionem sobre sua posição e seus privilégios – ou a falta deles – no contexto social, familiar, laboral, político e público, com vistas a identificar violências e reconhecer a maneira com que se reproduzem e se reforçam. O programa de gênero cria espaços seguros e redes de solidariedade que permitem o empoderamento das mulheres através da construção de vínculos que possam impulsionar projetos pessoais e coletivos dirigidos a transformar sua realidade. 

O programa de cuidados comunitários se desprende do programa transversal de gênero e promove o aprendizado de estratégias de criação positiva e desenvolvimento pessoal psicoafetivo, trabalhadas desde dois grupos simultâneos, um com adultos e outro com crianças.  Em ambos os grupos se trabalham temas que vão desde a comunicação e o estabelecimento de limites até as relações inter e intrapessoais. A intenção é fortalecer a identidade coletiva do grupo e sua capacidade de cooperação e autogestão. 

O programa transversal de inclusão é o encarregado de capacitar o pessoal das Colmenas e dotá-los de ferramentas que ajudem a oferecer atenção aos usuários com deficiência física ou intelectual. Aqui se administram recursos que contribuam para a acessibilidade em cada Colmena e sua respectiva oferta. O programa fomenta, ainda, a coesão social entre as pessoas com e sem deficiência das comunidades. 

O programa transversal de interculturalidade delineia as ações conjuntas com as pessoas de povos originários que beneficiem a coletividade e seus integrantes, com base no reconhecimento e no respeito mútuo, com a intenção de gerar uma relação de igualdade entre grupos e pessoas de culturas distintas que são igualmente dignas e valiosas. 

 

O programa de empreendimento se encontra em fase de diagnóstico e desenho. No entanto, está concebido para suscitar processos autogestivos e coletivos de empreendimento, e devem identificar quais são as dimensões que devem ser cobertas para promover o empreendimento integral. Propicia-se a economia sustentável, solidária e local.

O programa de saberes comunitários mantém um processo estruturado de acompanhamento aos aspirantes a voluntários/as, e àqueles que se desempenhem dessa forma através de voluntariado, serviço social, práticas profissionais ou alguma outra modalidade sem fins de lucro. Este programa é especialmente importante para que a comunidade se envolva ativamente nas atividades das Colmenas, ao compartilhar seus conhecimentos e consolidar-se como agentes de ensino e transformação que fortaleçam em capital social a cada PUIS. 

O programa de saberes comunitários é um efeito positivo do modelo de governança participativo das Colmenas, que aborda os aspectos da vida comunitária que mais afetam a qualidade de vida de seus membros e que retoma os elementos valiosos que possam detonar outras formas de relacionar-se afetivamente.

 

Redes de trabalho

Este modelo de trabalho tem resultado em redes que supõem tecer e nutrir mutuamente aprendizagens, conhecimentos, vínculos e capacidades que possam potenciar os pontos fortes e reparar as fraquezas. As redes têm se consolidado a partir da presença de outros atores no terreno, e se proposto como um espaço de encontro entre comunidade, Colmenas, setor público, sociedade civil organizada, iniciativa privada e qualquer outro ator cujo objetivo seja melhorar as condições de cada âmbito.

Para cada Colmena existe uma rede: Sul para Miramar, Norte para San Juan de Ocotán e Villa de Guadalupe. Nas redes se discutem os principais problemas a resolver, se priorizam ações e se coordenam iniciativas. Esta maneira de trabalhar tem feito com que uma grande variedade de atores se envolvam nos processos das Colmenas e gerado comunidades de aprendizagem, para que todas e todos se beneficiem e que se traduza em uma melhora tangível e mensurável do entorno e das condições de vida das comunidades. 

Para fortalecer as redes, as Colmenas organizam assembleias periódicas e mantêm comunicación constante com cada uno dos atores. A intenção é avaliar o impacto dos serviços, atualizar os diagnósticos e promover o encaminhamento de novos serviços e colaborações para que realmente possam aportar na solução dos problemas mais importantes das comunidades e remediar os possíveis efeitos negativos que as mesmas Colmenas possam gerar.

Este modelo de governança participativo permite que setores historicamente vulneráveis possam retomar o protagonismo através das ferramentas necessárias para incidir  ativamente em seu contexto social, político, econômico e cultural. Ademais, as redes permitem que usuários e colaboradores se mesclem, e assim se aposta na sustentabilidade das Colmenas, de forma que as comunidades e suas necessidades possam ditar o rumo de sua operação. 

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(*) Texto publicado em 8 de janeiro de 2020

  

 

 

Leia o artigo na íntegra:

La cultura comunitaria, eje central de las Colmenas en Zapopan 

Altepee: a música de cordas como ponte entre realidades comuns e miradas diversasAltepee: a música de cordas como ponte entre realidades comuns e miradas diversasAltepee: a música de cordas como ponte entre realidades comuns e miradas diversas

Por IberCultura

EnEm 20, maio 2016 | Em | Por IberCultura

Altepee: a música de cordas como ponte entre realidades comuns e miradas diversas

altepee-4No princípio, o que fazia com que um grupo de jovens de Veracruz, México, se juntasse em torno de suas jaranas (instrumento de corda parecido com um violão) era a amizade e o gosto por tocar. Pouco a pouco eles foram se dando conta de que a tradição do fandango (festa que reúne músicos e sapateadores ao redor da tarima) era uma forma natural de se organizar, que os aproximava das comunidades e do conhecimento de seus avós. Nascia então o Colectivo Altepee Son.

O músico Sael Blanco, um dos fundadores, conta que a maioria dos que iniciaram o coletivo há sete anos se conheceu na universidade e por causa dos huapangos (fandangos), as festas onde tocam esta música de cordas oriunda dos povos originários. “Todos somos de comunidades do sul de nosso estado, que é rico em biodiversidade e assuntos culturais, mas também é um dos que recebem menos atenção por parte do Estado e onde há alguns anos começou a surgir uma violência perpetuada pelo crime organizado”, afirma.

Ao ver e viver tudo isso em suas comunidades, Sael e os amigos decidiram fazer algo por meio da música. “Tivemos que deixar a universidade e passamos a trabalhar com a música, que nesses momentos te cura do temor que te imobiliza. Começamos a nos dar conta de que, por medo, pouco a pouco as pessoas deixavam de falar ou de sair de suas casas, os jovens viam como melhor opção entrar para o crime organizado que para outro tipo de trabalho (também escasso)”, comenta.

Encontro de gerações

altepee-13A música de cordas do sul de Veracruz, que ao longo de 300 anos vem sendo transmitida de geração em geração, tem sido uma importante ferramenta de unificação social para o Altepee, já que permite a interação entre gerações – os jovens interessados em aprender a música e os mais velhos, que vêm sabendo conservá-la, e dos quais aprendem também uma série de valores e aptidões que lhes permitem se aproximar de sua identidade, conhecê-la e defendê-la.

“Nos pareceu necessário começar a ocupar diferentes ferramentas para poder preservar esse conhecimento há muito desvalorizado e que, por nossa experiência de vida, entendíamos que nos faz falta. Assim, começamos a documentar em vídeo e áudio, o que depois serviu para que mais companheiros que chegavam às oficinas pudessem se integrar ao trabalho do coletivo”, diz Sael.

altepee-acayucan-veracruz

Além de contar com uma “disquera” que lhes permite gravar os músicos das comunidades, os integrantes de Altepee fazem um programa de rádio todas as quartas-feiras, oferecem uma pequena oficina de serigrafia e outra de artesanato. Também têm uma produção de jaranas, sabões artesanais, medicina natural e chocolates, vendidos em uma lojinha administrada por eles mesmos. Alguns companheiros se dedicam à agricultura. “Na realidade, a documentação é uma forma de levar a mais pessoas uma visão diferente de vida, que possa ser mais equilibrada com a natureza, entendendo que nós somos parte dela, que, como mostram nossos avós, é parte de nossa identidade.”

 

Construindo sonhos

No começo eram cinco pessoas. Agora são 20, com o respaldo de muitas comunidades, o que lhes permite seguir sonhando e construindo esses sonhos. “Dia a dia vamos vendo os resultados de nosso trabalho. Estamos vivos, seguimos trabalhando e nosso trabalho permite que outros possam também sonhar”, ressalta.

“E nesta ideia de sonhar e seguir fazendo, nos damos conta de que é importante cada experiência assim, pois ainda que nós e muitos mais estejamos trabalhando nessa mudança de nossas más realidades, enquanto o mundo seguir por esse caminho que leva ao abismo, a destruição, todas essas experiências de vida estão em risco. Daí a importância de se juntar, conhecer e construir em rede. Ainda que isso seja bastante difícil, ainda mais num país como o nosso, que é bastante grande em território e bem diferente.”

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O movimento de CVC

altepee-3Altepee é uma das 14 organizações que fazem parte da plataforma Cultura Viva Comunitária México, criada em 2015. Sael conta que no começo da história do coletivo eles fizeram uma viagem a Guatemala, onde conheceram os companheiros de Caja Lúdica. Depois, convidado para participar de um evento chamado Juntos, soube da existência do movimento de Cultura Viva Comunitária e do trabalho feito pela Red Maraca. “Me pareceu bastante boa a forma de trabalhar a rede, experiência que no México não conhecia. Me pareceu interessante a forma tão fraternal com que as organizações se vêm e o trabalho com alegria, que é algo muito importante, também compartilhado pelo coletivo”.

Segundo ele, isso trouxe o interesse para que no México se conhecesse e construísse esse espaço de diálogo e construção, não apenas com as pessoas do país, mas com todos os mesoamericanos. A primeira reunião com vistas à criação de uma rede de CVC no México se deu em fevereiro de 2014. Em outubro de 2015, depois de muita busca e diálogo, as 14 organizações finalmente criaram a plataforma Cultura Viva Comunitária México.

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Em março passado, elas participaram do III Encontro de Cultura Viva Comunitária México, organizado pelo Colectivo Altepee no município de Acayucan, Veracruz. Durante cinco dias, as companheiros e os companheiros que chegaram ao encontro puderam compartilhar suas metodologias com outros coletivos e depois colocá-los em prática na comunidade, deixando  várias iniciativas já em ação.

Pelas características da região e o momento político, ao coletivo parecia importante que o encontro em Acayucan se construísse com o que – e com quem – contavam. “Isso também é uma maneira de mostrar como trabalhamos, que permite nos conhecer melhor”, comenta Sael. “Para nós é muito importante que os recursos monetários não sejam uma barreira para que possamos nos juntar e nos conhecer”.

Saiba mais:

https://colectivoaltepee.blogspot.com.br

https://altepee.bandcamp.com

www.facebook.com/altepees

Coletivo Cultural Polanco: os sonhos e esforços de um grupo de amigos para transformar a realidade do bairroColetivo Cultural Polanco: os sonhos e esforços de um grupo de amigos para transformar a realidade do bairroColetivo Cultural Polanco: os sonhos e esforços de um grupo de amigos para transformar a realidade do bairroColetivo Cultural Polanco: os sonhos e esforços de um grupo de amigos para transformar a realidade do bairroColetivo Cultural Polanco: os sonhos e esforços de um grupo de amigos para transformar a realidade do bairro

Por IberCultura

EnEm 04, abr 2016 | Em | Por IberCultura

Coletivo Cultural Polanco: os sonhos e esforços de um grupo de amigos para transformar a realidade do bairro

A Colônia Lomas de Polanco existe desde 1960. Com aproximadamente 20 mil habitantes, em sua maioria operários e comerciantes independentes, é um bairro da cidade de Guadalajara, México, que tem problemas novos e antigos. Entre eles, inundações fortes nas ruas, que em tempo de chuvas asfixiam as vias, falta de escrituras ou situação legal das casas, roubos e narcotráfico. Com vistas a reconstruir o tecido social e o bem-estar dos habitantes, um grupo de voluntários ali desenvolve atividades culturais, artísticas, formativas e informativas desde 2007.

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Norberto, o fundador do grupo, com as crianças do bairro

“Quando acabaram com um projeto que os jesuítas tinham com os jovens, alguns deles formaram um primeiro coletivo nos anos 90, já independentes da paróquia da colônia. Em 2007, depois de umas eleições fraudulentas no meu país e com vontade de fazer algo para transformar a realidade, convidei vários amigos para formar o atual Coletivo Cultural Polanco”, conta Norberto Villaseñor Montes, o fundador do grupo, que já havia tido experiência de trabalho voluntário nas comunidades eclesiais de base (Cebs) da região.

Integrado por um ativista cultural, dois obreiros, uma socióloga, um psicólogo, uma professora de educação especial, duas donas de casa e uma licenciada em artes visuais, o coletivo produz um festival artístico uma vez por mês, com artistas da colônia e da cidade. “Aqui se apresenta todo tipo de arte e de gênero, desde que não promovam antivalores”, afirma Norberto, destacando também que o Coletivo Cultural Polanco é plural e sua conformação de integrantes é “com base no que contrapesa o serviço à comunidade a partir de suas habilidades ou inabilidades”.

IMG_7947No festival, além dos artistas, são convidados especialistas em temas como  proteção do meio ambiente, direitos humanos e alternativas de consumo, para que dialoguem com o público que assiste ao evento, algo em torno de 100 e 200 pessoas. Também são elaborados um jornal mural e um boletim informativo com o tema de cada festival, os quais são expostos e distribuídos no dia do evento. “Estes são participativos e estão abertos para que as pessoas construam conosco com diversos aportes, como poemas, análise e ilustrações”, comenta Norberto. Ocasionalmente, outras organizações ou pessoas interessadas participam com mesas de livros e artesanato.

As atividades são autogestionadas e ocorrem no Parque Roberto Montenegro, também conhecido como “o parque de Lomas de Polanco”. O espaço, que abarca sete quadras pequenas por uma de largura, é o centro de convivência e recreação não apenas dos habitantes de Polanco, mas também de pessoas de outras colônias que não contam com um lugar assim. “Muitas crianças o visitam diariamente, os adolescentes e jovens têm o parque como um lugar de convivência e os adultos passam horas conversando ali”, diz Norberto. “No entanto, é cada vez maior a presença de viciados em drogas e grupos de jovens que perambulam sem fazer nada. (…) O parque é o espaço verde de todos, mas é também um espaço onde muita gente joga lixo. Percebemos que não o valorizam o suficiente.”

Para ele, o impacto do trabalho do Coletivo Polanco no parque é evidenciado pela presença do público, os comentários positivos, a participação cada vez mais ativa de artistas do bairro e de outras partes da cidade, o reconhecimento da associação de vizinhos da colônia, do padre da comunidade e de outras lideranças locais. “E um público que em geral nos quer bem e nos apoia cada vez mais, dizendo isso pessoalmente, o que nos enche de ânimo para continuar”, complementa.

Uma fortaleza do coletivo, segundo Norberto, vem do fato de eles terem criado um pequeno mas eficaz método de organização, baseado em que as decisões devem ser tomadas em consenso, debatidas e respeitadas pela maioria de seus membros. “Damos prioridade ao trabalho de análise e à realização das atividades em coletivo ou em comissões e, por último, fazemos uma avaliação que nos ajuda a definir o que continuar, melhorar ou jogar fora para profissionalizar nosso trabalho”, explica.

DSCF0520Para aumentar a oferta cultural e profissionalizar as ações existentes, a ideia é que cada um se especialize ainda mais num processo ou parte das atividades: coordenação, área de comunicação ou artística, produção, vinculação, desenho e divulgação. O grupo também sonha ter uma casa cultural de vizinhos e poder oferecer oficinas permanentes “que formem as pessoas em arte, integração e ação cidadã”. A preferência seria pela população de 5 a 15 anos, uma etapa da vida em que as oficinas se constituiriam um agente determinante em sua formação individual e social.

Um dos grandes obstáculos para fortalecer o projeto do coletivo tem sido a situação econômica, já que neste momento eles não recebem financiamento de nenhum tipo. Ainda assim, sentem-se “preparados e motivados”, com vínculos fortes com os artistas e aqueles que ministram as oficinas, e com a consciência do quão necessário e importante são as ações na colônia. “Os anos de voluntariado têm sido muito satisfatórios”, garante Norberto. “Iniciamos com muitas dificuldades, mas aos poucos as pessoas vêm nos reconhecendo e estamos com a ideia de que participem mais ativamente em nosso trabalho comunitário”.

DSCF0306O Coletivo Cultural Polanco é um dos membros fundadores da plataforma Cultura Viva Comunitária México, criada em 2015. “Fomos sede em nossa colônia do segundo encontro regional, e consideramos que esta representa a forma de entender a cultura como nós também a entendemos: a partir da realidade concreta de nossa comunidade e ponderando a participação dos habitantes em ações que beneficiem seu entorno.”

É assim, concretizando alianças efetivas com as pessoas do bairro e as organizações culturais e comunitárias que trabalham na cidade, que os amigos de Polanco pretendem seguir fomentando a economia solidária, os foros públicos, os valores da solidariedade, do respeito e da igualdade, e sua longa lista de sonhos.

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(*) Texto publicado em 4 de abril de 2016

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Saiba mais:

https://www.facebook.com/Colectivo-Cultural-Polanco-355469754634933/

Comunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leituraComunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leituraComunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leituraComunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leituraComunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leituraComunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leitura

Por IberCultura

EnEm 22, fev 2016 | Em | Por IberCultura

Comunidad Comelibros: a rede de clubes do livro que busca fomentar o prazer da leitura

Fotos: Dana Albicker

Lembra o livro que o fez querer ser um explorador de planetas remotos? Ou o conto que o fez ficar amigo do monstro que vive embaixo da cama? Ou o primeiro poema em que reconheceu o amor? Os “comelivros” avisam: se respondeu “sim” a qualquer uma destas perguntas, você também é um deles. E para ajudar que mais meninos e meninas o sejam, a Comunidade Comelibros vem instalando uma rede de clubes do livro em bairros antigos da cidade de Puebla, no México. Cada clube conta com um acervo especializado em literatura infantil e busca criar espaços para o intercâmbio de conhecimento, propiciando a participação de vizinhos nas atividades comunitárias e criando novos sentidos de pertencimento.

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Pensando na leitura como um ato poderoso, revelador e sobretudo prazeroso, o projeto tem como objetivo fazer do livro um personagem cotidiano e necessário na vida das pessoas. Um personagem que provoque a reflexão e que mantenha viva a memória das comunidades. “O que fazemos é desmitificar o papel do livro e da leitura na sociedade”, explica Juan Manuel Gutiérrez Jiménez, diretor da Comunidade Comelibros. “Acreditamos que as histórias nos ajudam a formar comunidades, a criar referências distintas na mente das pessoas. Isso nos dá a esperança de que estas comunidades tenham outras possibilidades de ser e construir relações humanas com base na palavra.”

Chegar a formar o programa de fomento de leitura em Puebla, segundo ele, foi o resultado de imensos debates a respeito do acesso aos bens culturais “apelando para a gratuidade como uma maneira de entendimento das relações humanas”.

Os antecedentes

Seu antecedente imediato foi a rede de livroclubes da Cidade de México durante a primeira década deste século 21. Nesta experiência, dois produtores culturais identificaram que a maior parte do público era formada por crianças. Esta interpretação foi combinada com o lançamento de um edital, Criação Latente, que oferecia 350.000 pesos a projetos realizados em zonas problemáticas da cidade de Puebla e que propiciassem processos na comunidade ao longo de seis meses. Invasión de niños comelibros foi um dos 10 projetos selecionados.

Uma vez aprovado, aqueles dois produtores, Jorge Mariano Mendoza e Joaquín Cruz Galicia, lançaram uma convocatória pública para promotores de leitura, com resultados surpreendentes de participação. Conseguiu-se então formar uma equipe de seis jovens para executar o projeto.

“O olhar de produtores locais, somado à experiência de política pública e gestão cultural, fez com que o projeto adquirisse dimensões sociais bastante favoráveis, convertendo-se em uma referência em temáticas como formação de públicos, gestão cultural comunitária, voluntariado e participação cidadã em nível local”, comenta Juan Manuel, também um produtor cultural e leitor em voz alta.

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Quando esse período de seis meses terminou, os iniciadores regressaram para a Cidade do México e a equipe de Puebla decidiu sustentar o projeto de maneira mais independente, mudando o esquema organizativo para outro “baseado nas noções de voluntariado cultural que forma parte dos processos, mais além do altruísmo”.

“Com o tempo, depois de quase seis anos de sustentar, modificar, avaliar, comprovar nossas metodologias, equivocar-nos e aprender com as crianças e a grande quantidade de companheiros que  formam parte deste sonho, temos muito presente que o acesso ao livro e os direitos que o circundam está intimamente relacionado com o que os projetos podem aportar na criação de políticas públicas”, afirma o diretor da organização.

“Não acreditamos que os livros devam ser exclusivamente objetos de culto, nem que devam estar resguardados em salas ou bibliotecas como peças decorativas. Nós acreditamos que o cuidado e o valor dos bens culturais ocorre quando as pessoas encontram significados neles. O valor dos livros não está nas proibições, e sim nas experiências que deixam no leitor específico. Para isso se encaminham nossas ações”, ele ressalta.

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As atividades

Os clubes do livro da Comunidade Comelibros estão instalados em algumas vizinhanças de Analco, do Alto e da Luz. Nesses três bairros de Puebla, com diversas expressões criativas (leitura, escrita, cinema, teatro, performance, música, oficinas), os “comelivros” convocam crianças, pais e vizinhos, tentando descobrir quais são os processos vitais, os imaginários, as surpresas que existem na comunidade reunida. Para eles, a leitura não se isola. É um processo vivo que se nutre, multiplica e transforma ao entrar em contato com outras propostas.

_MG_4936Os livros muitas vezes são um pretexto para contar mais historias, para dizer do que eles gostam ou o que lhes assusta. “Gostei muito que as crianças tenham nos contado as lendas ou histórias que conheciam do bairro. Algumas das lendas falavam sobre lugares representativos do bairro ou dos arredores”, comenta a produtora Diana em um dos boletins de leitura do site ninoscomelibros.wordpress.com, sobre suas atividades no bairro Alto em setembro de 2015.

Além de leituras em voz alta, empréstimo de livros, atividades de socialização e formação artística, a organização conta com projetos radiofônicos semanais como Voces y caminos (rádio pela internet) e Palabrotas en acción (cápsulas informativas ou com adaptações de literatura infantil enviadas a uma rede de contatos). Quase todas as atividades são gratuitas, exceto algumas oficinas dirigidas a crianças e adultos que se sustentam nas metodologias implementadas nos bairros, mas são consideradas serviços de apoio.

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“Estas oficinas são opções que oferecemos a outros públicos, que não pertencem aos bairros e têm capacidade econômica para pagá-los”, justifica Juan Manuel. “Um de nossos princípios tem sido a gratuidade no interior dos bairros, em nenhum momento solicitamos dinheiro para a realização de alguma atividade. Portanto, nos ocorreu que esses serviços pudessem ajudar a compensar, em parte, aos membros da comunidade que vêm adquirindo mais responsabilidades e dedicam mais tempo aos projetos”.

As oficinas para crianças têm a ver com o processo artístico, o cuidado com o meio ambiente, as artes e as histórias, enquanto os voltados para adultos enfocam a formação de públicos, o fomento da leitura, do voluntariado, da literatura infantil e metodologias sobre clube do livro infantil. São oficinas como “Artiliches” [Arte reciclada], “Ciência e cultura para a leitura” [Divulgação científica], “De letreos” [Criação narrativa], “Hartas artes” [Autoexploração da personalidade através da narração]. Os cursos para adultos, por sua vez, ganharam nomes como “Leitura em todas as partes” [Formação de promotores de leitura] e “Cultura Coletora” [Produção cultural e formação de públicos].

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Três perguntas para Juan Manuel Gutiérrez Jiménez

  1. Vocês são uma equipe interdisciplinar de produtores culturais. Quantos estão envolvidos mais diretamente no projeto atualmente?

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Juan Manuel é diretor da Comunidade Comelibros (Foto: Maria José Maya)

Em Comelibros gostamos de nomear o mundo que estamos construindo como um projeto que busca gerar organização social. Desde o ano passado decidimos que necessitávamos de um nome que representasse a todos e todas as envolvidas no processo comunitário. Por isso nos nomeamos ouriços. Escolhemos esta figura como uma representação que oscila entre a dor, a fragilidade e a resistência. Lembrando que como tais podemos ferir, mas necessitamos uns dos outros, apesar da dor que isso pode gerar.

Efetivamente, as convocatórias que realizamos foram favoráveis no sentido de que nosso esquema de produtor cultural não está determinado por tipo de estudos ou algo do gênero. O programa se desenvolve em três bairros da cidade de Puebla, com uma distribuição de 14 produtores (ouriços leitores), com dois coordenadoras, que cuidam do planejamento, da realização e da retroalimentação das atividades de leitura semanalmente. Em média estamos cobrindo umas 250 sessões de leitura ao longo do ano que implicam leituras em voz alta, conversas derivadas, empréstimo de livros, atividades de socialização e formação artística.

O projeto Palabrotas en acción está formado por um coordenador e uma equipe de oito pessoas que se encarregam da realização de roteiros e gravação de vozes. Depois (as cápsulas) são editadas e enviadas a projetos radiofônicos interessados, com periodicidade semanal. Voces y caminos é outro projeto radiofônico posto em marcha pela internet. Dele participam quatro companheiros, todas as quintas-feiras, pela Lobo Radio.

 

  1.  Imagino que vocês tenham dificuldades, que as condições não sejam as ideais. Mesmo assim, tem valido a pena? Já podem ver os resultados do trabalho nas comunidades?

Dificuldades, temos passado por todas. Só para enumerar algumas: não contamos com um espaço fixo para operar ou resguardar materiais; temos que resolver a aquisição de materiais para realizar as atividades; as vizinhanças onde trabalhamos não têm as condições ideais de espaço como poderia ser uma sala de leitura ou ludoteca, estamos à mercê das pessoas que passam; dificuldades em mobilidade, traslado; não contamos com equipamento para montar concertos e/ou festivais… Enfim, carências podemos enunciar muitas, mas para todas elas temos encontrado formas de solucioná-las, com apoio solidário, doações, gestões, com um manejo administrativo muito cuidadoso de nossos recursos financeiros e materiais, com transparência e amabilidade para as pessoas, com propostas e espaço para iniciativas; com muita atenção para dentro do grupo, isso é em parte o que nos tem ajudado.

Tem valido a pena, completamente, contar com leitoras em voz alta nos bairros que há um par de anos eram parte dos grupos onde trabalhamos e agora se assumem como produtoras em sua comunidade. Também não tem preço ver crianças com formação autodidata que pensam e decidem, crianças que se defendem com palavras no momento adequado antes de ir aos tapas. Vale muito a pena passar pelos bairros e encontrar crianças e vizinhos que cumprimentam de outro modo. Ver um menino ou menina estabelecendo as regras de convivência com adultos e se encarregando de fazê-las valer é uma conquista também. E dentro do grupo, como companheiros, temos crescido e amadurecido junto com o projeto. Ainda que alguns tenham trilhado novos caminhos, a Comunidade Comelibros é parte de suas referências.

 

 

  1. Comunidade Comelibros é uma das 14 organizações da plataforma CVC México. Por que decidiram fazer parte da rede? Que esperam dela?

Basicamente porque parece que as organizações no México necessitam articular de outro modo, já não com manifestações como historicamente se fazia. Outro elemento é a afinidade política com a Cultura Viva Comunitária. Sentimos que compartilhamos os fundamentos entre as 14 organizações que até o momento formam a plataforma no México.

Como membros da rede, a curto prazo nos interessam dois temas: comunicação e visibilidade. No México, nesta fase, começar com uma rede como é Cultura Viva Comunitária implica resistir a processos de incerteza econômica, com bastante adversidades. Neste sentido, acreditamos que o primordial é gerar um companheirismo entre os distintos estados que participam da plataforma e ir construindo ações conjuntas muito concretas.

Por outra parte, quando falamos de visibilizar não nos referimos às conquistas de um projeto em si, e sim aos fundamentos, problemáticas e propostas que nos vêm ocorrendo para mudar a fundo a realidade em nosso país. Vemos como uma conquista muito importante que a sociedade se veja em espelhos mais amáveis que apenas o terror, o medo e o automatismo.

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Saiba mais:

https://ninoscomelibros.wordpress.com/

www.facebook.com/comunidadcomelibros

 

(* Texto publicado em 22 de fevereiro de 2016)

“Más Música, Menos Balas”: das redes sociais às ruas de Guadalajara“Más Música, Menos Balas”: das redes sociais às ruas de Guadalajara“Más Música, Menos Balas”: das redes sociais às ruas de Guadalajara“Más Música, Menos Balas”: das redes sociais às ruas de Guadalajara

Por IberCultura

EnEm 19, fev 2016 | Em | Por IberCultura

“Más Música, Menos Balas”: das redes sociais às ruas de Guadalajara

Há quase cinco anos começou em Acapulco (Guerrero, México) uma campanha nas redes sociais que incentivava as pessoas a trabalhar colaborativamente na difusão da cultura da paz e na recuperação de espaços públicos afetados pela situação de violência extrema que vivia o estado de Guerrero. Seu lema? “Mais música, menos balas”.

O movimento, idealizado pelo comunicador e promotor cultural Abraham Chavelas, começou depois que 15 cabeças foram encontradas em um centro comercial do porto de Acapulco. Convencidos de que ninguém deveria se acostumar com o crime organizado e o medo, Abraham e seus amigos passaram a organizar concertos e eventos culturais na cidade antes considerada um destino paradisíaco. E “Mais música, menos balas” acabou crescendo e tomando outros rumos.

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“Seis meses depois do começo da campanha, me somo de Guadalajara (Jalisco) e, junto a 35 colaboradores, conseguimos desenvolver a campanha convertendo-a em uma ONG”, conta Belén Palacios, diretora da organização que foi criada no estado de Jalisco em 2012, uma vez que descobriram que já não era apenas uma campanha viral e que deviam “dar passos mais firmes, sair mais das redes e levar as ideais aos fatos”.

Nascia, então, a ONG Más Música, Menos Balas Guadalajara, que acabou seguindo seus próprios caminhos e atualmente é uma das 14 organizações participantes da plataforma Cultura Viva Comunitária México. Entre as ações que esses cidadãos criam para ajudar os outros e melhorar o entorno estão intervenções artísticas, exposições, concertos, apresentações de livros e oficinas, espaços de diálogo, feiras de organizações, galerias de arte e projetos de desenvolvimento comunitário.

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Foto: Abraham Aréchiga

“A violência não está só ligada ao narcotráfico, ainda que suas consequências sejam muito evidentes e alarmantes”, afirma Belén Palacios. “A violência está também nas ruas, nas escolas e em 20% dos lares da América Latina. A violência está muito próxima, mudando nossos hábitos, nossos estilos de vida, e convertendo-nos em vítimas deste ataque ou do medo que gera este contexto hostil.”

Uma vez que a violência afeta a todos, e nos distancia uns dos outros, os integrantes da organização sabem que a arte, a cultura e a educação são meios fundamentais para alcançar pouco a pouco a recuperação de uma vida em comunidade benéfica e estável. Por isso estão convencidos de que “Mais música” é também mais arte, mais cultura, mais cinema, mais teatro, mais literatura, mais dança, mais pintura…

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“A cultura e a arte são ferramentas de inestimável importância para a transformação dos povos, conscientes de que é preciso gerar ações imediatas que nos permitam reativar e recuperar espaços perdidos por causa do medo, afastar os jovens da delinquência e gerar espaços de intercâmbios culturais para a criação de novos públicos que desfrutem das expressões artísticas e desejem participar de projetos comunitários”, ressalta a diretora da ONG.

Ver nascer a plataforma Cultura Viva Comunitária México, em outubro de 2015, foi também uma forma de compartilhar os sonhos e a busca por uma ação cultural transformadora. “Decidimos fazer parte da rede para criar intercâmbios e alianças que nos permitam seguir fortalecendo a construção de um tecido cultural comunitário interessado e capaz de alcançar transformações sustentáveis”, justifica Belén. “Esperamos que a plataforma cresça e se desenvolva, aporte ideias e reflexões sobre uma visão comunitária da cultura, e que possamos influenciar nas mudanças sobre algumas políticas públicas”. Afinal, o combate à violência também passa pelo entendimento, pela integração e pela solidariedade.

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Leia também: O surgimento da plataforma Cultura Viva Comunitária México

 

 

Saiba mais:

www.facebook.com/masmusicamenosbalasguadalajara

https://twitter.com/menosbalasgdl

www.masmusicamenosbalas.com  (em construção)

https://culturavivacomunitaria.org.mx

 

(*Texto publicado em 19 de fevereiro de 2016)