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18

set
2017

Em Notícias

A potência do coletivo: Encontro de Redes de Culturas Comunitárias da Argentina

Em 18, set 2017 | Em Notícias |

Texto: María Emília de la Iglesia*

Fotos e videos: Cooperativa La Comunitaria

 

Nos dias 9, 10 e 11 de setembro de 2017, organizações argentinas independentes e autogeridas puderam se encontrar e trabalhar em articulações concretas para consolidar e ampliar o movimento nacional de culturas vivas comunitárias a partir das práticas.

O Encontro Nacional de Redes de Culturas Comunitárias funcionou como baliza na construção cultural comunitária da Argentina. Durante três dias de debate e intercâmbios, reuniu mais de 90 organizações culturais comunitárias de 15 redes nacionais, locais e regionais de 18 províncias, com mais de 400 participantes que se encontraram em América, distrito de Rivadavia, uma zona rural da província de Buenos Aires, no limite com a província de La Pampa, a 550 km da capital federal.

A Cooperativa “La Comunitaria” foi a organização anfitriã deste encontro, que contou com o apoio de diversos programas de governo, como Ibercultura Viva, Programa Puntos de Cultura e Municipalidade de Rivadavia, além do apoio de instituições como escolas públicas da cidade, clubes, cooperativa elétrica e comércios locais, e também com recursos de organizações culturais comunitárias como Culebrón Timbal, Fundación Che Pibe, e organizações que financiaram os próprios traslados e estadias.

Foram três dias em que primaram a construção, a confiança e o intercâmbio. A abertura foi realizada ao ritmo da América Latina com Los Pequeños Grandes Músicos. Depois dos agradecimentos por parte de La Comunitaria, redes históricas do movimento de Cultura Viva compartilharam com as novas redes e grupos a história desta construção continental que tem como protagonistas 17 países da América Latina.

 

 

Participaram da mesa de abertura Ricardo Talento, da Red Nacional de Teatro Comunitario; Pablo Antonini, presidente da Federación Argentina de Radios Comunitarias (FARCO); Carla Delzart, da Red Nacional de Murgas; Silvia Bove, pela Red de Cultura Viva de Chacras de Coria; Alexandre Santini, um dos integrantes do movimento latino-americano de CVC do Brasil, e María Emilia de la Iglesia, pela Cooperativa La Comunitaria, expondo os objetivos do encontro.

Sob um persistente chuvisco, 400 almas dirigidas por Chilly Ruiz cantamos “Razón de vivir”, de Víctor Heredia. “Não somos o papel picado na festa dos ricos, viemos construir conhecimento”, disse Cristina Terzaghi, em relação a como concebe a articulação entre  universidade, povo e arte pública, dando assim por inaugurado um imponente mural na sede de “La Comunitaria”, chamado “A potência do coletivo”, realizado pela APIM (Área de Práctica e investigación Mural) da Faculdade de Belas Artes da Universidade Nacional de La Plata, espaço que Terzaghi coordena.

À tarde se apresentou a Murga Tirados a la Marchanta de Trenque Laúquen, que exigiu em seus versos a aparição com vida de Santiago Maldonado, reclamo que teve eco em todos os presentes. A cosmovisão dos povos originários esteve neste encontro com a presença da comunidade Toba QOM, Ranquel, Mapuche e Huarpes. Os círculos de articulação e debate se deram em torno a sete núcleos temáticos, atravessados por um mesmo eixo, “Ser comunitário”: Arte e Transformação social; Economias Sociais, Populares e Colaborativas; Educação e Criação; Comunicação; Gestão, Autogestão e Criatividade; Cultura, Políticas Públicas, Legislação e Democracia Participativa; Meio Ambiente e Natureza. “Les Merequetengues”, de Hurlingham, apresentaram sua obra teatral comunitária, que em estilo grotesco narra a relação dos criollos e ingleses na fundação da cidade.

 

À noite se realizou um festival comunitário com expressões culturais muito variadas, a partir de tambores africanos (Toques y Tumbas) que iniciaram a celebração chamando o “Quilombo” (lugares de organização, liberdade e resistência dos povos africanos). Em seguida vieram a Agrupación Alborada, com o selo da dança folclórica local, a voz dos jovens e suas novas formas e tomada da palavra com Amuleto Squad (hip hop), a voz e o violão de Juan Ignacio López (Hurlingam), o malambo de mulheres da Academia Poncho Negro, mostrando desde uma perspectiva de gênero que se pode questionar também o status quo e o machismo nas tradições. Los Pala Bombos realizaram uma caravana de bumbos legüeros integrando ao ritmo da chacarera uns 20 tocadores de bumbo de todas as gerações e condições sociais.

 

Com a presença de mais de 500 pessoas, a noite foi encerrada pelo grupo de General Pico, La Pampa “Los Tinku” (o significado da palavra quechua “tinkuy” é “encontrar-se”). A emoção dos presentes demonstrava que eles estavam vivendo um verdadeiro encontro com esta mescla de ritmos, vozes, mãos e abraços, coroando com muita força o primeiro dia.

A manhã de domingo (10) despertou com uma chuva torrencial que não impediu os presentes de debater em torno de intercâmbios possíveis entre os grupos, linhas de trabalho concreto, gerando cruzamentos reais entre os participantes para construir o “depois do encontro”.

 

Passado o meio-dia, foi servido um churrasco comunitário, mais de 300kg de carne foram assados pelos organizadores, desafiando o clima. À tarde, depois das conclusões dos grupos, as organizações expuseram objetivos significativos de seus grupos. Na cerimônia, uma companheira da Comunidade QOM Toba cantou umas coplas em sua língua relacionadas ao amor entre os presentes e como a rede se alimenta desse amor. A jornada continuou com oficinas de formação em: lúdica, gênero e brincadeiras na dimensão das culturas; produção musical, danza colectiva, introdução ao desenho e gestão de projetos.

À noite os espetáculos trasladaram-se ao Cine Teatro da cidade, onde foi apresentado Fuera de Foko Crew (Crear Vale la Pena), um impressionante espetáculo de dança, hip hop, em que são narradas as violências vividas nos bairros e vilas, em contraste com a potência da criatividade juvenil e feminina para gerar outras narrativas nestes mesmos territórios. Também se apresentou a obra de La Comunitaria “Se cayó el sistema, disculpe las molestias” (“Caiu o sistema, desculpe o incômodo”), com 60 vizinhos atores em cena, aplaudidos de pé por mais de 500 pessoas presentes na sala. Finalmente, a noite mágica de domingo foi encerrada com Pampa Afro, grupo de dança e percussão africana.

No último dia do encontro os participantes se dividiram em quatro circuitos paralelos:

Um grande grupo ficou em América e participou da Reunião Preparatória do 3º Congresso Latino-americano, que será realizado em novembro no Equador. Nesta reunião, Eduardo Balán, do Culebrón Timbal; Diego Benhabib, representando a presidência do programa IberCultura Viva, e Alexandre Santini, pelo movimento de cultura viva brasileira, deram informação geral do encontro e falaram sobre apoios concretos ao Congresso a partir dos Estados. Depois todos os presentes passaram a trabalhar em conjunto sobre o documento e os mandatos que a caravana argentina levaria ao Equador. À tarde veio o espetáculo da companhia Sin Rueditas de Saladillo, província de Buenos Aires.

Ao mesmo tempo, na cidade de General Pico, La Pampa (90km distante de América), percorreu-se a experiência do MTE, conhecendo sua horta, a bloquera (máquina que fabrica blocos de cimento) e a fábrica têxtil, o Centro Cultural Carlos Berg, e compartilhando oficinas de La Comunitaria e uma obra teatral de Carlos Tejedor.

Enquanto isso, no povoado de González Moreno, com 2.000 habitantes, a uns 55km de América, era a vez da oficina de lúdica a cargo de Convocados por Lúdica de La Plata, de uma obra teatral do Grupo Globos Rojos de Pehuajó, além das oficinas de ofícios de La Comunitaria e do Centro Cultural Sobrerrieles.

No último percurso, a 20km da cidade-sede do encontro, o grupo se dirigiu ao povoado de Fortín Olavarría, de 1.300 habitantes, onde a Compañía Titiritezca de Villa Fiorito apresentou “Carlitos Pescador” para as crianças, e Clelia Andrada deu uma oficina de teatro de bonecos, além de oficinas de carpintaria, ferraria e outros espaços de La Comunitaria.

 

Um monte de gente começava a ensaiar a retirada em um sem-fim de abraços. Ao ritmo de chacareras santiagueñas, salteñas e riojanas, e com uma merenda, esperou-se a concentração final para compartilhar as conclusões do Encontro Nacional de Redes de Culturas Comunitárias, num daqueles momentos em que custa despedir-se pela potência do vivido…onde brotam as emoções.

A bandeira imensa que durante o encuentro foi transformada pelas organizações presentes em um mapa da Argentina marca o rumo…de tudo o que resta por fazer juntos como movimento nacional e de como levar toda esta potência coletiva vivenciada estes dias ao Equador, de 20 a 25 de novembro, para construir com os hermanos latino-americanos o destino do Movimento Continental de Cultura Viva Comunitária.

 

*María Emilia de la Iglesia é integrante da Cooperativa La Comunitaria, organização anfitriã do encontro.

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